1. Desenvolvimento profissional docente e a formação pedagógica: pressupostos teóricos
O conceito de desenvolvimento profissional docente compreende uma perspectiva ampliada de formação “porque marca mais claramente a concepção de profissional do ensino e porque o termo ‘desenvolvimento’ sugere evolução e continuidade, rompendo com a tradicional justaposição entre formação inicial e continuada” (Garcia, 1999, p. 137). Para Soares e Cunha (2010), o desenvolvimento profissional docente envolve uma perspectiva institucional e uma perspectiva pessoal do professor. Ainda segundo as autoras, a perspectiva institucional envolve um conjunto de ações sistemáticas que vão além do mero aspecto informativo, uma vez que essas ações visam mudar não só os conhecimentos profissionais, mas também as práticas e crenças dos professores. E é desta perspectiva institucional que o presente trabalho se ocupa ao apresentar as ações de formação pedagógica docente em uma instituição brasileira e outra uruguaia.
O desenvolvimento profissional precisa ser compreendido como um direito do professor enquanto trabalhador da área da educação, mas que, no caso da educação superior, encontra algumas barreiras de cunho político-institucional e de peso histórico vinculado à cultura acadêmica. Essas dificuldades não podem ser deixadas de lado ao discutirmos a formação pedagógica no nível superior. Isso se deve ao fato de o trabalho com o desenvolvimento profissional docente, quando realizado na perspectiva da formação em serviço, ser conduzido por setores institucionais que também são impactados por estes mesmos condicionantes (Almeida, 2012; Cunha, 2006a).
Falar sobre formação pedagógica implica, ainda, compreendê-la numa dinâmica diversa, pois, várias concepções coexistem e destas derivam diferentes modelos formativos. Uma dessas compreensões está mais focada em uma dimensão pessoal do próprio sujeito professor (Bolzan, 2008), outro ideário é voltado às capacidades docentes e à vontade dos professores em investirem na própria formação (Masetto e Gaeta, 2015). Enquanto isso, outra perspectiva enfatiza o papel do professor na ativação dos processos de aprendizagem dos estudantes (Garcia e Vaillant, 2009). Estes exemplos demonstram que, frente a um cenário diverso de possibilidades relacionadas à maneira de conceber o que é e para que serve a formação pedagógica, é essencial a clareza sobre qual escolha atende as necessidades da instituição que se propõe a construir estratégias de formação pedagógica (Antonello, 2021).
Cabe à assessoria pedagógica universitária, na figura dos seus assessores, ou seja, dos profissionais que atuam no setor pedagógico das instituições de ensino superior (IES), o planejamento e desenvolvimento de ações que viabilizem a formação pedagógica dos docentes em toda a complexidade que esta tarefa envolve, uma vez que estes docentes advêm de diferentes áreas e possuem distintas visões e experiências. Como explica Broilo (2015), não se trata de conformar no sentido de formatar ou colocar numa forma, mas de criar condições de questionamento, reflexão e transformação face à realidade de atuação profissional.
A assessoria pedagógica universitária, portanto, é a responsável por ações de assessoramento pedagógico, enquanto “ação intencional de acompanhamento e apoio aos processos pedagógicos” (Cunha, 2006b, p. 383) no ambiente do ensino superior, que “interferem no ensinar e aprender em toda a dimensão que esses processos assumem, junto aos demais atores de tais processos, em suas distintas áreas de conhecimento” (Xavier, 2019, p. 55).
1.1. Percurso metodológico: alcançando as experiências
Na sequência, apresentam-se, à vista deste contexto teórico das assessorias pedagógicas universitárias, duas experiências institucionais selecionadas, respectivamente, no Uruguai e no Brasil, a partir das quais se refletem distintos modelos de formação pedagógica docente.
Sob uma abordagem qualitativa, e a partir de uma metodologia de estudo de casos múltiplos (Yin, 2001), cotejamos duas experiências relacionadas a um mesmo pilar: a oferta de formação pedagógica com vistas à promoção do desenvolvimento profissional docente.
Metodologicamente, os dois casos selecionados foram alcançados a partir de duas distintas pesquisas anteriores (Carrasco, 2020; Xavier et al., 2022) 2 em que se estudou em profundidade as experiências aqui relacionadas. O estudo da experiência do Uruguai teve a coleta de dados desenvolvida em 2019, in loco, relacionada a uma pesquisa de doutoramento em educação (Carrasco, 2016), cujos instrumentos de coleta englobaram entrevistas semiestruturadas com assessores pedagógicos, pesquisa participante e grupos focais, além de pesquisa documental em documentos disponíveis na Web. Por sua vez, a coleta da experiência do Brasil referiu-se ao triênio 2020-2022 e fundamentou-se essencialmente em pesquisa documental relativa a um programa de desenvolvimento profissional de uma universidade federal brasileira, cujo acervo foi disponibilizado pelas assessoras pedagógicas da instituição em questão.
1.2. Experiência de formação pedagógica: o caso do Uruguai
A universidade pesquisada no Uruguai tem tradição e expõe uma rica trajetória do trabalho pedagógico, obtendo destaque na área. A assessoria pedagógica universitária tem sido pauta de reflexões e investigações há mais de trinta anos no país e nessa universidade, pois o assessor pedagógico universitário passou a ter um espaço de destaque desde o período pós-ditadura, abertura política e reestruturação da universidade.
Este período trouxe o assessor como figura fundamental no que tange às mudanças curriculares, necessárias para o objetivo de promover a ampliação do acesso ao ensino superior, como também a permanência e a qualidade do ensino. A substituição de um currículo instrumental e técnico para uma perspectiva social e histórica de ensino exigia a presença de profissionais que pudessem articular todo este processo junto à gestão e aos docentes.
Nessa direção, foram criados núcleos dedicados às questões pedagógicas da universidade, denominados Unidades de Apoio ao Ensino (UAE). Collazo et al. (2015) explicam que estes núcleos tinham como objetivo manter um trabalho permanente de assessoramento pedagógico junto às faculdades, institutos, escolas e centros universitários. Relatam que foram criados, inicialmente, com a finalidade de promover a formação docente voltada aos processos de renovação curricular dos anos 80 e 90, mas que até hoje cumprem funções fundamentais voltadas às políticas centrais de ensino da universidade. Além das UAE, a universidade pauta suas ações em um Plano Estratégico (PLEDUR) que baliza e norteia o trabalho, ocupando, neste contexto, a formação pedagógica do docente da universidade um espaço privilegiado (PLEDUR, 2001, p. 54, apud Collazo et al., 2015, p. 220).
No decorrer do tempo, com o objetivo de promover formações que pudessem cada vez mais dialogar com as práticas dos docentes, foram criados cursos de pós-graduação e mestrado em ensino para os professores de todas as áreas da instituição. Com isso, é importante evidenciar que há diversas faculdades que funcionam em prédios distintos e que pertencem à universidade, totalizando 24 unidades. Cada uma dessas faculdades organiza sua UAE e sua formação pedagógica de acordo com a área e as perspectivas do grupo, o que denota uma autonomia de trabalho e gera distintas características no desenvolvimento da pauta pedagógica de cada uma dessas unidades.
Relevante, também, mencionar que para o ingresso como docente da universidade não há a exigência de formação em nível de pós-graduação, ou seja, a formação em graduação na área já qualifica o profissional a ser docente após um processo de seleção. Também não é exigida nenhuma formação pedagógica. A Comissão Setorial de Ensino (CSE)3- órgão que acompanha as unidades - explica que há pouco tempo algumas disciplinas têm exigido a formação em doutorado para o ingresso do docente, o que ainda é raro na cultura da universidade.
Na instituição uruguaia, o trabalho dos assessores que atuam nessas unidades, além da formação docente e o assessoramento pedagógico, inclui: apoio estudantil; assessoramento à reelaboração de currículos, participando das comissões de carreiras; reflexão, reelaboração e análise da avaliação institucional. Em outras palavras, as assessorias são parte da estrutura organizacional da instituição e a formação se faz presente por toda ela.
A CSE explica que, inicialmente, a maioria dos assessores pedagógicos eram pedagogos, mas, com o passar do tempo, foram criados cursos de pós-graduação em nível de mestrado e doutorado em educação para formar os docentes das diversas áreas para que estivessem aptos a trabalharem com a formação pedagógica do docente universitário. Há também uma rede que se chama Rede de Controle do Ensino, que auxilia e fortalece cada uma das unidades em suas tarefas formativas. Assim, o trabalho dessas unidades foi se transformando no decorrer do tempo, avançando mais em alguns locais e menos em outros.
Para compreendermos a autonomia e os encaminhamentos dessas unidades, destacamos aqui o trabalho desenvolvido em duas faculdades (Carrasco, 2020).
Em uma delas há 350 professores e 2500 estudantes, distribuídos entre quatro cursos de uma área médica, com oferta de pós-graduação, uma Seção de Educação Permanente, que oferece vários cursos para egressos e pessoas da comunidade e funciona como uma proposta de extensão universitária, além do hospital que atende à comunidade em todas as especialidades. A atuação dos assessores se dá no Departamento de Educação - DEV. Este departamento se encarrega da formação pedagógica dos docentes, apoia e assessora aos docentes em suas atividades de ensino, colabora com a elaboração de materiais didáticos para os estudantes, bem como auxilia na incorporação de tecnologias da informação e comunicação nas práticas cotidianas. É responsável, também, por investigar aspectos da docência universitária e rendimento dos estudantes e coordena a avaliação institucional que os estudantes realizam dos docentes. O trabalho do assessor no departamento, além das tarefas de formação docente e do trabalho desenvolvido com a avaliação institucional, também inclui o acompanhamento das mudanças curriculares e que envolve a orientação dos estudantes. O interessante é que há um grande empenho dos próprios profissionais da unidade em realizarem pesquisas na área da Assessoria Pedagógica e da Pedagogia Universitária, o que permite consolidar cada vez mais o campo.
Sobre a formação pedagógica, possuem uma proposta que é ofertada todos os anos com as temáticas de metodologias de aprendizagem e avaliação, e outra que trata de análises de prática de ensino. O programa é realizado pela maioria dos professores, pois é muito considerado na avaliação deste docente e no ingresso para concurso. Quem tem a formação ganha pontos extras no concurso e quem já é efetivo da casa melhora sua avaliação, o que interfere em sua progressão funcional, além de poder ser utilizado como crédito para o mestrado. Esclareceu, ainda, que há outras formações no decorrer do ano, de acordo com a demanda da faculdade e de propostas que surjam. Assim, ocorrem palestras, oficinas e outros eventos voltados para a formação pedagógica do docente universitário. O departamento auxilia, também, como gestor de conflitos entre profissionais ou entre professores com alunos. O desenvolvimento de uma cultura digital na instituição também tem ficado por conta deste espaço pedagógico.
Quanto à organização deste espaço, o DEV é formado por assessores que, na verdade, se tornaram docentes da instituição, conquistas funcionais que fazem a diferença na atuação destes profissionais. Para fortalecimento do departamento, todos os assessores que trabalham ali passaram por concurso docente e assumiram a diversidade de tarefas do departamento e não a docência direta com os alunos. Há preocupação com um trabalho de formação aprofundada e reflexiva, com total interlocução com a área de atuação, em detrimento de uma aprendizagem superficial acerca das questões pedagógicas soltas, sem contexto. Há, ainda, uma preocupação no atendimento às disciplinas, no âmbito de auxiliar aos docentes em suas propostas de inovação curricular e metodológica.
Em outra faculdade da mesma universidade, há uma Unidade de Ensino que realiza diferentes ações que buscam estudar e melhorar os processos de ensino e de aprendizagem da instituição. Entre essas atividades estão aquelas que se dirigem à formação pedagógica dos docentes universitários. Dedica-se, também, a desenvolver atividades junto aos estudantes. A Unidade conta com sete docentes que formam uma equipe multidisciplinar para atender às demandas de todas as áreas. Além das tarefas de formação e atendimento, a Unidade realiza pesquisa nas temáticas que envolvem a área pedagógica, como alunos ingressantes, permanência estudantil, rendimento acadêmico e formação didática.
Na página da Unidade encontram-se os cursos que têm sido ofertados: Metodologias de Ensino e Avaliação, Desenho de Unidades Didáticas, Classes filmadas e mediadas, Educação Científica e Epistemologia, entre outros, além de várias oficinas.
Essa Unidade se dedicou, por muito tempo, a trabalhar com os Planos de Estudos dos cursos, mas depois passou a se dedicar a outras tarefas. Quem dirige a Unidade acaba encaminhando o trabalho, a partir de sua própria perspectiva, entretanto, uma gestão anterior estava bastante preocupada com a formação pedagógica e encaminhou todo o trabalho da Unidade nessa direção. Assim, a oferta de formação pela Unidade também foi se transformando com o decorrer do tempo. Até 2005, as formações eram realizadas por área, em toda a universidade, porém se percebeu que este tipo de proposta formativa não estava atendendo às especificidades de cada faculdade, o que resultou na descentralização desta formação.
Com isso, ficou para cada faculdade a responsabilidade de ofertar propostas de formação mais adequadas às suas realidades. De imediato, criaram-se vários cursos, totalizando sete, não ofertados todos ao mesmo tempo, mas com regularidades diferenciadas. Alguns eram semestrais, outros anuais, outros ofertados a cada dois anos. Porém, o público começou a diminuir, ao ponto de, em algumas propostas, estarem apenas a equipe da Unidade e um ou dois professores para participarem da formação. Essa realidade fez com que a Unidade passasse por uma reformulação na oferta de cursos. Hoje, há um curso que é obrigatório para todos os docentes ingressantes. Este curso é oferecido no início de cada semestre e tem como título Desenhos da Didática para o Planejamento.
Outra proposta pensada pela Unidade é a Tutoria Didática. A tutoria é um assessoramento por demanda. A cada início de semestre a Unidade abre um edital e grupos de docentes se inscrevem para receberem assessoramento e formação específicos às suas demandas e necessidades. Explicou que conseguem manter entre dois a três docentes (ou grupos do mesmo setor) por semestre, o que tem sido uma boa quantidade, pois é um trabalho mais minucioso, totalmente direcionado e que tem surtido efeitos muito bons onde realmente interessa - no trabalho desenvolvido em sala de aula.
1.3. Experiência de formação pedagógica: o caso do Brasil
A experiência brasileira aqui relatada se refere a estudo anterior (Xavier et al., 2022) acerca de uma universidade federal, que conta com um Departamento de Apoio Pedagógico (DAP), unidade da Pró-Reitoria de Graduação (Prograd), e com Assessorias Pedagógicas (AP) ligadas às Coordenadorias de Graduação (Cograd), que atuam nos campi fora de sede com as mesmas atribuições do DAP.
O DAP e as AP oferecem assessoria e orientação em aspectos pedagógicos aos diferentes órgãos e agentes do processo de ensino-aprendizagem, nos cursos de graduação. As principais atribuições do DAP e AP, que, portanto, são os setores pedagógicos da instituição, recaem no planejamento curricular dos cursos e na formação pedagógica dos docentes.
O planejamento curricular se dá por meio de acompanhamento dos processos de criação e alteração dos projetos pedagógicos de cursos (PPC), junto aos Núcleos Docentes Estruturantes (NDE) dos cursos de graduação, assim como por estudos diversos que resultam em orientações ou pareceres técnico-pedagógicos, que orientam a construção de instruções ou normativas que afetam a organização curricular e acadêmica dos cursos da universidade. No processo de formação pedagógica docente, contemplam-se tanto atendimentos pontuais a docentes, grupos ou coordenações que requerem apoio, como, também, a coordenação do Programa Institucional de Desenvolvimento Profissional e Formação Pedagógica Docente (Prodoc), em que se concentram as ações dos planos de formação pedagógica. O planejamento do Prodoc se pauta na escuta dos professores, a partir de suas manifestações em instrumentos de avaliação das atividades formativas, quando se abre espaço para que manifestem sobre projetos ou temas que têm interesse ou necessidade de discussão. Entretanto, temas requisitados pela gestão também compõem o plano de formação, uma vez que partem dos órgãos colegiados onde há representação de todos os segmentos da comunidade acadêmica.
Até o ano de 2019, as ações de formações eram planejadas de modo fragmentado, isto é, no campus sede havia uma programação, chamada de Projeto Institucional, enquanto que nos campi fora de sede eram desenhadas outras programações, atendendo apenas a especificidade local e, por isso, era chamada de Projeto Local do Prodoc. Contudo, a partir do ano de 2020, em que as atividades acadêmicas presenciais foram suspensas em função da pandemia da Covid-19, todas as ações de formação passaram a ser ofertadas no âmbito do Projeto Institucional (PIDoc), porque se verificou que não fazia sentido compartimentalizar a oferta, tendo em conta que a formação deveria proporcionar condições pedagógicas de enfrentamento aos desafios da prática pedagógica no ensino superior.
Esse é o modelo formativo que vem delineando a oferta de formação didático-pedagógica institucional, ou seja, a partir de um programa de desenvolvimento profissional unificado que prima pelo desenvolvimento de projetos formativos que contemplem a multiplicidade de professores do quadro da instituição. O DAP e AP buscam validação das ações junto aos colegiados dos cursos de graduação, incluindo coordenadores na própria coordenação e desenvolvimento do plano de formação.
A organização do plano de formação no recorte de 2020 a 2022 foi concebida como um espaço de formação em que o diálogo com e entre os professores, a partilha de experiências, dentre dilemas e sucessos, pudessem contribuir com a construção de novos saberes que apoiassem os docentes a reorganizarem ou construírem novos saberes sobre a profissão docente. As ações, portanto, refletiram uma concepção que não trata a formação como um pacote de receituários pedagógicos, mas, ao contrário, oportunizam o olhar para as emergentes variáveis que afetam o ensino superior, buscando fundamentações conceituais e experiências concretas que permitem revisitar as próprias práticas.
No que se refere ao alcance da formação, as atividades realizadas atingiram os docentes das treze Unidades Acadêmicas (UA) que compõem a instituição. Estas Unidades abarcam as múltiplas áreas de conhecimento (ciência e tecnologia, ciências da natureza, ciências humanas, ciências sociais aplicadas, exatas, saúde) e permite-nos inferir que a formação contempla os docentes das diferentes áreas, porque não se refere a uma pedagogia específica, senão, antes, respeita as diferentes epistemologias dos campos de conhecimento. Evidencia-se, com isso, uma concepção de formação que se pauta na produção coletiva de conhecimentos, a partir do respeito aos diferentes campos epistemológicos. Este processo, ao abordar questões sobre a docência, o ensinar, o aprender e o avaliar no ensino superior, permite articulações epistemológicas (Cunha, 2015) que revelam as diferentes pedagogias (no plural) e que marcam as práticas pedagógicas de cada comunidade, reconhecendo que “há estruturantes comuns e sobre eles se instala uma condição dialógica que articula a base do saber docente” (Leite et al., 2015, p. 15).
Como as atividades foram abertas ao público externo, a formação alcançou também docentes de muitas instituições educativas do Brasil, que atuam em diferentes níveis de ensino. Na caracterização administrativa destas instituições, encontram-se docentes vinculados a universidades federais, estaduais, privadas, confessionais, faculdades isoladas, centros universitários, autarquias nacionais, secretarias de educação estaduais e municipais. A formação chegou, inclusive, a docentes estrangeiros, notadamente da Argentina, de Portugal, de Angola e de Moçambique, em um intenso movimento de partilhas de experiências.
No que se refere à participação docente, o tema tem sido alvo de estudos e na literatura se descreve que a baixa adesão às formações está relacionada ao formato em que são oferecidas e ao caráter de sua não continuidade (Carrasco, 2016; 2020). Outra questão apontada na literatura se refere ao fato de as formações estarem relacionadas ao estágio probatório dos docentes, o que vincula a uma ideia mensurável de formação, relacionada apenas aos ingressantes na carreira (Xavier et al., 2017). Nesta lógica, os dados relativos à participação, com números expressivos de professores inscritos (uma média superior a cem inscritos por formação), permitem-nos inferir que o princípio da continuidade, presente no plano de formação do Prodoc e que rompeu com ações isoladas, pode justificar tal adesão, assim como a explicitação dos objetivos formativos permitiu romper com a ideia de que a formação se destina apenas a docentes ingressantes. A concepção aplicada ao plano de formação permite uma cadência de atividades em que se retomam discussões anteriores, provocando a construção de sentidos que podem evoluir para a construção de saberes pedagógicos.
2. Considerações em torno das experiências: aproximações e distanciamentos
A busca pela qualificação da docência no contexto do ensino superior deve ser uma política institucional que impulsione, de fato, essa valorização; a constituição de espaços formativos e a busca pela adoção e a contratação de profissionais qualificados para esse ofício revelam a preocupação institucional que deve se impor sobre tal temática.
A partir das experiências apresentadas, identificamos diferentes concepções que sustentam a implementação de políticas institucionais em relação à formação pedagógica docente. Enquanto no Brasil percebe-se um movimento que direciona a formação para uma abrangência institucional, atendendo amplamente os docentes do quadro, no Uruguai percebe-se um caminho inverso, em que a formação é fracionada e destinada à responsabilidade de cada Unidade, atendendo a realidades específicas em detrimento do conjunto total do quadro docente. Entretanto, a experiência do Uruguai mostra maturidade não identificada na experiência brasileira, no que se refere à valorização da participação docente nos programas de formação, a partir do incentivo de aproveitamento de tal participação na progressão na carreira.
As diferenças são percebidas, ainda, no que se refere à valorização institucional dos próprios assessores pedagógicos. Na experiência uruguaia, há um processo institucionalizado de valorização, intervenção e investimento para os espaços formativos, principalmente no que se refere à ascensão dos assessores pedagógicos a cargos docentes, condição essa que viabiliza a legitimidade das ações de formação pedagógica. Já na experiência brasileira, os assessores não ocupam tal cargo, o que dificulta a legitimidade dos assessores, que passa a ser buscada, como identificado nos relatos, pela validação das propostas de formação junto a outras instâncias de gestão, como a coordenação dos cursos.
Entretanto, com distintos pontos positivos e negativos, observamos que as duas experiências aqui apresentadas retratam inúmeros esforços que ambas as instituições têm feito para a manutenção e preservação desses espaços de formação e da presença desses profissionais que assessoram pedagogicamente e com maestria os docentes das universidades. Destaca-se, nesse sentido, que em ambas as instituições as atividades formativas provêm das necessidades e das demandas dos professores, alcançando, assim, um impacto mais significativo no que tange à corresponsabilidade dos professores na constituição desse processo formativo, rompendo com apenas a participação pontual e superficial nestes espaços institucionais de formação.
O conjunto de experiências alerta-nos, portanto, que as ações formativas não podem ser apenas pontuais e se dar em cenários adversos. A constituição da profissionalidade docente é permanente, sendo preciso sua retroalimentação de forma sistemática e reflexiva, a partir de espaços solidificados e legitimados em relação à responsabilidade formativa. Isso nos aponta a necessidade de políticas institucionais que assumam de fato essa prerrogativa e que ela não fique subjugada a interesses pessoais e a mudança das equipes que compõem a gestão institucional.