Com o aumento da alta conectividade através da internet, o fenômeno conhecido como Medo de se Sentir por Fora (Fear of Missing Out, FoMO) vem se mostrando mais frequente entre as pessoas (Przybylski et al., 2013). O FoMO foi descrito como um sentimento de desconforto ao ficar de fora de algo que seus colegas estão fazendo, sabem ou estão em posse de algo considerado melhor do que aquilo que a própria pessoa faz, sabe ou tem (Przybylski et al., 2013). Outra definição apresentada na literatura elaborada por Przybylski et al. (2013) é que o FoMO pode ser definido como um receio de que os outros possam ter experiências gratificantes das quais o sujeito está ausente, sendo caracterizado pelo desejo de permanecer constantemente conectado com o que os outros estão fazendo. Em uma definição mais recente ela foi descrita como o desejo constante de acompanhar a vida emocionante e gloriosa de outras pessoas através da internet e um estado de ansiedade constante em relação a isso (Tanhan et al., 2022). Em ambas as definições, as pessoas que experimentam FoMO relataram sentimentos negativos quando falta o contato onipresente com os outros e com o que eles estão fazendo.
A partir do crescimento do uso das redes sociais associado principalmente aos smartphones, observou-se uma popularização do FoMO, resultando em novas pesquisas acerca do fenômeno. Uma das propostas postuladas em estudos realizados previamente é de que o FoMO pode ser um mediador, ligando déficits em necessidades psicológicas (relacionamento) e engajamento na mídia. O estudo de Casale e Fioravanti (2015), mostrou que indivíduos com baixo grau de satisfação das necessidades básicas (relacionamento - conexão com os outros) são mais propensos a interagir em redes sociais. Estudos apontam que o aumento da FoMO está positivamente associado à intensidade da mídia social, mas negativamente associado à conexão social (Roberts & David, 2020). Nesse sentido, o FoMO explica a tendência de pessoas com déficits crônicos na satisfação das necessidades psicológica de relacionamento a buscar atualizações constantes por meios de comunicação com aplicativos de conversas (chats), inclusive em situações inapropriadas como durante a condução de veículos (Alt, 2015; Przybylski et al., 2013). A pressão de ter que estar disponível em tempo integral durante o dia, faz com que as pessoas experimentem um grau elevado de ansiedade quando o acesso à rede é restrito, além de estresse quando não respondem de imediato as solicitações e mensagens (Skierkowski & Wood, 2012).
O FoMO foi inicialmente conceitualizado usando a Teoria da Autodeterminação (Ryan & Deci, 2000), que se baseia na ideia de que a relacionamento social pode impulsionar a motivação intrínseca, promovendo assim uma saúde mental positiva. Os pesquisadores aplicaram a Teoria da Autodeterminação ao FoMO, sugerindo que ele é um estado emocional negativo resultante da falta de satisfação das necessidades de relacionamento social. A FoMO pode ser uma sensação episódica, surgindo durante uma conversa, ou uma disposição de longo prazo, levando a um sentimento de inferioridade social, solidão ou raiva intensa. Atualmente, as pessoas estão expostas a uma grande quantidade de informações sobre as atividades dos outros, o que pode gerar incertezas sobre se estão fazendo o suficiente ou se estão no caminho certo em suas vidas.
A necessidade de conexão interpessoal é algo muito presente na história evolutiva humana sendo um dos aspectos emocionais ligados às necessidades psicológicas do ser humano. A Teoria da Autodeterminação propõe que a saúde mental seja baseada em três necessidades básicas: competência, capacidade de atuar efetivamente no mundo; autonomia, iniciativa pessoal; relacionamento, proximidade ou conexão com os outros (Przybylski et al., 2013).
O relacionamento entre pessoas é uma necessidade de dimensão psicológica, de estabelecer vínculos emocionais com outros indivíduos. Essa ligação entre sujeitos reflete o desejo de estar emocionalmente conectado e interpessoalmente envolvido em relações calorosas uns com os outros (Milyavskaya & Koestner, 2011; Reeve, 2006). Tal necessidade psicológica é um construto motivacional essencial, pois, ao perceberem em relações interpessoais que as apoiem, pessoas apresentam maior resistência ao estresse e menor dificuldade de enfrentamento. Em contrapartida, as relações que não trazem este tipo de valorização não satisfazem às necessidades humanas de relacionamento. Outrossim, a qualidade da relação é um fator crucial das relações humanas, visto que uma vida sem vínculos sociais íntimos e sem relacionamentos de qualidade está associada a sentimentos como tristeza, ciúme e solidão (Reeve, 2006).
Por conta do aumento das observações de uso das redes sociais e a necessidade de conexão, foi elaborada no ano de 2013 uma escala para a avaliação do FoMO. No estudo, Przybylski et al. (2013) elaboraram a Fear of Missing Out Scale, que consta de 10 itens para a mensuração do Medo de se Sentir por Fora. Os itens se dispõem em escala Likert: 01 (Não é verdade sobre mim) ao 05 (Extremamente verdade sobre mim). Os resultados no estudo original de desenvolvimento do instrumento os resultados sugeriram que indivíduos mais jovens, especialmente homens jovens, tendem a ter níveis mais altos de FoMO. Baixa satisfação das necessidades psicológicas básicas (competência, autonomia, relacionamento) está associada a níveis mais altos de FoMO; FoMO está negativamente associado ao bem-estar psicológico, incluindo humor geral e satisfação com a vida; a FoMO está associado a características demográficas, níveis de satisfação de necessidades psicológicas, bem-estar psicológico e comportamentos específicos relacionados ao uso de redes sociais, incluindo o uso de Facebook e o comportamento durante aulas (Przybylski et al. 2013).
A Fear of Missing Out Scale, originalmente apresentada na língua inglesa, é uma escala com apropriadas qualidades psicométricas. Quanto as traduções e adaptações da Fear of Missing Out Scale que já foram realizadas ao redor do mundo, temos para os idiomas turco (Gökler et al., 2016), espanhol (Gil et al., 2015), árabe (Al-Menayes, 2016), italiano (Casale & Fioravanti, 2020) e inglês (Perrone, 2013; para adolescentes norte-americanos).
A validade certifica-se que um instrumento mede exatamente o que se propõe a medir e divide-se em alguns tipos (Pasquali, 2009). No presente estudo foi utilizada evidências de validade de conteúdo e estrutura interna do instrumento, que constitui na maneira direta de verificar a hipótese da legitimidade da representação comportamental dos traços latentes (Pasquali, 2009). A tradução e adaptação para o contexto brasileiro dessa escala possibilita estudos transculturais através desse instrumento.
Para a busca de evidências de validade da estrutura interna do instrumento optou-se por realizar uma Análise Fatorial Exploratória (AFE) nesta versão para uso no Brasil. Versões da escala FoMO para outros países também foram testadas com a AFE. Por exemplo, a versão árabe mostrou uma estrutura de dois fatores com 0,82 e 0,72 de valores de alfa de Cronbach, enquanto os estudos com as versões para o turco, espanhol e inglês para adolescentes foram explicados por um único fator, corroborando a estrutura da escala original, com valores de alfa de Cronbach 0,81; 0,85 e 0,93 respectivamente. O objetivo do estudo foi traduzir, adaptar a escala FoMO para o português brasileiro e obter evidências de validade para o uso no Brasil.
Método
Para cumprir os objetivos estabelecidos nesta pesquisa, foram empregadas duas etapas metodológicas: a primeira consistiu na tradução e adaptação da escala FoMO, enquanto a segunda envolveu a aplicação da escala ao público-alvo e a análise dos dados. O projeto seguiu todas as diretrizes éticas e foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa sob o número 5.693.731.
Tradução e adaptação da FoMO
Na etapa inicial, referente à tradução e adaptação do instrumento, foi adotada a metodologia proposta por Borsa et al. (2012), conforme ilustrado na Figura 1, abrangendo as seguintes fases: tradução, síntese das versões traduzidas, tradução reversa, avaliação por especialistas e avaliação do público-alvo.
Tradução
Foram realizadas duas traduções independentes do instrumento original para o português. Esse processo envolveu dois profissionais distintos. A primeira tradução foi conduzida por uma psicóloga especializada em desenvolvimento humano, sem conhecimento prévio dos conceitos subjacentes ao instrumento. A segunda tradução foi realizada por uma psicóloga com formação acadêmica na Alemanha, possuindo ampla proficiência na língua inglesa, também mantida desinformada sobre o conceito. Ambas as tradutoras, conforme recomendado por Borsa et al. (2012), eram bilíngues, fluentes na língua de origem do instrumento e nativas na língua-alvo.
Síntese das versões traduzidas
Uma avaliação inicial de ambas as versões traduzidas foi realizada com base em quatro aspectos: 1) equivalência semântica - para identificar possíveis erros gramaticais na tradução, conotações das palavras e assegurar um significado singular para cada item; 2) equivalência idiomática - para confirmar que os itens de tradução desafiadora do instrumento original foram adaptados com expressões equivalentes sem alterar o significado cultural de cada item; 3) equivalência experiencial - para verificar se os itens do instrumento são aplicáveis à cultura alvo e, se necessário, substituí-los por itens equivalentes; 4) equivalência conceitual - para garantir que termos ou expressões específicas foram traduzidos com precisão e avaliar o mesmo aspecto em diferentes culturas. Ao final desta etapa, uma versão única do instrumento foi obtida ao sintetizar as duas versões traduzidas e adaptadas.
Tradução reversa
Foram produzidas duas retraduções para o inglês das versões traduzidas do instrumento em português. A retradução envolve traduzir a versão sintetizada do instrumento de volta para o idioma de origem para avaliar o grau de correspondência entre a versão traduzida e o conteúdo dos itens originais, conforme proposto pelo instrumento original. Essa etapa foi realizada por dois tradutores diferentes dos que realizaram a tradução inicial. Ambas as retraduções foram conduzidas por profissionais fluentes no idioma de origem do instrumento original. Em seguida, um terceiro profissional, professor de língua estrangeira e nativo do idioma de origem do instrumento, avaliou a fidelidade das versões retraduzidas.
Avaliação dos especialistas
Essa etapa teve como objetivo avaliar o conteúdo da escala com a assistência de especialistas na área de avaliação psicológica ou com conhecimento específico do construto. Três profissionais de saúde mental, denominados juízes, sendo duas psicólogas e um psiquiatra, foram convidados a analisar criticamente a estrutura, instruções e itens do instrumento, com ênfase na clareza da linguagem. Os juízes foram selecionados com base em critérios que incluíam possuir um doutorado e ter pelo menos cinco anos de experiência na área. Durante todo o processo, todos os juízes receberam uma breve introdução ao conceito de Fear of Missing Out. Em seguida, foi calculado o coeficiente de validade de conteúdo, sendo que os itens que obtiveram CVC abaixo de 0,8 foram reanalisados pelos pesquisadores e realizadas as modificações necessárias para melhor atender às necessidades do instrumento, dando origem à versão final do instrumento que subsidiou a segunda etapa do estudo, consistindo na aplicação em larga escala.
Avaliação do público-alvo (análise semântica)
Uma aplicação preliminar do instrumento foi conduzida em uma amostra de quatro indivíduos representando o público-alvo pretendido. Foram selecionados quatro participantes, incluindo um adolescente, dois adultos e um idoso, três do sexo feminino e um do masculino. As idades dos participantes variaram de 18 a 62 anos, residindo em diferentes estados do Brasil, garantindo representatividade das regiões Nordeste, Sul e Sudeste. O objetivo desta etapa foi verificar a compreensibilidade dos itens, instruções e escalas de resposta para o público-alvo. Considerou-se essencial avaliar o instrumento entre indivíduos de diferentes regiões para garantir que, uma vez validado, o instrumento pudesse ser aplicado em diversas populações e regiões do país.
Aplicação da FoMO na público alvo e análise dos dados
Para investigar evidências de validade de construto, a coleta de dados foi realizada por meio de uma plataforma digital, obtendo uma amostra de conveniência não probabilística. Os dados foram analisados por meio da AFE proposta por Lorenzo-Seva e Ferrando (2019), utilizando o software estatístico Factor para atender à validação do construto da escala FoMO.
Participantes
A coleta de dados foi realizada por meio da plataforma digital REDCap (Research Electronic Data Capture). A amostra coletada foi do tipo conveniência não probabilística, principalmente por meio de redes sociais, visando alcançar um maior número de participantes em um curto período de tempo. Os critérios de inclusão para esta pesquisa foram: acesso à internet; idade entre 18 e 65 anos; alfabetização. Assim, a amostra total compreendeu 646 participantes. Dentre este grupo, a maioria era do sexo feminino (76,4 %), possuía ensino superior completo (59,9 %) e era solteira (59,3 %), com idade média de 29 anos (DP = 11,77), variando entre 18 e 63 anos.
Análise dos dados
A AFE tem sido amplamente empregada como um procedimento estatístico no desenvolvimento, avaliação e aperfeiçoamento de instrumentos psicológicos (Floyd & Widaman, 1995). Sua finalidade reside em confirmar ou refutar a estrutura fatorial de um determinado instrumento (Brown, 2006), visando desvendar os construtos latentes explorados pelo instrumento através da análise da covariância entre os itens.
Nesse contexto, para verificar a consistência dos dados obtidos, foi empregado o método de análises paralelas por meio do programa estatístico Factor (versão 10.10.03). Esse método estatístico envolve a construção aleatória de um conjunto hipotético de matrizes de correlação de variáveis, tendo como base a mesma dimensionalidade do conjunto de dados reais (o mesmo número de variáveis e sujeitos) (Laros, 2004). A matriz hipotética é submetida à fatoração centenas ou milhares de vezes (dependendo da robustez escolhida pelo pesquisador), e a média dos autovalores (eigenvalues) resultantes dessas simulações é calculada. Os eigenvalues dos dados reais são então comparados (pareados) com os eigenvalues aleatórios, emparelhando o primeiro eigenvalue real com o primeiro eigenvalue aleatório, o segundo com o segundo e assim por diante. A retenção do número de fatores nos dados reais está relacionada àqueles que apresentam eigenvalue maior do que 1 e superam os eigenvalues correspondentes obtidos a partir dos dados aleatórios (O’Connor, 2000).
A escolha do método de análises paralelas foi motivada por sua relevância como um dos modelos mais empregados para análise de itens politômicos, sendo particularmente indicado para escalas no formato Likert, resultando em resultados de maior precisão (Timmerman & Lorenzo-Seva, 2011).
Resultados
Na etapa inicial de tradução e adaptação da FoMO, foram geradas duas versões da escala em língua portuguesa. Diante da semelhança entre as versões traduzidas, elas foram combinadas, resultando em um único instrumento. A posterior síntese das versões traduzidas considerou a equivalência semântica, idiomática, experiencial e conceitual, constatando que os padrões de equivalência aceitáveis propostos na literatura foram alcançados.
Com base nas duas retraduções, um terceiro profissional, nativo em língua inglesa e professor de línguas estrangeiras, avaliou que ambas as versões retraduzidas apresentaram uma linguagem mais formal em comparação com o instrumento original, porém isso não comprometeu a consistência da escala. Portanto, nenhuma alteração foi considerada necessária no instrumento final após os resultados das traduções reversas, conforme demonstrado na Tabela 1.
A avaliação realizada por especialistas revelou que todos os juízes concordaram fortemente com a clareza das instruções do instrumento. A estrutura e formatação da escala foram consideradas adequadas para o propósito do instrumento. A descrição na escala foi julgada compatível e suficiente para responder aos itens, e os próprios itens foram considerados representativos do construto avaliado. Adicionalmente, houve concordância de 100% sobre a compreensibilidade dos itens, indicando que o instrumento é acessível tanto para adultos quanto para idosos.
O coeficiente de validade de conteúdo de cada item foi analisado e sete dos 10 itens ficaram com valor igual a 0,80. Especificamente, os juízes identificaram que o item 05 apresentou inconsistência na equivalência idiomática e experiencial. A expressão "entenda meus amigos em piadas" foi considerada pouco comum na cultura brasileira, levantando a possibilidade de confusão durante a aplicação da escala. Além disso, 66,7% dos especialistas notaram semelhanças entre as afirmações dos itens 01 e 02, sugerindo uma reflexão sobre as distinções pretendidas por cada item a fim de evitar sobreposições.
No que diz respeito à avaliação do público-alvo, os participantes avaliaram o instrumento como de fácil compreensão, tanto em relação às instruções quanto aos itens. Contudo, 75 % da amostra expressou dúvidas e sinalizou falta de clareza no item 05, enquanto 25 % apontou semelhança entre os itens 01 e 02.
Com base nas considerações dos juízes e nas observações dos participantes, foram realizadas modificações nos itens 01, 02 e 05, como detalhado na Tabela 1. A expressão do item 05 “entenda meus amigos em piadas” foi alterada para “entenda meus amigos quando fazem piadas e/ou brincadeiras”, com o intuito de alcançar maior equivalência idiomática e experiencial, ampliando o significado da expressão e promovendo uma adaptação mais eficaz ao contexto cultural brasileiro. O item 01, originalmente formulado como “Eu temo que os outros tenham experiências mais recompensadoras do que eu”, foi reformulado para “Eu temo que as outras pessoas tenham experiências mais recompensadoras do que eu”, visando proporcionar maior clareza. Além disso, os itens 01 e 02 foram reordenados, pois essa reorganização tende a facilitar a interpretação e assimilação por parte dos avaliados. Com a inversão da ordem de apresentação, o item 2 “amigos” precede o item 1 “outras pessoas”, mantendo a estrutura original do instrumento.
Na segunda etapa, que envolveu a aplicação da FoMO e a análise dos dados, um total de 646 participantes com idades variando entre 18 e 63 anos (M = 32,60; DP = 11,84) foram envolvidos no estudo. Após a coleta de dados, procedeu-se às Análises Fatoriais Exploratórias. A utilização do método Optimal Implementation of Parallel Analysis (Timmerman & Lorenzo-Seva, 2011) indicou que a solução mais representativa dos dados consiste em um único fator (Kaiser-Meyer-Olkin (KMO) = 0,81942; Alfa de Cronbach (α = 0,802); Omega de McDonald1s (w = 0,792); teste de esfericidade de Bartlett = 2665,1; df = 45; p < 0,001). O índice de Média das Cargas Absolutas Reais de Item (Mean of Item Residual Absolute Loadings, MIREAL) apresentou o valor de 0,269. Conforme apontado por Ferrando e Lorenzo-Seva (2018), valores de MIREAL abaixo de 0,300 indicam unidimensionalidade dos dados. A análise paralela também corroborou a presença de um fator como o mais representativo para os dados. Os índices fatoriais são apresentados na Tabela 2.
* O número de fatores a ser retido é um, pois um fator dos dados reais apresenta % de variância explicada maior do que os dados aleatórios.
Ao conduzir a análise paralela, ocorre a geração de análises simuladas, acompanhada das médias de variância das simulações. Consequentemente, é sugerido determinar o número de dimensões quando a variância da matriz amostral (percentual de variância dos dados reais) supera a média das variâncias geradas pelas simulações (média percentual de variância aleatória). Nesse contexto, constata-se que somente um fator atende a esse critério.
As cargas fatoriais dos itens estão listadas na Tabela 3, mostrando que a maioria dos itens apresentou carga fatorial acima de 0,40. As cargas fatoriais representam a correlação entre o indicador e o fator extraído, portanto cargas fatoriais acima de 0,40 são indicativas de uma estrutura bem definida.
Discussão
O conceito de Fear of Missing Out (FoMO) ganhou destaque devido ao aumento do uso das redes sociais. A literatura define FoMO como um conjunto de sentimentos negativos que surgem quando os indivíduos se sentem desconectados das atividades alheias e do que elas estão realizando. Essa dinâmica pode levar a um maior uso compulsivo de aplicativos online, o que tem impactos adversos na saúde dos indivíduos (Wegmann et al., 2017). A FoMO parece estar relacionado à frequência de uso do smartphone e à gravidade do uso problemático do smartphone e medeia a relação entre a ansiedade e a frequência e gravidade do uso problemático de smartphone (Elhai et al., 2020).
É importante notar que, apesar de existir uma escala internacionalmente utilizada para medir FoMO, como proposto por Przybylski et al. (2013), estudos transculturais são necessários. Uma escala amplamente aceita e validada globalmente permite a compreensão desse fenômeno também na realidade brasileira.
A análise paralela, ao gerar análises simuladas, também proporciona médias das variâncias dessas simulações. Assim, o número de fatores é recomendado quando a variância da matriz amostral (percentual real de variância) supera a média das variâncias das simulações (média percentual de variância aleatória). Nesse caso, apenas um fator atende a esse critério.
É válido mencionar que o FoMO é um fenômeno associado à popularização da internet, sendo essencial para estudos transculturais. No entanto, a escala desenvolvida por Przybylski et al. (2013) foi adaptada para o contexto brasileiro por Sette et al. (2020). Apesar da existência dessa escala internacional, o estudo atual também demonstrou a necessidade de adaptação e validação para a realidade brasileira, enriquecendo o entendimento do fenômeno.
No cenário global, estudos têm associado o FoMO a um maior uso problemático de redes sociais, smartphones, ansiedade e depressão (Elhai et al., 2020). A análise dos resultados da escala adaptada demonstrou similaridades com estudos internacionais. As versões em árabe (Al-Menayes, 2016) e italiano (Casale & Fioravanti, 2020) exibiram uma estrutura de dois fatores com valores de alfa de Cronbach de 0,82 e 0,72, respectivamente. Em estudos com versões turcas (Gökler et al., 2016), espanholas (Gil et al., 2015) e inglesas (Perrone, 2013) para adolescentes, a estrutura unifatorial foi corroborada, com valores de alfa de Cronbach de 0,81, 0,85 e 0,93, respectivamente.
O FoMO é um conceito psicológico relevante na era digital, já validado globalmente por meio de diversas escalas de autorrelato e monitoramento fisiológico (Elhai et al., 2020). Nesse sentido, este estudo contribui para a ciência brasileira ao adaptar e validar uma escala internacionalmente utilizada, permitindo uma compreensão mais profunda desse fenômeno no contexto do país.
Apesar dos méritos, algumas limitações foram identificadas no estudo. A escala FoMO foi originalmente desenvolvida nos EUA e Reino Unido, e a tradução e adaptação procuraram minimizar essa diferença, mas algumas dificuldades persistiram, levando à adaptação de alguns itens. Além disso, uma escala com apenas 10 itens pode ser considerada limitada para capturar a complexidade do fenômeno FoMO. No entanto, a análise fatorial exploratória indicou que os itens da escala estavam altamente correlacionados (0,80), o que sugere que a versão brasileira possui boa consistência interna.
Existe o desenvolvimento de uma outra Escala para a avaliação do FoMO por pesquisadores brasileiros no estudo de Sette et al. (2020). Nesse estudo os pesquisadores criaram uma escala brasileira em 2020. Foram identificados quatro fatores que correspondem às diferentes dimensões do FoMO em usuários de Redes Sociais Online. Fator 1: Necessidade de Pertencer (Need to Belong): Refere-se à necessidade humana fundamental de formar e manter relacionamentos estáveis. Fator 2: Necessidade de Popularidade (Need for Popularity): Relacionado ao desejo interno de aprovação dos pares e ao medo de não ser reconhecido, bem como ao comportamento em OSM reforçado pelo feedback positivo recebido de seus pares. Fator 3: Ansiedade (Anxiety): Relacionado aos sintomas de abstinência e desejo que uma pessoa com FoMO tende a apresentar quando não pode usar a internet ou o smartphone. Fator 4: Adicção (Addiction): Aborda os problemas ocupacionais, acadêmicos ou relacionais experimentados devido ao uso excessivo de Redes Sociais Online (Sette et al., 2020). Apesar de ser um instrumento com dados psicométricos interessantes apresenta algumas limitações por já existir uma escala mundialmente utilizada para avaliar o FoMO. A utilização de uma escala brasileira pode tornar mais desafiador comparar os resultados de estudos brasileiros com estudos internacionais que utilizam uma escala globalmente reconhecida. A FoMO é um fenômeno que transcende fronteiras culturais e pode ser experienciado de maneira semelhante em diferentes partes do mundo. Portanto, uma escala já internacionalmente reconhecida pode ser suficiente para captar as nuances do FoMO em diversos contextos. Utilizar uma escala internacionalmente reconhecida permite a comparação direta dos resultados de estudos realizados em diferentes países. Isso facilita a criação de uma base de evidências que pode ser utilizada para entender as similaridades e diferenças nas experiências de FoMO em diferentes culturas.
Este estudo evidenciou que a adaptação da Fear of Missing Out Scale para o contexto brasileiro apresenta validade inicial para indivíduos de 18 a 63 anos. Os resultados da análise paralela revelaram uma estrutura unifatorial, em consonância com outras adaptações da escala FoMO e com a versão original, consolidando a adequação da escala para uso no Brasil.
Considerações Finais
Este estudo apresenta uma versão traduzida e adaptada da escala Fear of Missing Out. É relevante destacar que esta escala investiga um construto ainda relativamente novo e altamente contemporâneo, cujo desenvolvimento está intrinsecamente ligado a características culturais. Evidências apontam para a variação dos efeitos relacionados ao uso de ferramentas de comunicação social entre diferentes países, faixas etárias e propósitos, o que pode gerar limitações na aplicação de escalas em contextos culturais diversos.
Os itens presentes nessa escala demonstraram ser apropriados em relação à sua compreensão no contexto brasileiro, exigindo modificações substanciais em apenas um deles. Por outro lado, a disponibilização de uma escala de uso livre pode se tornar uma ferramenta valiosa para pesquisadores e profissionais que desejam investigar esse fenômeno de grande importância.
Estudos futuros têm o potencial de enriquecer a análise desse fenômeno em grupos específicos, inclusive em contextos clínicos, permitindo a verificação dos efeitos desse relevante construto psicológico em cenários particulares. Adicionalmente, explorar as associações entre o Fear of Missing Out e outros aspectos psicológicos poderá contribuir para uma compreensão mais abrangente desse fenômeno complexo.