O autor nos apresenta a primeira obra da coleção intitulada Crise e Competência Fiscal, a qual tem uma tripla finalidade, sendo a primeira dar a conhecer aos leitores os instrumentos tributários mais importantes, segundo, os problemas que os Estados enfrentam e terceiro, a funcionalidade de alguns institutos da tributação internacional, em um contexto de Estado, multinacionais e plutocratas. O livro é composto de seis capítulos, e o primeiro aborda um tópico sugestivo e que desperta atenção, e assim nos conduz a uma noção antropológica da expressão, baseado na mitologia, enlaçando-se com a tradição cristã e religião, fazendo uma distinção entre paraíso fiscal e tax haven, e se de fato a expressão paraíso fiscal é fruto de um erro de tradução, logo nos leva a conhecer a origem dessa figura de linguagem recorrente aos investidores e alfinetada pelos Estados contrários e órgãos internacionais.
No segundo capítulo, faz uma referência quanto a subjetividade do conceito como instituto jurídico, no qual tende a configurá-lo como um instituto próprio do direito internacional, cujos efeitos são acunhados no âmbito do direito tributário interno dos Estados. Logo nos remete ao conceito institucional e conceito jurídico indeterminado, veja, o autor propõe uma análise do conceito desde a perspectiva da doutrina, dos Estados e das organizações internacionais, isto devido a falta de consenso entre estes no nível internacional, até mesmo em relação ao próprio Estado e cita o exemplo estadunidense, critica a posição indefinida dos Estados, que levam o assunto a uma questão política e geoestratégica, no entanto, adverte que a proliferação de regulamentos executivos sem intervenção legislativas e com disparidades de critérios, favorecem a sobrevivência dos paraísos fiscais, pondo em relevo a importância desse instituto, na planificação fiscal internacional e no mundo financeiro.
Os “elementos do conceito paraíso fiscal”, desde uma perspectiva da Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), é a temática abordada no terceiro capítulo da obra, introduz fazendo uma menção sobre a ausência de consenso dos critérios entre as organizações internacionais, devido ao sistema de unanimidade e que cada Estado aciona o direito de veto para blindar seus interesses, expõe com clareza que o propósito da OCDE é amenizar os efeitos perniciosos desses regimes, e não a eliminação. Comenta sobre a eficácia e a vinculação do soft law como fonte de direito internacional e faz uma análise de sua possível aplicação direta, considerando a natureza claudicante diante da normativa doméstica e, como os Estados vem incorporando em suas normativas os critérios do soft law.
Relata as origens do estudo e a regulação da OCDE sobre os paraísos fiscais e como nasce o primeiro relatório sobre estes territórios paradisíacos, suas práticas fiscais perniciosas e a ofensiva do plano base erosión and profit shifting (BEPS), o qual revelou a verdadeira preocupação da OCDE nesse contexto. Nesta obra o autor nos leva a compreender os porquês da OCDE, em não utilizar o termo paraíso fiscal, adotando a de jurisdições não cooperadores e regimes perniciosos, também os critérios seguidos para a confecção de listas, compostos em base o quanto lesivo é o regime adotado pela jurisdição e os quatro elementos que definem um território como tal, de acordo com a OCDE. Faz um recorrido sobre o regime fiscal pernicioso ou ring fencing tendo em conta os fatores chaves para identificá-los. Assevera o autor, não estar diante do fim e sim de uma adaptação ao novo contexto.
Quanto “a resposta dos Estados não paradisíacos”, um tema que a doutrina é profusa até mesmo pela influência econômica destes Estados, pois o quarto capítulo na introdução o autor faz uma referência, do ponto de vista das Nações Unidas como uma perda dos recursos tributários, e a erosão da base imposta das multinacionais, assim como a distorção das atividades econômicas, também nesta ordem expõe que a OCDE tem o mesmo parecer com algumas adições.
Os Estados adotam medidas unilaterais, dentre elas, está a repressão ética e moral, o autor nos revela que esta tem sido manifestada por diversos veículos de comunicação, cita o Papa Francisco, que faz uma afirmação contundente sobre os efeitos desta prática elusiva. Coloca ênfase no objetivo da obra que é “analisar a denominada estrutura do pecado” (p. 124), no afã de dar respostas; do que é, como funciona e a utilidade dos paraísos fiscais.
Manifesta que, para subtrair esta prática os Estados adotam diversas medidas fiscais, implantado cláusulas ante- paraíso em sua maioria, como meio de pressão contra os que se aventuram nesta opção, dentre elas esta as CFC e as CBC. Também inclui como uma medida ante- paraíso, as anistias fiscais, sobre esta figura expõe as suas vertentes em relação ao âmbito penal e criminal, sem deixar de lado a violação do princípio de reserva de lei, no caso espanhol e também ao de capacidade e equidade.
Refere-se sobre as medidas extrafiscais, as que são adotadas pelos Estados em relação aos assessores, os que facilitam a realização dessas estruturas com propósitos de burlar a lei, expõe a recomendação da OCDE em adotar sanções criminais para penalizar esses profissionais liberais e como alguns Estados já tem colocado em prática tais medidas, que de acordo com a visão do autor não contribui ao desaparecimento desses territórios e como efeito contrário, fomentará um novo cenário de paraíso fiscal.
Faz uma abordagem das “medidas bi e multilaterais”, adotadas pelos Estados não paradisíacos, expõe as suas limitações, nesta ordem, menciona os convênios multilaterais de intercâmbio de informação e sua classificação, assim como o alcance e suas implicâncias para o Estado, que tem a obrigação de conceder estas informações. Para limitar as atuações abusivas das administrações tributárias em relação a informação dos contribuintes, “propõe a necessidade estabelecer a figura do defensor do contribuinte” (p. 149). Sobre os acordos econômicos e programas de colaboração voluntária, argumenta como “gaveta de alfaiate” (p. 152), por sua abertura a incorporar-se diversos mecanismos que tenha cláusulas desse sentido.
No quinto capítulo o autor nos traz respostas dos Estados catalogados como paraísos fiscais, nos introduz à temática grifando, a necessidade dessas jurisdições alcançarem o equilíbrio entre as exigências e a conservação do regime fiscal, observa o autor que a postura dessas jurisdições é negar a condição de paraíso fiscal, e não justifica a legalidade dos seus regimes. E assim argumenta que neste capítulo, o objetivo é inverter a ordem desde a ótica do Estado catalogado como tal.
Expõe a sua opinião sobre a salvaguarda da soberania que vem sendo atacada constantemente pelos Estados com taxas altas, impondo modificações no sistema tributário destas jurisdições, isto transgrede as resoluções das Nações Unidas e quebra a soberania desses Estados, que são soberanos, chegam a supor a possibilidade de uma denúncia internacional, destas lesões à soberania desses Estados menores, porém confirma que até a presente data não há nenhuma sequer nesse sentido.
Garante que, “estabelecer regimes preferenciais e perfeitamente legal e constitucional em função da legislação interna, com base ao princípio de territorialidade do Direito Internacional” (p. 160), e nos deixa uma manifestação de Hans Adam II, Príncipe de Liechtenstein a respeito, porém na sequência nos revela que estes Territórios para sair da má fama e não se submeter às represálias dos Estados desenvolvidos, se submetem a formação de convênios bilateral como FATCA com Estados Unidos, acordos bilaterais e multilaterais de transferência de informação seguindo as recomendações da OCDE.
Faz revelações sobre “paraísos fortes e fracos”, e de como o primeiro está em condições de sobreviver aos ataques dos Estados e das organizações multilaterais, blindando-se dos critérios estabelecidos e utilizando figuras jurídicas apropriadas, assim como estabelecendo uma rede de convênios de natureza tributária.
E como era de se esperar, faz uma análise sobre a funcionalidades dos paraísos fiscais, estruturando em três níveis; Estado, empresa e particulares. Quanto ao primeiro revela que de acordo a estudos realizados, alguns estados se utilizam de diversas formas destas estruturas, bem como meio de financiar seus gastos ou como mecanismo de internacionalização de suas empresas. Para as empresas e particulares, a funcionalidade está dada pelo volume de riquezas que acumulam, os veículos de planificação adotados e o quanto estão dispostas a correr os riscos, ante uma eventual penalização, “o que poderá conduzi-lo do paraíso à um inferno fiscal”.
Esta obra é o resultado de uma ampla investigação, como bem expõe desde a gênesis do conceito à sua evolução ao contexto atual, fundamentado em uma série de obras da doutrina e posicionamento de organismos internacionais. As quais o autor aprimora com precisão o objetivo proposto.
De acordo com o aqui foi exposto, e como bem no início já relatamos ser a primeira obra da coleção, o que nos deixa claro que o professor Julio César Muñiz Pérez, dá uma prévia de uma nova linha de pesquisa, que se abre em relação aos anunciados paraísos fiscais, que vários doutrinários profetizarão o seu fim, que ele manifestamente se posiciona de forma contrária e nós compartilhamos do seu parecer. Convidamos para uma leitura reflexiva desta obra, por ser de qualidade e que será de grande valia para os estudiosos da matéria, em nível nacional e internacional, pois, suas concepções transcendem as fronteiras.