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Revista Uruguaya de Antropología y Etnografía

versão impressa ISSN 2393-7068versão On-line ISSN 2393-6886

Rev. urug. Antropología y Etnografía vol.7 no.2 Montevideo dez. 2022  Epub 01-Dez-2022

https://doi.org/10.29112/ruae.v7i2.1599 

Reseñas

Resenha da obra: Ana Lúcia Pastore Schritzmeyer. Jogo, ritual e teatro: um estudo antropológico do tribunal do júri. São Paulo: Terceiro Nome, 2022, 296 pp.

Anderson Przybyszewski Silva1 
http://orcid.org/0000-0001-7336-8656

1Universidade Federal de Mato Grosso


O trabalho de Ana Lúcia Pastore Schritzmeyer procura desvelar como funciona na prática o tribunal de júri no Brasil, partindo das etnografias das dinâmicas de sessões de julgamentos realizados por Tribunais do Júri da cidade de São Paulo, entre 1997 e 2001.

Durante sua pesquisa de campo, visitou cinco tribunais, percebeu seus funcionários e seu público, trocou ideias com os presentes, assistiu a seções de julgamentos desde o sorteio dos jurados á promulgação da sentença, percebendo a lógica do Tribunal do Júri, a partir dos seus próprios atores.

Durante as seções em que assistiu, percebeu que nas falas dos atores envolvidos, surgia a metáfora do júri como um jogo e de como os envolvidos ficavam alheios ao mundo externo.

Foi esta tese de doutorado em antropologia defendida por ela na Universidade de São Paulo que deu origem ao livro.

Ana Lúcia Pastore Schritzmeyer é graduada em Ciências Sociais e em Direito, com mestrado e doutorado em Antropologia Social pela Universidade de São Paulo, onde dá aulas e coordena o Núcleo de Antropologia do Direito (NADIR), é pesquisadora sênior do Núcleo de Estudos da Violência (NEV), integra o Núcleo de Antropologia Performance e Drama (NAPEDRA) e a Cátedra UNESCO de Educação para a Paz, Direitos Humanos, Democracia e Tolerância do Instituto de Estudos Avançados (IEA).

Sua obra nos introduz nas práticas e significados do tribunal do júri e nos leva a reflexão, sobre crimes que implicam em valores sociais e morais enraizados na sociedade. O que faríamos diante da situação de violação desses valores?

O livro está organizado em seis capítulos que detalham os principais aspectos e que buscam explorar o conceito de jogo e sua potencialidade para pensar o Tribunal de Júri.

No primeiro capítulo, “Bastidores da Pesquisa”, a autora inicia a sua apresentação no qual ela faz uma reflexão sobre seu histórico, justifica seu interesse pelo objeto de estudo, descreve sua pesquisa e nos passa informações sobre o seu trabalho de campo e quais fontes de dados que usou e por fim faz uma avaliação do trabalho realizado.

Detalha a trajetória da pesquisadora nesses cinco anos acompanhando seções de Tribunais de Júri e a metodologia da pesquisa de doutorado que é a base do livro e os métodos utilizados na sua pesquisa.

Em resumo, este capítulo nos introduz a base da publicação do livro, o de pensar o Tribunal de Júri, como um jogo de confrontos de narrativas que irão se tornar vitoriosas de acordo com sua força de produzir histórias que se assemelham com a veracidade e que possam persuadir e envolver os jurados.

A autora destaca que esse trabalho não sugere objetivamente encaminhamentos técnicos as dilemas do Júri no Brasil, como intervenções nas formas de escolhas de jurados ou maneira de condução dos operadores técnicos, a pretensão é que possamos nos perceber como elaboradores dessa forma de julgamento e controle social.

No segundo capítulo, “Júri-Jogo” se centraliza na tese do jogo como elemento central para analisar os jogos persuasivos do Tribunal de Júri. Ela mostra que no Tribunal de Júri, há uma organização onde as práticas e narrativas entram em confronto para produzir histórias verossímeis, onde o que está em jogo de forma rigorosa são os valores sociais e a moral social hegemônica.

Com base no seu estudo etnográfico, a autora argumenta que o Tribunal de Júri pode ser analisado como um jogo, ela descreve embates entre promotores e advogados de defesa com regras próprias onde o espaço do “jogo” é o plenário. Nesse jogo a narrativa e a persuasão são o mote determinante do desenlace, pois no Júri as representações de mundo são estruturadas por acusadores e defensores para que, com base nelas, jurados adiram a tais estruturas e aos argumentos que as sustentam.

A autora através da comparação do Júri a um jogo tem como objetivo destacar a capacidade absorção de múltiplas subjetividades e redefinição de valores. Associa pois o jogo é um elemento estruturante da vida social, que através do contraditório, esta presente em qualquer relação na sociedade. As regras do jogo do Júri são regras da vida social, mas, por serem dinâmicas podem ser aplicadas, interpretadas e inovadas.

O terceiro capítulo “Jogo Veredicto”, apresenta um jogo de tabuleiro intitulado Veredicto, no qual possibilita aos jogadores experimentarem a realidade de um “júri”.

Por meio da confrontação entre o seu objeto e o jogo Veredicto a autora reafirma sua abordagem defendida no livro, pois o jogo Veredicto explicita o jogo existente em um “júri” real.

No quarto capítulo “Júri Ritual”, faz um paralelo com rituais religiosos, onde se reúnem práticas e representações onde são atribuídos sentidos a vidas e mortes, a autora cita que esse caráter ritual se encontra nas ações ordenadas e simbólicas, falas, gestos e expressões e se desenvolvem em momentos apropriados das seções e inspiram atitudes que levam a reverências e valores que por fim se materializam nos votos dos jurados.

Júri Teatro

O jogo não se trata de uma simples associação do Júri a um jogo, mas a descrição realizada por Pastore vai muito além, ela descreve os cenários e os operadores de Direito, e traz uma discussão sobre o plenário, local onde se registra o embate.

Sendo assim, neste capítulo volta-se para o jogo teatral do Tribunal de Júri e nos remete a analise da “encenação de ideias” que são colocadas no Tribunal de Júri, onde os jurados são a plateia privilegiada, pois tudo que é encenado nesse jogo teatral é voltado aos jurados. Nesse espaço cênico fica muito claro quem são os protagonistas e espectadores, o reú que seria o protagonista acaba se tornando um mero figurante.

A autora nos leva a reflexão acerca desse teatro melodramático, onde se espera como desfecho algo redentor, pois a absolvição do réu é vista pela sociedade como impunidade.

Júri Texto Etnográfico

Neste último capítulo a autora volta à defesa da etnografia do Tribunal de Júri e para consolidar sua posição apresenta uma etnografia do Júri.

Nesse contexto, diante da riqueza de material colocada nos capítulos, a autora explicita que esse estudo foi colocado como contribuição para nossa compreensão acerca do Tribunal de Júri.

Sendo o Tribunal de Júri, para nós antropólogos, um ritual privilegiado para suscitar debates e reflexões acerca da moral punitiva e dos valores sociais.

Nota: Éste artículo corresponde 100% a Anderson Przybyszewski Silva

Nota: El comité editorial ejecutivo Juan Scuro, Pilar Uriarte y Victoria Evia aprobó éste artículo

Recebido: 02 de Junho de 2022; Aceito: 09 de Novembro de 2022

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