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Lingüística

versión On-line ISSN 2079-312X

Lingüística vol.37 no.2 Montevideo  2021  Epub 01-Dic-2021

https://doi.org/10.5935/2079-312x.20210025 

Articles

ADVÉRBIOS EM -MENTE E ADJETIVOS ADVERBIAIS OFERECEM CONTRIBUIÇÕES DISTINTAS PARA A ESTRUTURA INFORMACIONAL DA SENTENÇA

ADVERBIOS EM -MENTE Y ADJETIVOS ADVERBIALES OFRECEN CONTRIBUCIONES DISTINTAS PARA LA ESTRUCTURA INFORMACIONAL DE LA ORACIÓN

ADVERBS WITH SUFFIX -MENTE AND ADVERBIAL ADJECTIVES OFFER DIFFERENT CONTRIBUTIONS TO THE INFORMATION STRUCTURE OF THE SENTENCE

1Universidade Federal de Rio de Janeiro. victorvirginio9@gmail.com

2Universidade Federal de Rio de Janeiro. diogopinheiro@letras.ufrj.br

3Universidade Federal Fluminense. edu.kenedy@gmail.com


Resumo

Assim como a maioria das línguas românicas, o português conta com pelo menos dois tipos de modificadores verbais: os advérbios em -mente (“vencer facilmente”) e os adjetivos adverbiais (“vencer fácil”). Intrigados pela sua aparente intercambiabilidade, diversos pesquisadores buscaram evidenciar a existência de diferenças sintáticas, semânticas e estilísticas entre eles. Neste estudo, procuramos contribuir com essa literatura ao sugerir que advérbios canônicos em -mente (ACs) e adjetivos adverbiais (AAs) também são distintos do ponto de vista informacional. Especificamente, sustentamos que os segundos, mas não os primeiros, rejeitam a presença de elementos adicionais no domínio pragmático do foco. A fim de verificar essa hipótese, conduzimos um experimento de julgamento de aceitabilidade.

Os resultados mostraram que sentenças com Aas são consideradas significativamente mais aceitáveis quando o advérbio é o único elemento no domínio do foco (p=0,007), ao passo que a mesma diferença não se verifica em sentenças com ACs (p=0,21).

Palavras-chave: Adjetivos adverbiais; Advérbios em -mente; Estrutura informacional

Resumen

Como la mayoría de las lenguas romances, el portugués tiene al menos dos tipos de modificadores verbales: los adverbios en -mente ("vencer fácilmente") y los adjetivos adverbiales ("vencer fácil"). Intrigados por su aparente intercambiabilidad, varios investigadores buscaron resaltar la existencia de diferencias sintácticas, semánticas y estilísticas entre ellos. En este estudio, buscamos contribuir a esta literatura sugiriendo que los adverbios canónicos en -mente (ACs) y los adjetivos adverbiales (AAs) también son distintos desde un punto de vista informativo. Específicamente, sostenemos que los últimos, pero no los primeros, rechazan la presencia de elementos adicionales en el dominio pragmático del enfoque. Para verificar esta hipótesis, realizamos un experimento de juicio de aceptabilidad.

Los resultados mostraron que las oraciones con AAs se consideran significativamente más aceptables cuando el adverbio es el único elemento en el dominio de enfoque (p = 0.007), mientras que la misma diferencia no se verifica en oraciones con ACs (p = 0.21).

Palabras clave: adjetivos adverbiales; adverbios en -mente; estructura informativa

Abstract

It has been argued that Brazilian Portuguese -mente (‘-ly’) adverbs (e.g. “vencer facilmente ‘win easily’) and so-called adverbial adjectives (e.g. “vencer fácil” ‘win easy’) display semantic, syntactic and stylistic differences. In this paper, we suggest that these two types of verbal modifiers can be further distinguished on the basis of their information structure properties, in that adverbial adjectives (AAs), but not canonical -ly adverbs (CAs), reject the presence of additional elements in the focus domain. In order to test this hypothesis, an acceptability judgement test was carried out.

The results show that speakers rate sentences with AAs significantly higher when no additional element shares the focus domain (p=0,007), whereas the same difference does not hold for sentences with CAs (p=0,21).

Keywords: Adverbial adjectives; Canonical -mente (‘-ly’) adverbs; Information structure

1. Introdução

Assim como a maioria das línguas românicas, o português conta com pelo menos dois tipos básicos de advérbios de modo: os advérbios canônicos em -mente (ACs) e os adjetivos adverbiais (AAs)1. Os dois tipos são contrastados nos exemplos abaixo.

  • 1. a. Carlos trabalhou duramente.

  • b. Carlos trabalhou duro.

  • 2. a. A porta abre automaticamente.

  • b. A porta abre automático.

A existência de duas estratégias aparentemente equivalentes de modificação verbal tem intrigado tanto linguistas alinhados à tradição funcionalista quanto pesquisadores simpáticos às abordagens formais. Entre os primeiros, Martin Hummel vem construindo, há quase duas décadas, uma obra importante, cuja principal tese é a de que, nas línguas românicas, AAs e advérbios em -mente pertencem a tradições discursivas distintas: enquanto os primeiros seriam próprios da tradição oral, os segundos estariam associados à língua escrita (Hummel 2002, 2003, 2008 y 2014). Embora essa posição provavelmente deva ser relativizada (Barbosa 2006), é quase certo que se trata de uma generalização relevante e reveladora.

Entre os segundos, o debate tem girado, não surpreendentemente, em torno da posição sintática e da consequente interpretação semântica associada a cada tipo de modificador.

Trata-se, em essência, de responder a duas perguntas: (i) que diferenças formais e semânticas é possível observar entre AAs e ACs? e (ii) o que essas diferenças revelam em relação à posição de cada tipo de modificador na estrutura sintática?

Embora Lobato (2008) e Foltran (2010) proponham respostas sensivelmente distintas, ambas concordam em um ponto crucial: “o escopo da predicação do atributo sem -mente é diferente do escopo da predicação do atributo com -mente” (Lobato 2008: 232). Em outras palavras, as duas autoras sustentam que AAs e ACs são sintática e semanticamente dessemelhantes.

Se é inegável que ambas as linhas de investigação vêm produzindo resultados sólidos, também é verdade que todos esses trabalhos deixam de lado um aspecto importante da gramática dos modificadores verbais: seu comportamento pragmático-discursivo.

É por essa razão que, neste artigo, procuraremos acrescentar um dado novo ao debate: sugeriremos que os modificadores verbais do português brasileiro (PB) exibem restrições pragmáticas inerentes, na medida em que oferecem contribuições distintas à estrutura informacional da sentença2. Mais especificamente, a hipótese a ser investigada aqui é a seguinte: enquanto AAs devem participar de uma configuração de foco simples, na qual apenas uma informação nova é veiculada, ACs podem integrar uma configuração informacional mais complexa, na qual se veiculam simultaneamente duas informações novas3.

A fim de verificar essa hipótese, realizou-se um experimento offline de julgamento de aceitabilidade, no qual falantes nativos do PB avaliaram sentenças contendo AAs e ACs em duas condições: com foco exclusivo (apenas uma informação nova) e com foco não-exclusivo (duas informações novas). Como se verá, os resultados mostram que AAs, mas não ACs, são julgados mais aceitáveis quando em configuração de foco exclusivo - o que parece corroborar a hipótese defendida aqui.

Neste trabalho, nossa proposta será desenvolvida e sistematizada no interior do quadro teórico da Gramática de Construções Baseada no Uso (GCBU; Perek 2015, Goldberg 2006). Por essa razão, buscaremos mostrar como os fatos gramaticais descritos aqui podem ser interpretados sob a ótica de um modelo que concebe o conhecimento linguístico como um inventário estruturado de unidades simbólicas. No entanto, acreditamos que, caso venham a ser confirmadas, nossas descobertas empíricas deverão ser incorporadas e acomodadas por qualquer modelo teórico.

O artigo está organizado como segue. Na próxima seção, apresentamos brevemente o quadro teórico da GCBU. Em seguida, descrevemos o tratamento da estrutura informacional por Lambrecht (1994). Na sequência, a seção 4 desenvolve a hipótese central do artigo, a seção 5 descreve o experimento realizado e as seções 6 e 7 dedicam-se, respectivamente, à apresentação e à discussão dos resultados obtidos. Por fim, a seção 8 sintetiza as principais descobertas.

2. Abordagens construcionistas da gramática: da GC à GCBU

A Gramática de Construções (GC) é, fundamentalmente, um modelo não-derivacional de representação do conhecimento linguístico. Em termos práticos, isso significa que a GC rejeita a hipótese de que o conhecimento linguístico exibe um design bipartido, no qual um repositório de itens (o componente lexical) atua em conjunto com um sistema de operações derivacionais (o componente gramatical).

No lugar dessa concepção, aposta-se na possibilidade de representar o conhecimento linguístico de maneira uniforme, por meio do seu constructo teórico central: a noção de construção gramatical.

Tecnicamente, uma construção gramatical é qualquer unidade linguística resultante de um pareamento convencional entre informações de forma (fonológica, prosódica, morfossintática) e informações de significado (aí incluídas especificações semânticas, pragmáticas, discursivas ou funcionais). Graças a essa formulação propositalmente ampla, o conceito de construção gramatical pode dar conta da totalidade do conhecimento linguístico do falante - isto é, não apenas palavras e morfemas, mas também regularidades sintáticas, morfofonológicas e prosódicas. Sob essa ótica, saber uma língua equivale a conhecer uma vasta coleção de formas linguísticas, bem como o significado/função associado a cada uma delas - por exemplo, a forma /gatU/ serve para expressar o conceito gato; a forma SVO serve para representar um evento no qual um agente atua sobre um paciente; etc. Trata-se, em suma, de conceber o conhecimento linguístico como inventário de unidades simbólicas.

Não se deve, porém, compreender esse inventário como uma simples lista de entradas independentes. Na verdade, evidências experimentais têm demonstrado que as construções formam uma rede de unidades interconectadas (Perek 2015; Goldberg 2006). Um exemplo simplificado desse tipo de rede pode ser visto abaixo.

Figura 1: estruturação do constructicon (adaptado de Croft e Cruse 2004: 264) 

Como mostra o diagrama, uma propriedade importante das redes construcionais é sua organização hierárquica - por exemplo, as construções suj kick the bucket e suj kick the habit se situam em um nível hierárquico inferior ao de suj kick obj. Conforme se observa, o nível em que cada construção é representada reflete o seu grau de preenchimento lexical: assim, construções mais preenchidas (ou mais concretas) são representadas abaixo daquelas menos preenchidas (ou mais abstratas).

O mercado teórico da GC é, contudo, bastante heterogêneo: para além das premissas básicas apresentadas até aqui, há bastante espaço para divergências entre os diversos modelos autointitulados construcionistas. A maior cisão teórica se dá entre os modelos de orientação formalista, como a Sign-Based Construction Grammar (Michaelis 2013), e as abordagens alinhadas à tradição funcional-cognitiva, como a Radical Construction Grammar (Croft 2001) e a Cognitive Construction Grammar (Goldberg 1995, 2006).

Aqui, empregamos o termo GCBU como rótulo genérico para a linhagem funcional-cognitiva.

A GCBU pode ser caracterizada a partir de duas premissas fundamentais: a crença no impacto do uso sobre a organização do conhecimento subjacente e a ênfase nos processos cognitivos gerais (isto é, não especificamente linguísticos). A primeira delas é herdeira direta da tradição funcionalista norte-americana, que tem enfatizado, desde os anos 1970, o caráter emergente da gramática. A segunda premissa, por seu turno, é tributária em grande medida da tradição da Linguística Cognitiva, movimento fortemente heterogêneo cuja tese unificadora é a de que o conhecimento linguístico opera segundo os mesmos princípios que governam a “cognição geral”.

Em suma, a GCBU é uma teoria gramatical de caráter não-derivacional, na qual a totalidade do conhecimento linguístico - concebido como rede de construções gramaticais - é continuamente afetado pela experiência linguística e moldado por processos cognitivos gerais. Trata-se, portanto, de uma abordagem simultaneamente construcionista (porque não-derivacional) e funcional-cognitiva (pela importância conferida ao uso linguístico e aos processos cognitivos não-linguísticos).

3. Estrutura informacional

Voltado para a análise da relação entre forma gramatical e função comunicativa, o estudo da estrutura informacional consiste na investigação da maneira como as suposições do falante acerca das representações mentais do ouvinte, a cada momento da interação, são codificadas na sentença por meio de recursos gramaticais. Grosso modo, parte-se da premissa de que o falante sinaliza linguisticamente quais constituintes da proposição expressa pelo enunciado fazem parte de proposições pressupostas (isto é, tidas como conhecidas pelo ouvinte) e quais contribuem para tornar essa proposição informativa (isto é, acrescentam algum dado ao estado corrente de conhecimento do interlocutor).

Este trabalho adota, especificamente, a teoria de estrutura informacional desenvolvida por Lambrecht (1994), cujo ponto de partida é a noção proposição. O autor define proposição como um tipo de significado que emerge a partir da relação entre argumentos e predicados. Por isso, o termo “proposição” é usado por Lambrecht (1994) para fazer referência ao denotatum de quaisquer expressões linguísticas que expressem relações, em oposição a entidades ou eventos.

Com base na noção de proposição, é possível compreender os conceitos basilares de asserção e pressuposição. Fundamentalmente, trata-se de tipos pragmaticamente distintos de proposições: enquanto a asserção é “a proposição (...) que se espera que o ouvinte conheça (...) como resultado de ter ouvido a sentença enunciada”, a pressuposição corresponde às “proposições léxico-gramaticalmente evocadas por uma sentença as quais o falante assume que o ouvinte já conhece no momento em que a sentença é proferida” (Lambrecht 1994: 52). Como se observa, asserções são expressas por um enunciado, ao passo que pressuposições são evocadas.

Os exemplos abaixo, traduzidos de Lambrecht (1994: 223-235), ajudam a esclarecer essa ideia.

  • 3. a. Quer dizer então que a sua moto quebrou?

  • b. O que aconteceu com o seu carro?

  • c. O que aconteceu?

  • 4. Meu carro quebrou.

Independentemente de a sentença (4) ser proferida como resposta a (3a), (3b) ou (3c), seu conteúdo proposicional é constante: trata-se de uma relação específica entre o predicado quebrar e o argumento meu carro. O que se altera de uma situação comunicativa para a seguinte, portanto, é apenas sua estruturação pragmática - grosso modo, o que conta como “informação dada” e como “informação nova” em cada caso.

Comecemos pelo par (3a) / (4), esta última reescrita abaixo como (4a). Nesse cenário, o enunciador de (4a) assume que o ouvinte sabe que algo quebrou - e, com base nisso, esclarece a identidade desse “algo” (isto é, meu carro). Os conceitos de pressuposição e asserção permitem sistematizar essa análise da seguinte maneira:

Figura 2: Estruturação pragmática da sentença “Meu carro quebrou” (possibilidade 1) 

Como mostra a figura, a sentença (4a) se baseia na proposição pressuposta x do falante quebrou. Com isso, queremos dizer que, ao proferir (4a), o falante calcula que a proposição x do falante quebrou já é conhecida pelo interlocutor. Tomando como base essa proposição, ele irá então acrescentar, por meio de (4a), uma nova proposição ao estado corrente de conhecimento do ouvinte - qual seja, “X = carro”. Esta é, portanto, a asserção veiculada pelo enunciado.

Ao mesmo tempo, decorre dessa a análise que a função comunicativa de (4a) é a de identificar o valor uma variável em uma proposição aberta. Aqui, a variável é representada pela letra “x”, que faz parte da proposição aberta “x do falante quebrou”. Diante disso, a informação nova veiculada pelo enunciado corresponde à identificação do valor de “x” como “carro”.

Neste ponto, cabe acrescentar uma propriedade importante das pressuposições pragmáticas: trata-se do fato de que elas são formalmente marcadas. Isso significa que um dado enunciado linguístico manifestará propriedades formais que permitirão a qualquer ouvinte identificar quais são as proposições pressupostas nas quais esse mesmo enunciado se baseia. Em (2a), por exemplo, a propriedade formal relevante é a ausência de proeminência prosódica sobre o predicado (Lambrecht 1994: 229).

A situação muda de figura, no entanto, se a sentença (4), reescrita abaixo como (4b), é usada como resposta a (3b):

Figura 3: Estruturação pragmática da sentença “Meu carro quebrou” (possibilidade 2) 

Informalmente, é possível pensar que a sentença (4), quando proferida em resposta a (3b), se baseia no pressuposto de que algo aconteceu com o carro. Em termos mais técnicos, diremos que (3b) estabelece um tópico discursivo (o referente de “o seu carro”) em relação ao qual se espera algum comentário. Nesse contexto, a função comunicativa de (4) é a de fornecer o comentário apropriado ao tópico previamente estabelecido. Neste caso, portanto, a asserção expressa pela sentença (4) corresponderá à informação de que o comentário apropriado para o referente carro do falante é o de que ele quebrou (ou, simplesmente, “x = quebrou”). Decorre daí que a função comunicativa de (4b) é a de fazer um comentário relativamente a um referente previamente estabelecido.

Note-se que aqui, assim como ocorre em (3a) / (4a), a marcação formal da pressuposição também é realizada via ausência de proeminência prosódica. Neste caso, como o termo não-acentuado corresponde ao sujeito sintático, entende-se que seu referente estava previamente estabelecido como tópico discursivo - o que, como vimos, corresponde, precisamente, à proposição pressuposta evocada por (4) no contexto de (3b).

Por fim, quando se considera a sentença (4) como resposta a (3c), temos ainda uma terceira situação. Vejamos.

Figura 4: Estruturação pragmática da sentença “Meu carro quebrou” (possibilidade 3) 

Como se vê, o caso de (4c) se distingue dos demais em função da ausência de pressuposição - isto é, o falante não assume nem que o ouvinte já está ciente da ocorrência do evento de quebra (como em (3a)) nem que ele já tem o referente carro do falante na linha de frente da sua consciência (como em (3b)). Como resultado, a sentença recebe uma interpretação eventiva: sua função comunicativa consiste em simplesmente reportar a ocorrência de um evento. Em outras palavras, isso significa que a asserção expressa por (4c) é a de que “o carro do falante quebrou”.

Tendo esclarecido as noções de pressuposição e asserção, tais como entendidas em no âmbito do modelo lambrechtiano, é possível passar para o conceito de foco. O foco é definido por Lambrecht (1994: 213) como “o componente semântico de uma proposição pragmaticamente estruturada por meio do qual a asserção difere da pressuposição”.

Para ilustrar essa ideia, voltemos ao enunciado (4a), cuja asserção foi expressa por meio da fórmula “x = carro”. Se preferirmos deixar esse tipo de formulação de lado e expressar a mesma ideia em prosa, teremos algo como “o veículo do falante que quebrou foi o carro”. Essa formulação tem a vantagem de deixar mais evidente o fato de que, na asserção expressa por (4a), estão incluídos tanto o argumento carro quanto o predicado quebrar. Ao mesmo tempo, porém, é fácil verificar que apenas um desses elementos - a saber, o predicado quebrar - participa também da proposição pressuposta evocada por (4a). Ora, se aplicarmos ao exemplo (4a) a definição segundo a qual o foco corresponde ao elemento por meio do qual “a asserção difere da pressuposição” (grifo nosso), concluiremos que o elemento focal aqui é o referente de “carro”.

Neste ponto, é possível acrescentar que os três tipos de estruturação pragmática analisados nas figuras 2 a 4 também se distinguem em relação ao que conta como elemento focal em cada caso (e, consequentemente, ao domínio sintático do foco, como veremos em breve). Afinal, em cada um dos exemplos, o elemento que leva a asserção a diferir da pressuposição não é o mesmo. Se em (4a), como vimos, esse elemento corresponde ao referente de “carro”, em (4b) ele corresponde ao denotatum de “quebrar” - afinal, o referente carro do falante já está, neste caso, previamente estabelecido como tópico discursivo. Em (4c), por fim, o elemento focal coincide com a asserção “o carro do falante quebrou” - uma vez que este último enunciado não evoca nenhuma proposição pressuposta.

A análise acima evidencia ainda que o domínio sintático do foco não é idêntico nos exemplos (4a), (4b) e (4c). Especificamente, se em (4a) o elemento focal é carro, isso significa que o domínio sintático do foco corresponde ao NP. Analogamente, em (4b), o elemento focal é quebrou, o que significa que o foco recai sobre o VP. Por fim, como em (4c) o foco corresponde ao denotatum do enunciado inteiro, verifica-se que seu domínio sintático de atuação é a sentença.

A análise desenvolvida até aqui sugere a existência de três grandes tipos de estrutura de focalização, referidas por Lambrecht (1994) como foco argumental ou identificacional, (correspondente ao caso de (4a)), foco de predicado ou estrutura tópico-comentário (correspondente ao caso de (4b)) e foco sentencial (correspondente ao caso de (4c)).

Como mostram as figuras 2 a 4, um enunciado resulta, em geral, da sobreposição entre uma proposição pressuposta (ou simplesmente pressuposição) e uma proposição comunicada (ou asserção). Ao se afirmar que a asserção se sobrepõe à pressuposição - e não apenas se justapõe a ela -, abre-se espaço para a possibilidade de que haja coincidência parcial entre essas duas proposições. Em outras palavras, assume-se que a asserção, embora veicule “informação nova”, pode conter elementos que comparecem também na “informação velha” (com efeito, a tabela mostra que isso só não ocorre no caso do foco sentencial).

É precisamente por isso que, no modelo lambrechtiano, a palavra “foco” deve ser entendida como uma abreviação para “foco da informação nova”.

Enquanto a asserção, tomada globalmente, veicula informação nova, as porções da asserção que já se encontram na pressuposição não contribuem para torná-la informativa. Nesse sentido, a porção crítica da asserção corresponderá ao elemento que permite a ela diferir da pressuposição. É esse elemento que será referido como foco no modelo lambrechtiano.

4. Hipóteses

Como mencionado na introdução, exploraremos aqui a ideia de que AAs e ACs apresentam propriedades informacionais distintas no PB. Especificamente, nossa hipótese central pode ser formulada assim: enquanto AAs devem necessariamente corresponder ao único argumento verbal contido no domínio do foco, ACs são não-marcados a esse respeito. Essa hipótese, à qual iremos nos referir como Hipótese do Foco Exclusivo (HFE), produz a previsão de que sentenças nas quais o AA compartilhe o domínio do foco com um segundo argumento serão mal-formadas - ao passo que o mesmo não acontecerá com ACs. Os exemplos abaixo ilustram essa ideia.

  • 5. a. O que ele fez?

  • b. ? Ele respondeu lindo.

  • c. ?# Ele respondeu lindo que a vida era muito curta.

  • 6. a. O que ele fez?

  • b. Ele respondeu lindamente.

  • c. Ele respondeu lindamente que a vida era muito curta.

A pergunta em (5a) deixa claro que tanto em (5b) quanto em (5c) o domínio do foco corresponde ao predicado - isto é, trata de uma estrutura de focalização do tipo tópico-comentário. Aqui, assumimos que a diferença informacional fundamental entre (5b) e (5c) é o fato de que a primeira veicula apenas uma informação nova (ele respondeu lindo4), ao passo que a segunda veicula duas informações novas (ele respondeu lindo e ele respondeu que a vida era muito curta). Em termos lambrechtianos, isso implica que o domínio do foco de (5b) inclui apenas um elemento focal (respondeu lindo), ao passo que o domínio do foco de (5c) inclui dois elementos focais (respondeu lindo e respondeu que a vida era muito curta5). Nesse sentido, é possível verificar que, enquanto a resposta (5b) apresenta um único argumento sintático no domínio do foco (o AA “lindo”), a resposta (5c) exibe dois argumentos nesse domínio (o AA “lindo” e o objeto oracional). Assim, nesses exemplos, a diferença entre os julgamentos de aceitabilidade propostos acima traduzem a previsão, derivada da HFE, de que uma sentença do tipo (5b), em que apenas o AA está contido no domínio do foco, será mais aceitável que uma sentença do tipo (5c), em que o AA compartilha o domínio do foco com um argumento adicional.

Neste ponto, cabe fazer uma ressalva. Não há a expectativa, naturalmente, de que uma sentença do tipo (5b) seja percebida como plenamente aceitável por um falante nativo do PB: dados os conhecidos efeitos de familiaridade (“entrenchment”) e bloqueio estatístico6, é de se esperar que o uso de “lindo” em função adverbial acarrete estranhamento. É precisamente essa expectativa que está indicada pelo sinal de interrogação em (5b). No entanto, assume-se que uma sentença como (5c), além de produzir o mesmo estranhamento provocado pela falta de familiaridade (conforme novamente indicado pela interrogação), será ainda pragmaticamente mal sucedida, por violar a exigência de foco exclusivo (como sugerido pelo sinal de sustenido). Se a HFE estiver correta, então, uma sentença como (5b) deverá ser considerada relativamente mais aceitável que uma sentença como (5c)7.

É interessante notar, contudo, que a HFE não é formulada como um princípio pragmático geral. Em vez disso, a hipótese é a de que a exigência de foco exclusivo decorre de uma restrição informacional específica aos adjetivos adverbiais. Dessa maneira, se a HFE estiver correta, os exemplos (6b) e (6c) deverão ser julgados como sentenças igualmente aceitáveis, refletindo a ausência de restrições pragmáticas para os ACs.

Neste momento, estamos em condições de apresentar nossa segunda hipótese, que diz respeito a uma possível interação entre foco e frequência de ocorrência dos AAs. Essa hipótese pode ser formulada assim: AAs de alta frequência não demonstram preferência por foco exclusivo. Essa hipótese prevê, portanto, que a preferência por foco exclusivo em AAs é neutralizada em itens que apresentam alta frequência como AAs. Os exemplos abaixo ilustram essa ideia:

  • 7. a. O que ele fez?

  • b. Ele respondeu rápido.

  • c. Ele respondeu rápido que a vida era muito curta.

Diferentemente de “lindo”, o item “rápido” é usado frequentemente em função adverbial.

Por essa razão, assumindo-se que nossa segunda hipótese esteja correta, é de se esperar que (7b) e (7c) sejam igualmente aceitáveis. Fundamentalmente, portanto, nossa segunda hipótese prevê o cancelamento da HFE para AAs de alta frequência, como “rápido”.

Neste ponto, porém, vale lembrar que este trabalho propõe um tratamento construcionista para os modificadores verbais do PB. Nesse sentido, cabe indagar de que maneira as hipóteses acima podem ser reformuladas não mais em termos de um contraste entre duas categorias sintáticas (AAs versus ACs), mas em termos de uma oposição entre duas construções gramaticais.

Para isso, o primeiro passo é lembrar que a GCBU concebe o conhecimento linguístico do falante como uma rede de construções gramaticais organizadas em diferentes níveis de generalidade/especificidade. Qual seria, então, a porção da rede construcional do falante do PB que captura o seu conhecimento acerca de AAs e ACs? E de que maneira as hipóteses descritivas acima poderiam ser representadas nessa rede?

Assumimos, como hipótese de trabalho inicial, a seguinte representação preliminar.

Figura 5: Representação das construções de modificação verbal. 

Como se observa, a rede acima exibe uma construção altamente geral e abstrata (representada, por isso, na parte mais alta do diagrama), que tem a forma verbo + modificador. Essa construção não especifica, portanto, o tipo de modificador verbal envolvido - isso fica por conta do nível seguinte, no qual se verifica uma construção específica para ACs (a Construção de Advérbio Canônico, doravante CAC) e outra para AAs (a Construção de Adjetivo Adverbial, doravante CAA). Por fim, no último nível, encontram-se construções semipreenchidas, como V+duro e V+feio8.

Delineada essa rede preliminar, é possível detalhar de que maneira as hipóteses apresentadas acima podem ser traduzidas em termos construcionistas.

A HFE diz respeito às construções do segundo nível da rede: à luz da GCBU, afirmar que apenas AAs devem corresponder ao único argumento no domínio do foco implica sustentar que a CAA exibe, no seu polo funcional, uma restrição pragmática que não está especificada na CAC. A essa restrição, iremos nos referir como Restrição do Foco Exclusivo (RFE).

Por sua vez, nossa segunda hipótese diz respeito às construções semipreenchidas que compõem o terceiro nível da hierarquia construcional. Como observamos acima, essas construções envolvem AAs de alta frequência. Se nossa hipótese estiver correta, isso significa que as construções semipreenchidas não irão apresentar a RFE no seu polo funcional.

Ambas as hipóteses podem ser representadas da seguinte maneira.

Figura 6: Representação construcional das hipóteses da pesquisa. 

A rede acima traduz o que se supõe ser o conhecimento pragmático do falante do PB acerca da modificação verbal. Em consonância com a HFE, a CAA especifica, em seu polo funcional, a RFE, a qual, no entanto, está ausente da CAC.

Além disso, construções de adjetivo adverbial mais concretas - isto é, aquelas que exibem o slot do modificador preenchido por AAs particulares- também não exibem o requerimento de foco exclusivo9.

5. O experimento

A fim de verificar nossas hipóteses, foi realizado um experimento offline de julgamento de aceitabilidade. Esta seção se inicia por uma visão geral desse experimento, com o objetivo de esclarecer sua lógica subjacente (5.1). Na sequência, descrevemos o desenho experimental (5.2) e a composição dos estímulos (5.3), detalhamos o perfil dos participantes (5.4), apresentamos os materiais e procedimentos adotados (5.5) e, por fim, explicitamos a técnica de análise estatística utilizada (5.6).

5.1. Visão geral

Como já ficou dito, o objetivo primário do experimento foi o de verificar a hipótese de que os AAs do PB - mas não os ACs - exigem exclusividade no domínio do foco. Para isso, foram construídas listas de sentenças contendo AAs e Acs10. Em ambos os casos, as sentenças críticas foram divididas nas condições Foco Exclusivo (FE) e Foco Não-Exclusivo (FNE), conforme os exemplos abaixo.

  • 8. a. O chefe critica sutil.

  • b. O chefe critica sutil os funcionários.

  • 9. a. O chefe critica sutilmente.

  • b. O chefe critica sutilmente os funcionários.

Diante de estímulos como estes, a tarefa solicitada aos participantes consistia em julgar a naturalidade das sentenças apresentadas com base em uma escala Likert de cinco pontos, cujos graus extremos (1 e 5) deveriam ser atribuídos, respectivamente, a sentenças completamente inaceitáveis e plenamente aceitáveis 11 . Dada a HFE, a expectativa é a de que estímulos do tipo (8a) (condição FE) sejam julgados mais aceitáveis do que estímulos do tipo (8b) (condição FNE). Ao mesmo tempo, dada a sugestão de que a HFE corresponde a uma peculiaridade discursivo-pragmática dos AAs (e não a um princípio pragmático geral), espera-se que a mesma diferença não seja observada entre estímulos do tipo (9a) e (9b).

Adicionalmente, sustentamos aqui que a RFE é uma propriedade funcional que se faz presente apenas na CAA mais abstrata - ela não compareceria, portanto, nas construções semipreenchidas. Para verificar essa hipótese, o experimento buscou contrastar estímulos como os seguintes.

  • 10. a. O chefe critica sutil.

  • b. O chefe critica sutil os funcionários.

  • 11. a. Nós precisamos conversar sério.

  • b. Nós precisamos conversar sério sobre o futuro.

Neste caso, não se trata de comparar AAs a ACs, mas de contrapor o funcionamento de AAs de baixa frequência, do tipo “sutil”, ao de AAs de alta frequência, do tipo “sério”. Aqui, em conformidade com a nossa segunda hipótese, a expectativa é a de que seja neutralizada, no contraste entre sentenças como (11a) e (11b), a diferença de aceitabilidade que se espera encontrar entre usos como (10a) e (10b).

5.2. Desenho experimental

O experimento foi concebido com desenho inter-sujeitos, de maneira que os participantes foram divididos em dois grupos: experimental, cujos integrantes tiveram acesso a sentenças com AAs, e controle, cujos integrantes julgaram sentenças com ACs.

No grupo experimental, foram levadas em conta duas variáveis independentes: tipo de foco (exclusivo versus não-exclusivo) e frequência do AA (alta versus baixa). Dessa maneira, os sujeitos do grupo experimental julgaram a aceitabilidade dos estímulos críticos em quatro condições: Foco Exclusivo / Alta Frequência (FE/AF), Foco Exclusivo / Baixa Frequência (FE / BF), Foco Não-Exclusivo / Alta Frequência (FNE / AF) e Foco Não-Exclusivo / Baixa Frequência (FNE / BF). Ao todo, os participantes do grupo experimental foram expostos a 48 estímulos, dos quais 16 críticos e 32 distratores. Os estímulos críticos foram divididos em duas listas - referidas como scripts A e B - por meio da técnica do quadrado latino, a fim de evitar repetição de material lexical entre as duas condições de foco. Metade dos participantes do grupo experimental teve acesso ao script A e a outra metade, ao script B.

No grupo controle, foi levada em conta apenas a variável independente tipo de foco, resultando em duas condições experimentais: Foco Exclusivo versus Foco Não-Exclusivo. A variável frequência não foi incluída aí porque, como se viu na seção 4, nenhuma das hipóteses teóricas sugere a existência de efeitos de frequência para ACs.

Nesse sentido, os estímulos com ACs foram incluídos como um controle em relação aos estímulos com AAs. Isto é, supondo-se que seja possível demonstrar preferência por foco exclusivo nas sentenças com AAs, o objetivo do grupo controle é assegurar que essa preferência consiste em uma especificidade informacional da CAA - e não em um princípio pragmático geral. Ao todo, os participantes do grupo controle foram expostos a 24 estímulos, dos quais 8 críticos e 16 distratores. Assim como no grupo experimental, os estímulos críticos foram divididos em scripts A e B por meio da técnica do quadrado latino. Assim, metade dos participantes do grupo experimental teve acesso ao script A e a outra metade, ao script B.

Todos os estímulos críticos exibiam, nesta ordem, um sujeito, um verbo e um adjunto. No caso das sentenças pertencentes às condições de FE, não havia qualquer outro elemento sintático após o adjunto; no caso das sentenças pertencentes às condições de FNE, ao seguia-se um complemento. As tabelas abaixo apresentam, respectivamente, um exemplo de cada uma das quatro condições do grupo experimental e das duas condições do grupo controle.

Tabela 1: Exemplos de estímulos para grupo experimental 

CONDIÇÃO SCRIPT A SCRIPT B
FE / AF Eu estava apenas pensando alto. O zagueiro ajeitou o corpo e chutou forte.
FNE / AF Victor ficou com raiva e chutou forte a parede. A Maria estava pensando alto sobre seus problemas familiares.
FE / BF Não queremos nada pronto: a graça é produzir artesanal. Em vez de ser agressivo, prefiro criticar sutil.
FNE / BF O ministro criticou sutil seus funcionários. Aquela rede de bares produz artesanal sua própria cerveja.

Tabela 2: Exemplos de estímulos para grupo controle 

CONDIÇÃO SCRIPT A SCRIPT B
FE Em vez de ser agressivo, prefiro criticar sutilmente. Não queremos nada pronto: a graça é produzir artesanalmente.
FNE Aquela rede de bares produz artesanalmente sua própria cerveja. O ministro criticou sutilmente seus funcionários.

5.3. Composição dos estímulos

Para a composição dos estímulos com AAs, foram selecionados previamente oito itens adjetivais convencionalmente utilizados em função adverbial (“alto”, “certo”, “direito”, “duro”, “fundo”, “forte” e “sério”) e oito itens adjetivais tipicamente não utilizados nessa função (“leal”, “racional”, “manual”, “artesanal”, “sutil”, “lindo”, “tático” e “oral”). Em seguida, a frequência desses itens na CAA foi verificada por meio dos corpora NILC/São Carlos e Corpus Brasileiro. Para cada item, utilizou-se, em ambos os corpora, um comando de busca que permitia levantar sequências formadas por um verbo seguido pela palavra relevante (“certo”, “alto”, etc.), com a exclusão dos casos em que o verbo fosse típico de um “predicado nominal” (o que inclui verbos como “ser”, “estar”, “parecer”, etc.).

Após a junção dos resultados de ambos os corpora, os dados foram revisados manualmente, a fim de que fossem descartadas as ocorrências que não correspondessem a instâncias da CAA. Os itens usados convencionalmente como advérbios tiveram frequência token entre 39 (“fundo” e “duro”) e 1.194 (“certo”). Já os itens não utilizados convencionalmente como advérbios tiveram frequência zero, com exceção apenas de “lindo”, com apenas uma ocorrência. Esses resultados dão suporte à seleção dos itens listados acima para a composição dos estímulos das condições de alta e baixa frequência do grupo experimental.

Para a composição dos estímulos do grupo controle, foram selecionados oito ACs formados a partir dos itens adjetivais incluídos nos estímulos de baixa frequência do grupo experimental.

Com isso, os ACs selecionados foram: “artesanalmente”, “lealmente”, “lindamente”, “manualmente”, “oralmente”, “racionalmente, “sutilmente” e “taticamente”.

Tanto os estímulos com AAs quanto os estímulos com ACs foram submetidos à distribuição em quadrado latino. Com isso, foram produzidas duas listas de estímulos para cada grupo (scripts A e B). Para além dos estímulos críticos, foram confeccionadas também sentenças distratoras, em número duas vezes maior.

Com isso, cada sujeito do grupo experimental teve acesso a 48 estímulos, dos quais 16 críticos (quatro para cada condição) e 32 distratores (totalizando 32 estímulos críticos na soma dos dois scripts), ao passo que cada sujeito do grupo controle teve acesso a 24 estímulos, dos quais oito críticos (quatro para cada condição) e 16 distratores (totalizando 16 estímulos críticos na soma dos dois scripts).

5.4. Participantes

Participaram do estudo 74 sujeitos com idades entre 18 e 28 anos, todos falantes nativos do PB e estudantes universitários cursando o primeiro mês do curso de Letras ou cursos de graduação não relacionados à área de linguagem. Como se observa, o objetivo foi uniformizar em alguma medida o perfil dos participantes em relação à escolaridade (todos com ensino superior incompleto), com o cuidado particular de evitar sujeitos que eventualmente já tivessem estudo de forma sistemática o tema da pesquisa (daí a inclusão de alunos de cursos de Letras apenas se eles estivessem no primeiro mês do primeiro período da graduação).

Como recompensa pela participação, os voluntários receberam horas de Atividades Acadêmico-científico-culturais.

5.5. Materiais e procedimentos

O experimento foi montado no software PsyScope e rodado com auxílio de uma caixa de botões numerados de 1 a 5. Inicialmente, todos os voluntários receberam explicações orais sobre a tarefa experimental e a dinâmica do experimento.

Em seguida, cada sujeito avaliou, na presença do pesquisador, cinco estímulos de treinamento. Depois disso, os participantes foram deixados por conta própria.

Em um primeiro momento, os sujeitos tinham acesso a uma tela com instruções escritas. Esse texto solicitava que os participantes utilizassem a caixa de botões para julgar, com base na própria intuição, a aceitabilidade das sentenças a serem exibidas a partir de uma escala com cinco níveis: 1. Totalmente inaceitável; 2. Pouco aceitável; 3. Medianamente aceitável; 4. Muito aceitável; 5. Totalmente aceitável.

Após ter compreendido as instruções iniciais, o participante deveria pressionar a barra de espaço para que se iniciasse a apresentação dos estímulos.

Estes foram organizados em ordem pseudoaleatória, de modo que duas sequências críticas não fossem exibidas de forma consecutiva.

Cada estímulo ficou exposto por 4200ms, seguido de uma tela na qual se indagava sobre seu grau de aceitabilidade. Essa tela permanecia visível por tempo indeterminado, até que os participantes indicassem a reposta por meio da caixa de botões. Essa resposta levava automaticamente à exibição do estímulo seguinte.

5.6. Tratamento estatístico

Na seção 4, formulamos duas hipóteses: a primeira sustentava que AAs, mas não ACs, exigem exclusividade no domínio do foco; a segunda defendia que essa exigência seria neutralizada nos AAs de alta frequência. Para verificar cada uma delas, os resultados foram submetidos a testes de qui-quadrado, respectivamente, de homogeneidade e de independência.

6. Resultados

A principal hipótese deste trabalho é a de que AAs e ACs não são equivalentes do ponto de vista informacional: especificamente, os primeiros, mas não os segundos, resistiriam a ser empregados como informação nova adicional em um enunciado.

Os resultados do experimento são compatíveis com essa hipótese: enquanto, no grupo experimental, foi possível constatar diferença significativa no grau de aceitabilidade das sentenças com foco exclusivo e não-exclusivo (p=0,007), no grupo controle essa diferença não alcançou significância estatística (p=0,21). Os resultados referentes aos AAs estão sintetizados abaixo.

Tabela 3: Graus de aceitabilidade por tipo de foco no grupo experimental. 

FOCO EXCLUSIVO FOCO NÃO-EXCLUSIVO
1 9 (3,12%) 26 (9,02%)
2 25 (8,68%) 31 (10,76%)
3 35 (12,15%) 52 (18,05%)
4 56 (19,44%) 71 (24,65%)
5 163 (56,59%) 108 (37,5%)
TOTAL 288 288

Gráfico 1: Graus de aceitabilidade por tipo de foco no grupo experimental 

O padrão que emerge dos dados acima é o seguinte: o índice de sentenças totalmente inaceitáveis (grau 1), pouco aceitáveis (grau 2), medianamente aceitáveis (grau 3) e muito aceitáveis (grau 4) é maior na condição FNE; em contrapartida, o índice de sentenças completamente aceitáveis (grau 5) é maior na condição FE. Especificamente, as sentenças julgadas plenamente aceitáveis perfazem 56,59% dos estímulos com FE, e apenas 37,5% dos estímulos com FNE; e, inversamente, as sentenças completamente inaceitáveis correspondem a apenas 3,12% dos estímulos com foco exclusivo e 9,02% dos estímulos com foco não-exclusivo. Dado que, como se disse, a diferença na distribuição dos graus de aceitabilidade é estatisticamente significativa (p=0,007), esses resultados sugerem que os falantes tendem a rejeitar a duplicidade de elementos focais quando um desses elementos corresponde a um AA.

Os resultados referentes ao grupo experimental confirmam, portanto, a intuição de que os AAs são sensíveis à RFE: de modo geral, sentenças em que o AA vinha acompanhado de um segundo elemento focal foram percebidas como menos naturais. No entanto, como vimos, a HFE não sustenta apenas que AAs rejeitam o foco não-exclusivo - ela sugere ainda que esta não é uma restrição pragmática geral, e sim uma particularidade desse tipo de modificador. Para verificar a validade dessa suposição, vejamos agora os resultados do grupo controle:

Tabela 4: Graus de aceitabilidade conferidos por tipo de foco no grupo controle 

FOCO EXCLUSIVO FOCO NÃO-EXCLUSIVO
1 1 (0,64%) 2 (1,28%)
2 1 (0,64%) 5 (3,20%)
3 6 (3,84%) 15 (9,61%)
4 24 (15,38%) 29 (18,58%)
5 124 (79,48%) 105 (67,30%)
TOTAL 156 156

Gráfico 2: Graus de aceitabilidade conferidos por tipo de foco no grupo controle 

Como se vê, o padrão geral não é fundamentalmente diferente daquele que se verifica no grupo experimental: também aqui se observa um maior índice de graus 1, 2, 3 e 4 na condição FNE, e um maior índice de graus 5 na condição FE. No entanto, a diferença entre as duas condições parece menos acentuada neste caso - e, crucialmente, reitere-se, ela não alcança significância estatística. Em outras palavras, precisamente como previsto pela HFE, não se verifica diferença estatisticamente significativa entre as condições FE e FNE no grupo controle. Esse resultado sugere que, diferentemente dos AAs, os ACs do PB não aderem à RFE.

Por outro lado, não foi possível confirmar a segunda hipótese deste trabalho, na medida em que não foi possível demonstrar estatisticamente a existência de um efeito de interação entre as variáveis frequência e tipo de foco (p=0,15). Os dados relevantes podem ser vistos abaixo.

Tabela 5: Soma dos graus de aceitabilidade conferidos por condição. 

Frequência alta Frequência baixa
Foco Exclusivo 682 521
Foco Não-Exclusivo 657 411

Gráfico 3: Soma dos graus de aceitabilidade conferidos por condição. 

O gráfico acima, que reflete a soma dos graus de aceitabilidade nas diferentes condições experimentais, sugere, visualmente, uma menor diferença entre as condições FE e FNE no caso dos AAs de alta frequência, em comparação com os itens de frequência baixa. Isso é exatamente o que se poderia esperar dada a segunda hipótese deste trabalho. Apesar disso, como a interação entre as variáveis frequência e foco não alcançou significância estatística, não foi possível demonstrar a existência de um efeito de interação entre frequência e propriedades pragmáticas12.

7. Discussão

Este trabalho partiu da hipótese de que, no PB, ACs e AAs exibem uma diferença informacional: enquanto os primeiros exigiriam exclusividade no domínio do foco, os segundos seriam não-marcados a esse respeito. Adicionalmente, sugerimos que essa diferença seria neutralizada no caso de AAs particularmente frequentes.

Sob uma ótica construcionista, essas hipóteses descritivas conduzem à sugestão de que o conhecimento linguístico do falante do PB acerca das estratégias de modificação verbal teria o formato da rede construcional representada na figura 3. Neste ponto, então, é possível fazer a seguinte pergunta: o que os resultados do experimento revelam em relação à rede de modificação de verbal proposta na seção 4?

Fundamentalmente, os resultados são compatíveis com a ideia de que a RFE estaria representada no polo funcional da CAA, mas não no polo funcional da CAC. Por outro lado, eles não comprovam a supressão da RFE nos níveis mais baixos da rede. Isso significa que os resultados apontam para a postulação da seguinte representação construcional:

Figura 7: Rede construcional da modificação verbal segundo resultados do experimento 

O contraste entre a presença e ausência da RFE nas construções intermediárias traduz o que acreditamos ser a principal contribuição descritiva deste estudo: advérbios qualitativos em -mente e adjetivos adverbiais são pragmaticamente distintos, na medida em que oferecem diferentes contribuições para a estrutura informacional da sentença. Assim, mesmo que a semântica das duas construções seja equivalente, o fato é que elas estão disponíveis para um leque de funções comunicativas distintas: enquanto a CAC pode ser usada tanto para expressar apenas o modo de realização de um evento (falar claramente) quanto para expressar tanto o modo quanto o participante envolvido no evento (falar claramente sobre seus problemas), a CAA parece apropriada apenas para os casos em que a única informação a ser veiculada diz respeito ao modo (falar claro, mas ??falar claro sobre seus problemas 13 ).

Por outro lado, a expectativa de que essa diferença se neutralizasse nos níveis mais baixos da rede não se concretizou. Essa expectativa derivava da ideia, bastante difundida em Linguística Baseada no Uso, de que o aumento da frequência leva à autonomização de uma construção em relação a outras partes da rede. O fato de que isso não se verificou, porém, não implica necessariamente que a exposição repetida não provoca autonomização - um fenômeno, de resto, já fartamente documentado na literatura ( Bybee 2010) e referências lá citadas). Uma possibilidade de interpretação é a de que as sequências concretas com AAs não tenham ainda alcançado frequência suficiente para se desgarrarem da CAA abstrata. Outra é a de que propriedades informacionais estejam imunes desse efeito. Para avaliar essas possibilidades, mais estudos são necessários.

8. Considerações finais

Este trabalho buscou contribuir com a vasta literatura que se debruça sobre as diferenças entre dois tipos de modificadores verbais do PB: os advérbios em -mente e os adjetivos adverbiais. Como já observamos, essas pesquisas tendem a focalizar fatores como tradição discursiva, estrutura sintática e interpretação semântica. O experimento relatado aqui, por sua vez, dá um passo além ao sugerir a existência de uma diferença de natureza pragmática entre AAs e ACs do PB: enquanto os primeiros não podem ser usados para expressar uma informação adicional no domínio do foco, os segundos não apresentam essa restrição. Torcemos para que esses resultados inspirem outros pesquisadores a incorporar o componente informacional à análise e descrição dos modificadores verbais.

Referências bibliográficas

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1Para além dessas estratégias de modificação verbal, há ainda, pelo menos, a alternativa com sintagmas preposicionados (“Ele trabalhou com eficiência”) e com gerúndio (“Ele fala correndo”). Este artigo, contudo, contempla apenas os advérbios em -mente e os adjetivos adverbiais

2A ideia de que os diferentes tipos de modificadores exibem “restrições pragmáticas inerentes” implica que categorias específicas (em particular, advérbios em -mente e AAs) podem ser especificadas em relação às suas propriedades informacionais (foco, tópico, pressuposição, etc.). Como veremos em breve, ao aderir ao modelo teórico da Gramática de Construções (GC), este trabalho assume que cada categoria corresponde a uma construção gramatical distinta; como consequência, postula-se que essas propriedades informacionais integram o polo semântico dessas construções. O modelo da GC será apresentado brevemente na seção 2. A proposta de postulação de propriedades informacionais inerentes para cada construção está detalhada na seção 4

3Esta proposta não implica que ACs não podem integrar uma configuração de foco simples - apenas que eles são não-marcados em relação ao tipo de foco. Esse ponto será desenvolvido na seção 4

4A fonte versalette indica que se trata aqui de uma proposição semântica, e não de uma sentença sintaticamente realizada

5Lembremos, conforme discutido anteriormente, que o foco corresponde à porção de uma proposição pragmaticamente estruturada em que a asserção (sinônimo de “informação nova”) difere da pressuposição. Como se trata aqui de uma estrutura tópico comentário, o referente de “Ele”, embora parte da asserção, não corresponde a um elemento focal, de modo que o domínio pragmático do foco corresponde ao domínio sintático do comentário

6O conceito de bloqueio estatístico (“statistical preemption”) diz respeito ao fato de que uma construção particularmente frequente pode reduzir (ou zerar) a proba bilidade de que uma construção concorrente (isto é, funcionalmente equivalente, em alguma medida) seja empregada. Trata-se de um conceito bastante comum na morfologia; por exemplo, é o que explica a inexistência de “ensinador” - a despeito do fato de esse output não ser vetado pela Regra de Formação de Palavras relevante, ele é bloqueado pela forma “professor”. Em sintaxe, o emprego desse conceito é historicamente mais restrito, mas essa situação tem mudado significativamente com a popularização da GC. No caso dos exemplos em foco, o ponto é que se espera que usos como (5b) seja bloqueado por usos como (6b), o que deverá reduzir sua aceitabilidade independentemente de fatores gramaticais (no caso de trabalho, especificamente pragmáticos)

7Como se observa, tomamos a aceitabilidade como propriedade gradiente, e não binária: sentenças podem ser mais ou menos aceitáveis, em diferentes graus, e não simplesmente aceitáveis ou inaceitáveis. Conforme veremos na próxima seção, isso se reflete no desenho do estudo experimental que desenvolvemos: nele, os participantes devem julgar a aceitabilidade das sentenças apresentadas em uma escala de 1 a 5. Nesse sentido, não afirmamos que usos como (5c) serão, necessariamente, inteiramente inaceitáveis. Mas afirmamos, sim, que usos desse tipo serão significativamente menos aceitáveis que usos como (6c) (como se verá na próxima seção, essa diferença se revelou estatisticamente significativa)

8Os níveis representados nessa rede são apenas aqueles relevantes para a proposta desenvolvida aqui - em princípio, nada impede que outros níveis ajudem a estruturar o conhecimento do falante sobre a modificação verbal no PB. Por exemplo, é razoável supor a existência tanto de construções abstratas definidas a partir de classes semânticas de modificadores verbais quanto de construções inteiramente preenchidas (como jogar feio). Esses dois tipos de construções não estão representados acima porque dizem respeito a aspectos da gramática da modificação verbal que fogem ao escopo deste trabalho

9Neste momento, pode ser interessante fazer uma observação. Afirmamos reiteradamente, neste artigo, que AAs e ACs não são equivalentes do ponto de vista informacional. Como se observa na figura 3, a correta interpretação dessa afirmação pressupõe uma perspectiva construcionista acerca da organização do conhecimento linguístico: o que estamos afirmando é que a construções de adjetivo adverbial e de advérbio canônico não são equivalentes em relação às propriedades informacionais especificadas em seus polos funcionais. Isso não impede que outras construções - aquelas que exibem adjetivos adverbiais particulares (como V + DURO e V + FEIO) - sejam insensíveis à restrição de foco exclusivo; esse fato é capturado em um nível mais baixo (isto é, menos esquemático) da rede construcional, como se vê, novamente, na figura 3

10Os detalhes sobre o desenho experimental e sobre a composição dos estímulos estão apresentados nas seções 5.2 e 5.3, respectivamente

11Conforme observado mais acima, é evidente que se espera encontrar algum efeito de familiaridade no julgamento de usos (8a) e (8b), em função da baixa frequência de ocorrência da forma “lindo” como AA. Isso, contudo, não afeta a análise na medida em que a diferença de aceitabilidade entre usos do tipo (8a) e usos do tipo (8b) é capaz de revelar a existência de algum efeito específico de foco (independentemente da frequência). Esse ponto ficará mais claro na continuação desta seção 5

12Um parecerista pergunta “o que é efetivamente percebido como menos natural no rastreamento das respostas aos estímulos oferecidos aos participantes”. Como saldo final, os resultados parecem sugerir, que, para AAs, tanto o tipo de foco (exclusivo e não-exclusivo) quanto a familiaridade do sujeito com um dado uso (refletida na oposição entre alta e baixa frequência) interferem no julgamento de aceitabilidade. No entanto, os resultados que temos para cada uma dessas variáveis têm natureza diversa. De um lado, o impacto da variável foco fica comprovado pelo p-valor = 0,007 referente ao contraste entre as duas condições informacionais. De outro, o impacto da familiaridade fica apenas sugerido pelas diferenças numéricas da tabela 5 (soma total das notas na condição de alta frequência = 1339; soma total das notas na condição de baixa frequência = 932). Essa diferença decorre, em última instância, da própria pergunta de pesquisa que motivou o estudo e das hipóteses dela recorrentes. Conforme explicamos na seção 4, não era objetivo deste trabalho verificar o efeito da frequência sobre o julgamento (de resto, já amplamente documentado na literatura). Com efeito, entre as nossas hipóteses (seção 4), pode-se observar que não havia nenhum voltada unicamente para o impacto de frequência - havia, isso sim, uma hipótese voltada unicamente para o fator informacional e uma hipótese referente à interação entre propriedades informacionais e frequência. Em consonância com essa hipóteses, não foi feito um cálculo de qui-quadrado de homogeneidade referente à variável independente frequência; em vez disso, conforme explicado na seção 5.6, essa variável entrou em um cálculo de qui-quadrado de independência, necessário para verificar a hipótese de interação. É precisamente por isso que nossos resultados demonstram o efeito da restrição informacional e apenas sugerem a existência de um efeito ligado à frequência / familiaridade

13A esta altura do trabalho, este julgamento não reflete mais a intuição do analista, mas os resultados do experimento desenvolvido

NOTA: A divisão de tarefas entre os três autores se deu da seguinte maneira: Elaboração das hipóteses, Victor Virgínio e Diogo Pinheiro; Concepção e montagem do experimento, Victor Virgínio, Diogo Pinheiro e Eduardo Kenedy; Aplicação do experimento, Victor Virgínio; Interpretação dos resultados, Victor Virgínio e Diogo Pinheiro; Redação e revisão do artigo, Victor Virgínio, Diogo Pinheiro e Eduardo Kenedy

Recebido: 18 de Janeiro de 2019; Aceito: 18 de Outubro de 2019

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