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Revista Uruguaya de Antropología y Etnografía

Print version ISSN 2393-7068On-line version ISSN 2393-6886

Rev. urug. Antropología y Etnografía vol.6 no.2 Montevideo  2021  Epub Dec 01, 2021

https://doi.org/10.29112/ruae.v6i2.991 

Dossier

Cultura com data para acabar? Trabalho humano-equino e as vertigens que assolaram carroceiros, veterinários e ativistas da libertação animal numa controvérsia no início do século XXI

Culture with an expiry date? Human and equine work and the vertigoes that gripped cart-drivers, veterinaries and animal liberation activists in an early Twentieth Century controversy

¿Cultura con fecha de caducidad? El trabajo humano-equino y los vértigos que asolaron a carroceros, veterinarios y activistas por la liberación animal en una controversia a inicios del siglo XXI

Ricardo Alexandre Pereira de Oliveira1 
http://orcid.org/0000-0002-6169-3192

1Doutorando em Antropologia Social na Universidade de Brasília. ricardo.apo.oliveira@gmail.com


Resumo

O artigo trata da controvérsia da tração animal, que envolve cavalos, carroças, carroceiros (dentre eles, ciganos e quilombolas), veterinários, biólogos, antropólogos, advogados, parlamentares, gestores públicos e ativistas da libertação animal. A partir de pesquisa etnográfica, discuto o modo como ideais de evolução e progresso foram mobilizados em políticas governamentais de descarroceirização da cidade de Belo Horizonte, Brasil, na segunda década do século xxi. Ao descrever o período em que ocorreram duas tentativas de criminalização das carroças e uma disputa em torno do tipo de ferradura a ser utilizado por cavalos que trabalham, desdobro as concepções divergentes sobre trabalho, animalidade e humanidade de diferentes atores implicados na controvérsia. Este texto é resultado do trabalho de pesquisa, extensão e assessoria com carroceiros e cavalos, que implicou observação participante, compilação de documentos e leis, a fundação de um movimento social e o registro do processo de disputas que culminou na aprovação de uma lei de criminalização dos carroceiros, cavalos e carroças.

Palavras-chave: Antropologia dos coletivos de humanos e não humanos; trabalho animal (equino); carroceiros; controvérsias; libertação animal

Abstract

This article addresses the controversies around animal traction involving gypsies, “quilombola” communities, veterinaries, biologists, anthropologists, parliamentary figures and animal rights activists. By exploring the description of a period that witnessed two attempts to criminalize horse-drawn carts and a dispute around the type of horseshoe to be used by working horses, I unfold the diverging concepts about work, animality and humanity put forth by different actors involved in these controversies. This text is the result of fieldwork, extension and assessment with cart-drivers and horses, from participant observation, compiling documents and laws, to the foundation of a social movement and recording a process of dispute escalating into laws being passed to criminalize horses, horse-driven carts and horse-driven cart-drivers.

Keywords: Anthropology of human and non-human collectives; equine work; cart-drivers; controversies; animal liberation

Resumen

El artículo trata de la controversia en torno a la tracción animal, que implica a gitanos, miembros de comunidades de quilombos, veterinarios, biólogos, antropólogos, parlamentarios y activistas por la liberación animal. Al explorar la descripción de un período en que sucedieron dos tentativas de criminalización de los carros y una disputa en torno al tipo de herradura a ser usado por los caballos que trabajan, desarrollo las concepciones divergentes sobre trabajo, animalidad y humanidad de diferentes actores implicados en la controversia. Este texto es resultado de un trabajo de investigación, extensión y asesoría con carroceros y caballos, que incluyó observación participante, la recopilación de documentos y leyes, la fundación de un movimiento social y el registro de un proceso de disputas que culminaron en la aprobación de una ley de criminalización de los caballos, los carros y de sus conductores.

Palabras clave: Antropología de colectivos humanos y no humanos; trabajo animal (equino); carreteros; controversias; liberación animal

Um coletivo de humanos e não humanos entrelaçados e suas composições

De tempos em tempos a controvérsia da tração animal reaparece em Belo Horizonte, Brasil, cada vez numa configuração diferente. Meu objetivo com este texto é descrever um período específico dessa controvérsia, que abarca duas tentativas de proibição da tração animal e consequente criminalização dos carroceiros.

Em resumo, a controvérsia se refere ao que significa a tração animal e se ela deve continuar a existir. Ativistas da libertação animal afirmam que não há justificativa técnica, moral ou econômica para a continuidade desse tipo de trabalho. Eles dizem que os veículos de tração animal tendem a ser substituídos por veículos motorizados por serem tecnicamente obsoletos e que há na sociedade moderna um progressivo reconhecimento de indivíduos animais como sujeitos, o que estende o princípio da igualdade para que sejam protegidos social e juridicamente (Carman, 2017; Froehlich, 2016; Perrota, 2016). Carroceiros, ao contrário, afirmam que o trabalho com os cavalos é legítimo, importante e sempre existirá, independentemente da invenção de máquinas e veículos, pois trata-se de um modo de viver e de se relacionar com os animais e com a cidade (Lopes, 2013; Oliveira, 2017). Eles dizem que visões preconceituosas sobre essa atividade desconsideram elementos fundamentais da relação com os cavalos e com o mundo que habitam, fazendo com que casos isolados de maus tratos sejam usados para condenar e perseguir injustamente todo o coletivo.

O poder legislativo municipal de Belo Horizonte se tornou um ponto de passagem obrigatória para ativistas da libertação animal e para carroceiros que trabalham junto a cavalos atrelados a carroças, motivo pelo qual ganhou centralidade neste texto, uma vez que a esfera municipal é a instância do Estado com competência para regular o trânsito onde trafegam as carroças e para permitir ou proibir as relações de trabalho e coabitação entre humanos e equídeos de tração. O termo carroceiro é autoatribuído e exerce um importante sentido existencial e identitário para esses trabalhadores. O termo trabalhador e o ato de trabalhar são atribuídos pelos carroceiros a si próprios e também aos cavalos, com quem eles afirmam trabalhar junto. Eles dizem que a convivência com os cavalos tampouco se restringe ao trabalho, pois abarca outras dimensões da vida individual, familiar e coletiva (Oliveira e Mendes, 2020).

O ator constituído por humanos, equinos e carroças movimenta uma miríade de materiais coletados, transportados e depositados em locais definidos pelas prefeituras. A centralidade de Belo Horizonte neste texto ocorreu porque todos foram direcionados sobretudo aos poderes executivo e legislativo dessa cidade em decorrência do risco de proibição. Como a atividade dos carroceiros e seus cavalos abarca vários municípios da região metropolitana, o risco de as proibições se alastrarem acabou aglutinando indivíduos e grupos de cada uma dessas regiões em torno da luta contra a proibição da tração animal na capital de Minas Gerais.

Os atores que tomaram parte nesse processo formaram uma ampla rede sociotécnica unida pelo interesse nos cavalos, do qual emergiram posições radicalmente distintas e com desdobramentos variados, como descrevo adiante. Além dos ativistas da libertação animal e dos carroceiros, cuja relação com a tração animal é mais direta, muitos outros agiram no sentido de dar apoio técnico, fornecer orientação jurídica, fazer pressão política e criar visibilidade midiática às diferentes posições afirmadas em cada situação. Páginas e grupos do Facebook, projetos de lei, reportagens de televisão e jornal, uma ação civil pública e transformações legislativas e administrativas foram resultantes dessas distintas agências, e também desdobraram agências não humanas próprias, como a tramitação do Projeto de Lei (pl) de proibição das carroças, que agregou tudo isso em um mesmo coletivo (Latour, 2017).

A imagem dos carroceiros-e-cavalos-e-carroças circulando pelas ruas da cidade destoa daquelas figurações em que o cavalo aparece como animal nobre, de elite. Como é discutido por Ana Paula Boscatti e Miriam Adelman (2020), o cavalo teve papel fundamental na história moderna, incorporado como símbolo de status, poder e nação. As autoras demonstram que, no Brasil, a figura do homem branco montado a cavalo historicamente expressou a hegemonia de gênero e raça da elite nacional, como se observa nas pinturas de Pedro Américo “A batalha do Avaí” (1877) e “Independência ou Morte” (1888). As autoras discutem também uma performance pública do presidente Jair Bolsonaro durante a pandemia de covid-19 no país, onde a imagem do homem branco montado a cavalo, sem máscara, desfilando junto à cavalaria do Exército, foi mobilizada como significante do poder frente à insegurança nacional provocada pelo novo coronavírus (Boscatti e Adelman, 2020). Tanto nas pinturas históricas de Pedro Américo como nas fotografias reproduzidas nas mídias digitais, elas ressaltam, certos homens e certos cavalos se associam na composição de narrativas de soberania nacional.

O ator híbrido composto por humano-equino-carroça, por outro lado, exibe na cidade um tipo de cavalo proletário, um cavalo de periferia, dos assentamentos ciganos e dos quilombos. Essa composição suscita a controvérsia: pode a associação humano-equino-carroça existir? A lei municipal que estabelece uma contagem regressiva de dez anos até sua proibição (Brasil, Belo Horizonte (2021) faz supor que a discussão tenha sido estabilizada com a resposta “não, não pode existir e será extinta sob a pesada letra da lei e da polícia da sociedade moderna”.

Duas frentes do movimento de libertação animal atuaram na controvérsia, nucleadas em torno do Movimento Mineiro pelos Direitos Animais, que fez pressão política e eleitoral, e do Instituto Abolicionista Animal, que moveu uma ação civil Pública em 2015 contra a prefeitura de Belo Horizonte, na qual denunciava ao Ministério Público de Minas Gerais (mpmg) a alegada omissão quanto a maus tratos cometidos contra animais de tração, que culminou na assinatura de um Termo de Acordo entre o Instituto e a Prefeitura em 2018, mediado pelo mpmg, mas sem consulta ou participação dos carroceiros.

Em 2013, foi proposto pela primeira vez um pl de proibição das carroças, que estipulava oito anos para a extinção. O pl 832/2013 gerou grande repercussão e ampla cobertura midiática das grandes carroceatas que atravessaram a cidade em protesto e da audiência pública que definiu a retirada de tramitação (Oliveira, 2017). Na justificativa do pl havia o seguinte parágrafo: “Cuidar da natureza é também um estágio essencial da evolução da civilização. Já temos tecnologia suficiente para fazer esta passagem de cultura neste modo de produzir”.1 Argumento semelhante está contido no decreto municipal que institui a “Política de Proteção e Defesa dos Animais”, no qual está inscrita a seguinte frase: “há necessidade de elaboração de uma política pública para defesa e proteção dos animais no Município a fim de contribuir para a evolução sociocultural da população de acordo com valores fundamentais éticos e socioambientais, imperativos do Estado pós-moderno” (Brasil, Belo Horizonte (2016). O Decreto n.o 16.431 postula a substituição do uso das carroças como parte dessas ações social evolucionistas.

A coincidência da época de defesa de minha dissertação de mestrado com a proposição de um segundo pl de proibição das carroças2 criou o contexto em que fui convidado pelo líder do recém fundado Movimento dos Carroceiros Unidos para que os assessorasse tecnicamente, organizando a documentação relativa à controvérsia e traduzindo para eles os termos jurídicos, legislativos e filosóficos com os quais estavam em interação. O carroceiro Zé da Horta havia articulado em torno de si catorze trabalhadores de diferentes regiões da cidade com o propósito de impedir a proibição e buscava aliados nas universidades, nos partidos e nas igrejas. Um missionário evangélico que trabalhava para um deputado federal do Partido Social Cristão (psc) e para um vereador do Podemos (depois Cidadania) insistia na criação de um sindicato. Já as lideranças regionais reivindicavam a criação de uma associação ou uma cooperativa, pois seria descentralizada, respeitando a autonomia comunitária de cada região em suas especificidades. Ao longo dos anos seguintes, houve um afastamento do missionário evangélico e uma aproximação de setores progressistas da Igreja católica, como a Cáritas e a Comissão Pastoral da Terra (cpt), cuja mediação os colocou em contato com advogados populares, movimentos sociais e comunidades tradicionais.

Enquanto agregador daquele grupo de lideranças regionais, embora tenha priorizado o critério geográfico para convidar participantes que compusessem o movimento, Zé acabou por juntar numa mesma organização pessoas bastante diversas também em outros aspectos. Dentre os treze homens e uma mulher, havia cinco pessoas nas faixas de trinta e de quarenta anos e duas nas faixas de vinte e de cinquenta anos, sendo oito pessoas negras, cinco brancas e uma de origem cigana. Para compor o que chamo aqui de assessoria técnica, Zé convidou veterinários, biólogos, padres, pastores, advogados populares e movimentos sociais de defesa dos direitos humanos e da agroecologia. As reuniões semanais em seu curral ocorreram ao longo dos primeiros anos de tramitação do pl, onde se discutia o trabalho animal, os aspectos culturais das carroças e possibilidades de construção política e jurídica, processo no qual foi fundada a Associação dos Carroceiros e Carroceiras Unidos(as) de Belo Horizonte e Região Metropolitana (accbm).

Apesar da utilização por eles do termo classe, as concepções sobre sua definição variavam muito, sobretudo por parte de seus apoiadores. O vereador Gilson Reis (Partido Comunista do Brasil PCdoB, por exemplo, entendia que a evidência da constituição como classe econômica bastava para a operacionalizar a classe política a ser representada por uma só pessoa, desconsiderando a forte valorização da autonomia individual e comunitária pelos carroceiros, que inviabilizava a atribuição do poder político a uma liderança central.

Por outro lado, a atribuição de definições por parte de seus antagonistas se proliferava nas outras partes dessa grande rede formada a partir dos cavalos. Acompanhei algumas manifestações pelo fim da tração animal, como a que ocorreu em quinze de fevereiro de 2020, num domingo à tarde na Praça da Liberdade. O dia, local e horário eram os mesmos das manifestações da extrema direita bolsonarista da cidade, com a diferença de que, naquela, dentre os cerca de cem participantes, havia indivíduos e coletivos anarquistas antifascistas, que exibiam cartazes contra a “escravidão animal”. Dentre os parlamentares de direita, como o deputado federal Fred Costa (Patriota, o antigo Partido Ecológico Nacional pen) e o vereador Léo Burguês (Partido Social Liberal psl), a ênfase era a exaltação patriótica e a exigência de punição e prisão de carroceiros, chamados de bárbaros, bandidos e traficantes. Posicionamentos baseados em discriminação racial e punitivismo se justapunham, de maneira um tanto paradoxal, aos posicionamentos dos anarquistas veganos e pré-candidatas de centro-esquerda, como Adriana Araújo (Partido Socialista do Brasil psb) e Duda Salabert (Partido Democrático Trabalhista pdt) que, por sua vez, enfatizavam a generalização de valores humanistas como liberdade, igualdade e justiça. Os discursos eram bastante heterogêneos, variando ao longo de dois polos - libertação dos animais e prisão dos carroceiros. Os ativistas que defendiam a reorientação profissional dos trabalhadores pelo viés da assistência social mobilizavam slogans como “cavalo não é escravo” e “a miséria não justifica a crueldade”.

O autor do projeto de proibição, Osvaldo Lopes (Partido Humanista da Solidariedade phs), organizador da manifestação, enfatizou as coalizões construídas para a aprovação do pl, que incluíram toda a chamada Frente Parlamentar Cristã,3, que teve como principais bandeiras a criação do Programa Escola Sem Partido e o impedimento do ensino da chamada ideologia de gênero nas escolas municipais. O presidente dessa frente parlamentar, que suplementou seu nome para Jair Bolsonaro Di Gregório (Partido Progressista pp), um dos maiores defensores do PL, tornou-se conhecido na cidade depois de protagonizar a campanha pela censura da exposição “Faça você mesmo sua Capela Sistina”, do artista visual Pedro Moraleida (1977-1999) no Palácio das Artes, em 2017. O parlamentar associava as obras de arte à degeneração dos valores da família e da pátria. Naquela época, a campanha provocou um grande debate nacional sobre a censura nas universidades, nas artes e na cultura, que vinham sendo afetadas por cortes de verbas e ataques como aqueles protagonizados pelo vereador.

O caso das ferraduras artesanais de borracha

O primeiro desafio paralelo à luta contra a proibição da tração animal foi a tentativa de construir um acordo reconhecido pelo Estado em torno do uso das chamadas ferraduras artesanais de borracha. Como descreveu Nian Lopes (2013), na técnica de casqueamento e ferrageamento desenvolvida pelos carroceiros uma borracha recortada é acoplada nas patas dos animais a partir de cravos martelados de cima para baixo. Elas se distinguem das ferraduras metálicas por darem maior proteção aos animais de tração contra deslizamentos e quedas no asfalto e devem ser substituídas quinzenalmente.

A lei de normatização da circulação de carroças havia sido promulgada sem consulta ou participação de carroceiros ou veterinários, proibindo o uso das ferraduras de borracha. Isso estruturou um eixo próprio de luta da accbm, que buscou aliados diversos pela descriminalização de seu uso. Eles diziam que a norma desprezava a experiência de dezesseis anos dos projetos Carroça Legal e Carroceiros, da prefeitura e da Universidade Federal de Minas Gerais (ufmg), que executavam ações integradas para a promoção do bem-estar e o atendimento médico veterinário de equinos, além da formação continuada aos carroceiros e o licenciamento veicular obrigatório das carroças (Almeida, 2003; Lopes, 2013; Oliveira, 2017). A articulação da accbm com diversos atores resultou em dois pareceres técnicos emitidos em 2018 pelas faculdades de medicina veterinária da ufmg e do Centro Universitário Newton Paiva, que afirmaram, respectivamente: “Devido ao relevo peculiar da cidade de Belo Horizonte, existe um risco significativo de deslizamento dos cascos do equino no asfalto.…É fundamental lembrar que não existem dados na literatura que sugerem que este material, desde que bem aplicado, possa resultar em lesões para esses animais. Também em nossa rotina de atendimento de animais de tração ao longo dos anos, não foi possível traçar uma relação direta do uso de ferraduras de borracha com lesões do aparelho locomotor. Assim entendemos que a ferradura de borracha, desde que esteja em bom estado de conservação, equilibrada e fixada de maneira correta, não oferece danos ao casco e pode inclusive auxiliar na segurança durante o trabalho desses animais e dos trabalhadores envueltos” (parecer técnico, Faculdade de Medicina Veterinária da ufmg). “Tendo em vista a topografia acidentada do município de Belo Horizonte e a vasta área asfaltada, a utilização da “ferradura” de borracha pode apresentar diversas vantagens quando comparada à ferradura tradicional, destacando-se a maior aderência ao piso” (parecer técnico, Faculdade de Medicina Veterinária do Centro Universitário Newton Paiva).

Depois de meses de negociações envolvendo os carroceiros agrupados pela accbm, um biólogo da Universidade Estadual de Minas Gerais (uemg) que os assessorava junto comigo, o gerente de defesa animal da secretaria de meio ambiente, professores de medicina veterinária da ufmg e da Newton e um vereador do PCdoB, que se tornou o porta-voz dessa coalizão ad hoc na Câmara, foi aprovado por unanimidade o pl de alteração do trecho específico da Lei 10.119/2011 (Brasil, Belo Horizonte, 2011), descriminalizando o uso das ferraduras de borracha. Contudo, quando todos imaginavam que a reorganização da classe e da cultura dos carroceiros prosperava de maneira contínua e afastava, assim, o risco de proibição da tração animal, uma vertigem provocada por diversos acontecimentos reconduziu todos ao mesmo lugar de incerteza que caracterizou o início da mobilização. Durante o ano de 2019, o então presidente da accbm, Zé da Horta, decidiu migrar com a família para os Estados Unidos, renunciando ao cargo na organização.

Naquele período, a associação havia definido como dois pilares a defesa dos direitos humanos e a defesa dos direitos dos animais que trabalham em carroças. Dada a heterogeneidade dos carroceiros agrupados pela accbm, era preciso definir parâmetros que norteassem a reorganização enquanto classe. Aproveitando a proximidade com médicos veterinários das universidades e a assessoria jurídica fornecida pela cpt e a Cáritas, foram definidas ao longo de muitas reuniões essas duas pautas genéricas que, a partir daquele momento, deveriam orientar os argumentos dos porta-vozes na luta contra a proibição da tração animal. A defesa dos direitos humanos dos carroceiros associava o direito ao trabalho e o direito à diferença, pois a relação com os cavalos transforma as interações com os demais humanos e com o ambiente dito natural da cidade. Os cavalos deveriam ser protegidos moral e juridicamente com base nas cinco liberdades básicas que são parâmetros internacionais de bem-estar físico e mental dos animais. Isso seria feito a partir da retomada das ações que tinham como objetivos o atendimento médico veterinário gratuito e formações relativas à alimentação, comportamento e bem-estar equino. Em resumo, essas liberdades expressam que cada animal deve viver livre de medo e estresse, de fome e sede, de desconforto, de dor e doenças, e livres para expressar o comportamento definido etologicamente como próprio da espécie.

Como nos informam Ana Paula Perrota (2016) e Graciela Froehlich (2016), o debate em torno dos direitos dos animais se polarizou entre os libertacionistas/abolicionistas e os bem-estaristas. Os libertacionistas/abolicionistas lutam contra todos os tipos de uso humano de indivíduos animais, seja para alimentação, transporte, experimentos científicos ou entretenimento. Já os bem-estaristas afirmam que é possível promover medidas que reduzem ou evitam o sofrimento, criando melhores condições de vida, trabalho e morte. Os termos abolicionista e ativistas da libertação animal são autoatribuídos sobretudo pelos membros do Instituto Abolicionista Animal e do Movimento Mineiro pelos Direitos Animais, que protagonizaram as ações no município. Por outro lado, o termo bem-estaristas não é autoatribuído, costuma ser utilizado para se referir a indivíduos ou organizações que promovem ações de redução do sofrimento animal. Ações de promoção do bem-estar animal foram executadas a partir do convênio mencionado acima, que vigorou entre a ufmg e a prefeitura de Belo Horizonte ao longo de dezesseis anos e que os carroceiros almejavam reconstituir. Na perspectiva libertacionista, qualquer cuidado gratuito aos cavalos ou formações aos carroceiros são entendidos como incentivos à crueldade, devendo por isso ser extintos.

Em meio a grandes mudanças na composição da accbm, que passou a ser presidida por dois carroceiros que são pastores evangélicos, Sr. Sebastião e Tiago, reforçando a sensação de vertigem que nos reconduzia ao mesmo lugar depois de uma intensa sensação de movimento, o prefeito Alexandre Kalil (phs-Partido da Social Democracia Brasileira psd) resolveu vetar o pl aprovado na esfera legislativa com base nos mesmos pareceres técnicos dos veterinários que recomendavam sua utilização. Alegou na mensagem de veto suspeitas quanto à capacidade dos carroceiros para utilizar as ferraduras de modo adequado. Carroceiros, pesquisadores e professores foram desconsiderados novamente.

Humanidade, modernidade e animalidade

Nos debates em torno da tração animal são comuns frases como “a sociedade decidiu que não há mais lugar para os carroceiros”, “a cidade decidiu pela extinção das carroças”, ou ainda “dada a modernização, o desaparecimento dos animais de tração é um processo natural, uma questão de tempo”. Isso também foi observado em Natal (Rio Grande do Norte), onde a proibição da tração animal ocorreu através de uma aliança entre agentes que se atribuíam o dever de representar “a sociedade”, excluindo dela os carroceiros e seus cavalos (Carvalho e Do Valle, 2017). Nessas frases parece haver um entendimento de que a sociedade, a cidade e a modernidade são ideais fixos e homogêneos, que podem ser acionados para explicar processos cheios de contradições, disputas, embates e coalizões (Latour, 2017).

Observando a profusão de campanhas contra as carroças no Facebook, prestei atenção em quais discursos morais, técnicos, políticos e religiosos estavam sendo mobilizados para pressionar o Estado a extinguir a associação humano-equino-carroça. Agrupando todos, é notável que o personagem central das narrativas é o carroceiro, ora aparecendo em molduras progressistas rumo ao empreendedorismo, ora figurando como personagem incorrigível e ingovernável que precisa ser privado do direito de associar-se aos cavalos para trabalhar.

Embora tenham se articulado para manter conexões com diferentes atores, na esfera política do Estado acabaram sendo fixados como objeto de descarroceirização da cidade. Com exceção dos próprios carroceiros, ninguém parecia levar a sério a posição de rechaço à substituição da tração animal e de desejo de continuarem trabalhando com cavalos. De certa maneira, os carroceiros e seus cavalos ficaram ofuscados sob um ponto cego das concepções de humanidade, natureza e progresso da esquerda e da direita no Estado. Inseridos em discursos sobre modernidade e evolução, foram manejados sempre como um resíduo que sobrou, mas que ressurge de modo recalcitrante das fissuras da grande divisão entre a natureza e a sociedade. É como se tivéssemos duas séries indevidamente misturadas. Humanos suspensos no mundo, dentro da cultura, mas fora da natureza e equinos indevidamente trazidos para a cultura, que devem ser devolvidos para fora, “a natureza”. Primeiro um fosso abissal, depois uma reconexão entre as mônadas precocemente fechadas em si mesmas.

Como Peter Sloterdijk (2016) ressalta acerca dos programas de desenvolvimento, que refletem o projeto geral da modernidade de desenvolver a “massa” como sujeito, há uma ofensa incontornável aos destinatários, derivada do pressuposto de que eles ainda não são o que devem ser. No conceito de massa há uma retenção e uma recusa do reconhecimento, isto é, há desprezo e desatenção às diferenças nas relações com esse pseudo-sujeito denominado massa. Para a esquerda, os carroceiros estão situados naquela categoria perigosa e pouco definida de lumpemproletariado, que não revela contradição entre capital e força de trabalho por não terem patrões. Para a direita, por sua vez, eles são um resquício de relações pré-industriais que devem ser extintas, pois revelariam o atraso moral de segmentos da população que supostamente ainda não embarcaram na modernidade.

Conforme Giorgio Agamben (2013), com efeito, a modernidade ocidental desenvolveu uma máquina antropológica que trabalha de forma a separar no humano o que nele haveria de animal, criando um ser intrinsecamente dividido. O funcionamento dessa máquina, contudo, é simétrico ao funcionamento da máquina dos antigos: escravo, bárbaro e estrangeiro como figuras de um animal em forma humana. A máquina antropológica do humanismo seria, então, um dispositivo irônico que “verifica a ausência para o Homo de uma natureza própria, mantendo-o suspenso entre uma natureza celeste e uma terrena, entre o animal e o humano - e seu ser, portanto, será sempre menos e mais que ele próprio” (Agamben, 2013, p. 53). O excepcionalismo humano pode ser considerado um dos efeitos do trabalho desta máquina, que o coloca muito acima dos outros animais e os homogeneíza quando comparados aos seres humanos.

Tramitação e desdobramentos

Durante os quatro anos de tramitação do pl 142 houve apenas uma audiência pública.4 Carroceiros e libertacionistas lotaram o salão de entrada da Câmara numa reunião tensa e repleta de ofensas recíprocas entre parlamentares e entre as pessoas da plateia. O parlamentar do PCdoB que liderava o grupo de vereadores que se opunha ao pl dizia que toda a história de libertação animal era uma cortina de fumaça pós-moderna criada para ocultar negociações em torno da privatização do serviço de limpeza urbana. Os carroceiros insistiam que sabem que os animais são seres inteligentes e sensíveis, mas que o trabalho animal não é intrinsecamente cruel, deve ser fiscalizado e ter condições melhoradas por meio de políticas públicas que atendam carroceiros e cavalos. Os vereadores de esquerda afirmavam que o trabalho deveria ser protegido em consideração ao contexto de crise econômica e aumento do desemprego. A proibição seria aceitável caso viesse acompanhada de reorientação profissional.

Os ativistas da libertação animal diziam que a experiência com cavalos na cidade revela a barbárie, pois eles recolhem animais abandonados, doentes e mortos. A evolução humana deveria ocorrer pela educação e pela mecanização, implicando uma ruptura (Hearne, 1991) da associação de trabalho entre humanos (carroceiros) e equinos (de tração). Para isso, defendiam a extensão dos valores de liberdade e igualdade aos indivíduos animais (Perrota, 2016). A todo momento era fixada uma hierarquia entre os humanos a partir de concepções etnocêntricas sobre os carroceiros, que teriam um déficit moral derivado de sua posição na sociedade (Carman, 2017).

Entre os carroceiros que participaram da audiência, ao contrário, embora a espécie tivesse relevância para o tipo de associação que o corpo permite, a ênfase era dada muito mais em cada animal, que tem nome, “endereço”, temperamento, personalidade e história, isto é, tem uma biografia individual no coletivo de que faz parte. É uma espécie companheira que demanda comprometimento, cuidado e responsabilidade (Haraway, 2003; 2011), uma vez que acompanham a gestação das éguas, o crescimento dos potros, promovem a convivência entre os animais de diferentes idades e os ensinam a trabalhar. Eles negavam que abandono e sofrimento fossem constitutivos da relação entre carroceiros e cavalos, lembrando que muitas pessoas e empresas são proprietárias de animais e que, portanto, aqueles animais recolhidos não tinham necessariamente relação com carroceiros. Narravam a importância do cuidado, que implica o acompanhamento da vida de cada animal ao longo de muitos anos, desde o nascimento até a morte.

Diante da posição irredutível dos carroceiros, que em nenhum momento aceitaram a substituição da tração animal, seguiu-se uma sequência de ofensas aos indivíduos e à classe como um todo. O autor do projeto dizia que os carroceiros são como cavalos de viseiras, que não querem enxergar as vantagens do empreendedorismo e da mecanização. Uma advogada libertacionista dizia que o argumento cultural era falacioso, que caso aquilo pudesse ser considerado uma expressão cultural deveria estar exposto em um museu acerca da vida nos séculos dezoito e dezenove, e não circulando nas ruas da cidade, pois no século xxi a carroça não seria mais que um objeto retrógrado cuja consequência inerente é a crueldade com os animais.

Três anos depois, o pl de proibição da tração animal foi aprovado por vinte e oito votos e apenas nove contrários, no apagar das luzes da última semana dos mandatos da legislatura 2017-2020,5 durante a pandemia de covid-19 e após a eleição dos novos vereadores da legislatura 2021-2024, que ainda não haviam tomado posse e por isso não votaram. Os nove votos contrários abarcaram as bancadas de PCdoB, psb, psol e o Partido dos Trabalhadores (pt) e parlamentares de Cidadania e Democratas (dem) que divergiram da posição majoritária de seus respectivos partidos.

Na votação semipresencial transmitida online, de modo similar ao que ocorreu na audiência pública, ofensas recíprocas entre os parlamentares substituíam o debate a respeito da tração animal. O vereador do PCdoB tecia acusações de corrupção contra os vereadores que defendiam a proibição. A denúncia mirava uma suposta negociação de cerca de quinhentos cargos da mesa diretora da Câmara em troca da aprovação de projetos polêmicos, como o da tração animal, que representava o “lobby das caçambas”6 na cidade. Em relação à tração animal, enfatizavam a necessidade de criar alternativas de trabalho. Arnaldo Godoy (pt), que é pessoa com deficiência visual, disse que a proibição era parcial pois há cachorros que sofrem mais estresse que cavalos em carroças, como os que trabalham para a polícia militar procurando cadáveres e drogas e os cães guias que acompanham pessoas cegas. Lembrou a inexistência de cadastro geral de carroceiros e cavalos e de diretrizes de transição. Apenas Bella Gonçalves (psol) mencionou que os carroceiros haviam se reconhecido como comunidade tradicional e eram protegidos por legislação específica. Dentre os apoiadores do pl, as falas se resumiram a ofensas aos vereadores de esquerda e elogios aos parlamentares que, em suas palavras, mostrariam naquela sessão a grandeza da nação brasileira e o progresso moral de sua gente. Em uma votação rápida, foi aprovada a lei que instituiu a proibição, em dez anos, da tração animal no município.

A associação de carroceiros empenhou-se nas semanas seguintes numa campanha pelo veto do prefeito. Duas carroceatas foram realizadas no centro da cidade e dezenas de notas de apoio foram publicadas por núcleos de pesquisa, povos ciganos, quilombolas, organizações de defesa de direitos humanos e de agroecologia. Uma intensa proliferação de atores ganhou força nas redes sociais, segmentando diversos grupos diante da posição acerca da tração animal. Coletivos ecossocialistas e anarquistas se posicionaram junto à cpt, o Centro de Documentação Eloy Ferreira da Silva (Cedefes) e a Defensoria Pública de Minas Gerais, que pediam o veto e a retomada da regulamentação. As duas únicas mulheres negras que foram eleitas vereadoras, Iza Lourença (psol) e Macaé Evaristo (pt), repudiaram a proibição, afirmando que a comparação da escravização de homens e mulheres negros com a tração animal ofende a luta contra a desumanização de pessoas não brancas, como é a maioria dos carroceiros, e que priorizar a criminalização significava racismo ambiental estrutural e supremacismo branco. Um padre de uma cidade do interior do Rio Grande do Sul, em uma mensagem compartilhada pelo autor do pl no Instagram, dizia, segurando uma imagem de São Francisco nas mãos, que “se olharmos bem, a tração animal é algo que não existe mais nos países desenvolvidos! Basta olharmos para a Europa. Lá isto é coisa da Idade Média e infelizmente parece que nós ainda estamos na Idade Média. Mas podemos avançar!”. De outro lugar da Igreja Católica, Frei Gilvander (cpt-mg) dizia em publicações no Facebook que “sob a capa do cuidado com os animais impera o racismo, o ódio aos pobres, o higienismo e a violação dos direitos dos povos e comunidades tradicionais que utilizam a carroça no seu dia a dia para trabalhar e viver”.7

Os quatro anos culminaram numa grande vertigem para carroceiros, ativistas da tração animal, pesquisadores e apoiadores desses dois coletivos. O retorno cíclico da controvérsia da tração animal não parece ter se encerrado, embora pacificado temporariamente com uma resolução vaga. Em uma década, duas tentativas de proibição aconteceram. Apesar de a proibição propriamente dita estar prevista para o ano de 2031, práticas governamentais já foram modificadas, a exemplo da supressão do cadastramento de carroceiros, cavalos e carroças e da rede de formação de carroceiros e de promoção da saúde animal. Os carroceiros repetiam que esse desmonte torna humanos e animais mais vulneráveis em decorrência da maior informalidade, e não avança na melhoria da qualidade de vida e trabalho de ambos.

O processo de criminalização acabou por acelerar o empenho da accbm em obter a certidão de autorreconhecimento como comunidade tradicional pela Comissão Estadual, abrindo um novo campo de lutas junto a povos tradicionais. Apesar dos esforços de resistência, a lei de proibição foi publicada e uma comissão de transição foi instituída pela prefeitura com o objetivo de iniciar estudos voltados à implementação da lei. Prevaleceu nesta lei de proibição da tração animal em dez anos a ideia de que os carroceiros precisam se extinguir, seja por consequência da evolução moral da sociedade, seja por força do desenvolvimento material da classe trabalhadora. De todo modo, a proposição do fim da tração animal como política social evolucionista evidenciou concepções divergentes sobre animalidade, humanidade e progresso.

Referências bibliográficas

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1 pl e tramitação disponíveis em https://www.cmbh.mg.gov.br/atividade-legislativa/pesquisar-proposicoes/projeto-de-lei/832/2013..

2 pl 142/2017, que propôs a criação do Programa de Redução Gradativa do Número de Veículos de Tração Animal e Humana no Município de Belo Horizonte. Disponível em https://www.cmbh.mg.gov.br/atividade-legislativa/pesquisar-proposicoes/projeto-de-lei/142/2017

3 O protocolo de registro da Frente Parlamentar foi recusado devido ao regimento interno. Apesar disso, ela funcionou de maneira informal e o documento que a “criou” informa a composição de vinte e um vereadores, com meta de vinte e nove.

4 A audiência pública aconteceu no dia primeiro de agosto de 2017 a pedido da comissão de administração pública. As comissões de Direitos Humanos e de Meio Ambiente da Câmara Municipal não promoveram discussões nem se manifestaram sobre a questão. Debates informais foram organizados por parlamentares do PCdoB e do Partido Socialismo e Liberdade (psol) nos respectivos gabinetes. Contudo, eles não discutiam a dimensão animal nem a dimensão jurídica da relação humano-animal, tendo por consequência uma essencialização de uma cultura dos pobres em geral que os indiferenciava em imagens de precariedade. Depois de inúmeras votações suspensas, Gilson Reis (PCdoB) afirmou ao microfone em uma sessão de 2019 que eles haviam construído um acordo para votarem a matéria apenas depois das eleições municipais, pois isso “seria bom para todo mundo”.

5 O pl foi votado em segundo turno no dia quinze de dezembro de 2020, aprovado basicamente pela direita: Avante, dem, Movimento Democrático Brasileiro (mdb), Novo, Patriotas, Podemos, Partido Republicano da Ordem Social (pros), psc, Partido Social Democrático (psd), Partido da Social Democracia Brasileira (psdb), Partido Social Liberal (psl), Partido Trabalhista Brasileiro (ptb), Partido Trabalhista Cristão (ptc) e Republicanos.

6 O pl 886/2019, de privatização de serviços de limpeza urbana - incluindo a administração das trinta e três unidades de recebimento de pequenos volumes (majoritariamente transportados por carroceiros) - foi aprovado dias depois e obteve trinta e três votos favoráveis e seis contrários. Disponível em https://www.cmbh.mg.gov.br/atividade-legislativa/pesquisar-proposicoes/projeto-de-lei/886/2019.

7 A nota também foi publicada em seu blog, disponível em http://gilvander.org.br/site/dia-triste-em-belo-horizonte-pela-aprovacao-da-lei-que-proibe-o-trabalho-de-10-000-carroceiros-as-as-bandeiras-da-justica-da-verdade-e-da-vida-digna-flamulam-a-meia-altura-nota-publica/

Nota: El texto corresponde 100% a Ricardo Pereira de Oliveira

Nota: El equipo ejecutivo editorial Andrea Quadrelli, Juan Scuro, Pilar Uriarte aprobó éste artículo

Recebido: 31 de Março de 2021; Aceito: 16 de Junho de 2021

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