1. Introdução
A elevação da vogal /a/ nasal ( samba ˈsǝ͂mbɐ, maçã maˈsǝ͂ŋ) ou nasalizada ( semana seˈmǝ͂nɐ) em português recebeu alguma atenção de análises fonológicas gerativistas (Chomsky e Halle 1968) como a de Mateus (1975) e a de Quicoli (1990), baseadas em regras, ou pautadas pelo modelo da Fonologia Lexical (Kiparsky 1982), como a de Quicoli (1995).1 Os resultados de análises fonético-acústicas sobre a nasalidade de vogais do português brasileiro (Cagliari 1977, Moraes e Wetzels 1992, Sousa 1994, Seara 2000, Medeiros 2007, Medeiros et al. 2008, Souza e Pacheco 2012, Rothe-Neves e Valentim 2012) sugerem retomar a questão da nasalização vocálica em português e abordar, em específico, a elevação da vogal /a/ nasal. É o que se faz no presente artigo, com foco na realização da vogal /a/ nasal em sílaba final de vocábulo ( maçã ). O objetivo é dar os primeiros passos de uma análise que, futuramente, venha a esclarecer restrições fonotáticas e princípios fonológicos que dirigem o processo.
O artigo inicia-se com a apresentação de fatos relativos à fonologia de vogais nasais e nasalizadas do português, o que inclui a discussão da representação fonológica desses segmentos (seção 2). Em seguida (seção 3), contemplam-se a produção e a percepção de vogais nasais, comparando-se português e espanhol em termos de experiência do ouvinte e seu efeito na categorização perceptual de segmentos.
Esse percurso situará as perguntas de investigação: por que a realização da vogal /a/ nasal não é mapeada à representação bifonêmica /vN/ de base por falantes nativos de português ao resolver tarefas de pesquisa como jogos de linguagem? A realização vocálica elevada mas não nasalizada de /a/ nasal é possível? Em caso afirmativo, qual é a natureza desse segmento em termos de altura?
A seção 4 traz respostas a essas perguntas. Nela, descrevem-se os procedimentos metodológicos empregados em uma inspeção acústica preliminar, de cunho qualitativo, de dados com vogal /a/ nasal ( maçã, Catan ), emitidos com elevação/nasalização e com elevação, mas sem nasalização. Para comparação, inspecionam-se também dados com vogal /a/ oral ( catar, bagre ), incluindo-se um empréstimo do inglês ( bug , ‘defeito’) cuja vogal não nasal na língua de origem parece equivaler, em termos de altura, à realização de /a/ nasal em português. A inspeção confirma a possibilidade de haver mais de uma manifestação fonética da vogal /a/ nasal, o que deve explicar a dificuldade de os falantes de português mapearem as realizações à sequência bissegmental de base.
2. A representação fonológica de vogais nasais e nasalizadas em português
Ao lado de sete vogais orais contrastivas2, o português possui vogais nasalizadas (1) e vogais nasais (2).3 Vogais nasalizadas resultam do contato de uma vogal em sílaba aberta com uma consoante nasal4 no início da sílaba seguinte. Vogais nasais emergem na sequência vogal+consoante nasal na mesma sílaba5, e podem ocorrer tanto em interior (2.a) quanto em final de vocábulo (2.b).
(1) banana (baˈnǝ͂nɐ) bananal (banaˈnaw)
cama (ˈkǝ͂mɐ) camareira (kamaˈɾeɾɐ)
nome (nõmɪ) nominal (nomiˈnaw)
tema (ˈte͂mɐ) temático (teˈmaʧikʊ)
rima (ˈhi͂mɐ) rimado (hiˈmadʊ)
(2) a.campo (ˈkǝ͂mpʊ) campestre (kǝ͂mˈpɛstɾɪ)
conto (ˈko͂ntʊ) contista (ˈko͂ɲʧistɐ)
pente (ˈpe͂ɲʧɪ) penteado (pe͂ɲˈʧjadʊ)
cinto (ˈsi͂ntʊ) cintura (si͂nˈtuɾɐ)
junto ˈʒu͂ntʊ juntinho (ʒu͂ɲˈʧi͂ɲʊ)
banco (ˈbǝ͂ŋkʊ) bancário (bǝ͂ŋˈkaɾjʊ)
triunfo (tɾiˈu͂ɱfʊ) triunfar (tɾiu͂ɱˈfaɾ)
b. batom(baˈto͂ŋ) ou (baˈto͂w͂ŋ)
também(tǝ͂mˈbe͂ɲ ) ou (tamˈbe͂j͂ɲ )
fim (ˈfi͂ɲ)
atum(aˈtu͂ŋ)
galã (gaˈlǝ͂ŋ)
As vogais nasais são assim consideradas porque, diferentemente das nasalizadas, têm caráter distintivo (Câmara Jr. 1953, 1970), o que se evidencia em pares como tampa e tapa, ou minto e mito, senda e seda, sim e si, lã e lá. Outra diferença entre vogais nasais e nasalizadas relaciona-se ao acento primário. As vogais nasais ocorrem tanto em sílaba tônica quanto átona (t(ǝ͂)mpa, t(ǝ͂)mpado). Já as vogais nasalizadas encontram-se predominantemente em sílaba tônica (gr(ǝ͂)ma, mas gr(a)mado).6
Vogais nasais e nasalizadas têm em comum o fato de corresponderem, nas formas de output, às vogais (i͂, e͂, ǝ͂, o͂, u), excluindo-se das realizações as vogais baixas (ɛ͂, ɔ͂, a͂).7 Esse aspecto é de interesse porque, em muitas línguas, como o francês, o inverso ocorre: as vogais resultantes de nasalização são baixas.8
Uma peculiaridade das vogais nasais, apenas, diz respeito ao segmento nasal desencadeador da nasalização. Em final de palavra, conforme Cagliari (1977: 27-28), esse segmento se realiza como homorgânico em ponto de articulação à vogal, sendo que, no caso de /e/ e /o/, a vogal nasalizada pode também ditongar-se (2.b), mesmo em sílaba átona (homem (ˈõme͂j͂ɲ) e nylon (ˈnajlo͂w͂ŋ)). Já em interior de vocábulo, segundo Cagliari (1977: 38), esse segmento pode não se realizar, realizar-se como um segmento de transição homorgânico (em ponto de articulação) à vogal precedente ou à consoante seguinte, se essa for oclusiva, como em (3.a). Se a consoante seguinte for fricativa (3.b), ou o segmento nasal não emerge, ou realiza-se um segmento de transição homorgânico à vogal precedente, mas não à consoante seguinte.
A interpretação de que vogais nasais derivem de uma sequência bifonêmica /vN/ é a mais difundida nos estudos sobre nasalização no português (Câmara Jr. 1953, 1970, 1984, Mateus 1975, Lopez 1979, Quicoli 1990, 1995, Wetzels 1997, Battisti 1997, 1998, Bisol 1998, 2002).9 Com ela, é possível conciliar tanto fatos relativos à deriva latim-português e percursos evolutivos de diferentes línguas neo-latinas como espanhol e francês, quanto aspectos observáveis na sincronia da língua. Em favor da presença, na representação fonológica, de um segmento nasal consonantal fechando a sílaba com a vogal que resultará nasal, Câmara Jr. (1953, 1970, 1984) observa que:
(a) não há crase entre vocábulos como lã azul, mas há crase entre vocábulos como casa azul. O bloqueio à crase naquele contexto atesta a presença de um segmento consonantal após a vogal nasal da palavra à esquerda;
(b) /r/ manifesta-se como ‘forte’ após a vogal nasal (honra), o que também acontece quando a sílaba é fechada por outras consoantes (guelra, Israel);
(c) não há hiato com vogal nasal.10
O controle experimental da duração de vogais nasais, nasalizadas e orais (Moraes e Wetzels 1992, Seara 2000, Rothe-Neves e Valentim 2012) evidencia a presença, na representação fonológica, de um elemento nasal de travamento silábico após a vogal nasal: (a) uma vogal nasal (tampa) é mais longa do que uma oral (tapa), tanto em contexto tônico como pretônico (tampa-tampado); (b) uma vogal nasalizada (cama) é ligeiramente mais breve do que uma oral (cala); (c) uma vogal nasal é mais longa do que uma oral diante de oclusivas (campo) e menos longa do que uma oral diante de fricativa (canso). De acordo com Moraes e Wetzels (1992), a duração maior de vogais nasais, especialmente no ambiente de oclusiva após a consoante nasal (campo), é resultado de alongamento compensatório:
A vogal nasal (contrastiva), tônica ou átona, corresponde a dois segmentos na base, V e N. O elemento nasal (N) nasaliza a vogal precedente (...) Em um segundo momento, a consoante nasal cai, gerando um alongamento compensatório da vogal precedente, agora já nasalizada, que passa então a ocupar duas posições temporais.
Uma regra atribuiria às vogais nasais (tônicas ou átonas) seguidas de oclusivas parte do tempo da consoante subsequente, o que explicaria, de um lado, serem as nasais mais longas, neste contexto, que as vogais orais correspondentes e, de outro, a perda de parte da duração consonântica, conforme se verificou. (Moraes e Wetzels 1992: 163-164).
Dado esse conjunto de evidências, segue-se no presente artigo a interpretação bifonêmica /vN/ das vogais nasais, tanto em interior quanto em final de palavra. A nasalidade dessas vogais deriva da nasal na posição de travamento ou coda silábica, mesmo que foneticamente esse elemento tenha caráter transicional ou venha a ser apagado (completamente ‘absorvido’) após a nasalização da vogal. Descarta-se, assim, a hipótese de que o segmento nasal seja apenas fonético e não preencha posição silábica.
Já a representação do segmento nasal de base nos estudos que seguem a interpretação bifonêmica /vN/ é tema de discussão. É um arquifonema nasal para Câmara Jr. (1953, 1970, 1984); uma consoante nasal coronal para Mateus (1975) e Lopez (1979), evidenciada em alternâncias como fim-finar, bem-benefício, lã-lanifício ; uma consoante nasal não plenamente especificada em coda silábica para Wetzels (1997), Bisol (1998, 2002); concebida como o anusvara de Trigo Ferre (1988) para Battisti (1997, 1998).
Estudos em fonética acústica têm colaborado nessa discussão (Sousa 1994, Seara 2000, Medeiros 2007, Souza e Pacheco 2012). Mesmo que não sejam definitivos quanto à natureza do segmento nasal, se consonantal ou vocálico, atestam sua presença após a vogal diante de oclusivas, formando uma transição, mas não diante de consoantes (+contínuo). Nas palavras de Medeiros et al. (2008).
A partir des résultats obtenus, il nous semble impossible de donner un statut précis de consonne ou voyelle à cet appendice qui s’insère entre la voyelle nasale et la consonne, plosive ou fricative, suivante. Cette phase ressemblerait à une consonne à cause de la nette fermeture du conduit vocal pendant sa production, mais aussi à une voyelle à cause de son degré de voisement. A l’évidence, aucune des deux descriptions ne semble suffisante. Pour le moment, nous considérons cet appendice nasal comme la résultante de la constellation de gestes impliqués dans la production de la séquence voyelle nasale + consonne orale: geste vocalique, vélaire et labial. Le geste vélaire serait activé durant le geste vocalique et se superposerait au labial. (Medeiros et al. 2008: 3)
Outra questão abordada em análises gerativas (Chomsky e Halle 1968) na perspectiva da fonologia lexical (Kiparsky 1982), como as de Quicoli (1995) e Bisol (2002), é a da interação da nasalização com outras regras, como a de acentuação e a de elevação da vogal nasalizada e, dessas, com regras morfológicas de flexão (/eskov+a+mos/>(eskoˈvʌ͂mus)) e derivação (/banan+al/>(banaˈnaw)). A elevação é ordenada tardiamente, no estrato pós-cíclico. Embora não fique explícito nessas análises, a regra de elevação de vogal nasalizada tem como alvo a vogal /a/ subjacente.
A motivação fonológica da elevação e o fato de a nasalização no português brasileiro excluir dos outputs nasalizados as vogais (ɛ, ɔ, a) não são em geral abordados. Considerar a natureza coarticulatória da nasalização vocálica e comparar a percepção de vogais nasais em outras línguas pode esclarecer o processo e também a questão da qualidade (altura) das vogais resultantes.
3. Produção e percepção de vogais nasais: comparação de português com espanhol, perguntas de investigação
A articulação de consoantes nasais requer acoplamento das cavidades oral e nasal. Em sequências de vogal mais consoante nasal, o véu baixa antes mesmo da produção das consoantes. Como consequência, o abaixamento sobrepõe-se à articulação da vogal precedente (Goodin-Mayeda 2016), de que resulta a nasalização vocálica.
Diferenças no tempo de sobreposição nasal contribuem para a variabilidade no grau de nasalização vocálica nas línguas do mundo, mas essa variabilidade não é efeito apenas de tendências fisiológicas ou mecanicamente motivadas (Cohn 1990). Resulta de as línguas mirarem as vogais como orais ou nasalizadas, de a nasalização ser, ou não, produto da aplicação de regra fonológica, como exemplifica a nasalização em inglês no contexto de vogal mais consoante nasal (bat (ˈbӕt) ‘bastão; morcego’, ban (ˈbӕ͂n) ‘banir’):
The degree of anticipatory nasalization in American English is extreme compared to that in other languages. This suggests that it is intended by the speaker, part of the programming instructions and not a function of physiological constraints of the vocal organs. The claim that in American English anticipatory nasal coarticulation has been phonologized implies that nasalization is no longer an unintended coarticulatory effect but an intrinsic property of the vowel. (Solé 1992: 30).
Solé (1992) compara o inglês americano ao espanhol peninsular. Controla, experimentalmente, o tempo de alcance (speech rate) do alvo articulatório em relação ao tempo de deslocamento (temporal displacement) do véu palatino na nasalização vocálica, nas duas línguas.
Verifica duração constante (em milissegundos, ms) e relativamente curta da nasalização em espanhol em tempos de alcance variáveis: o véu palatino baixa em torno de 100 ms antes do início (onset) da consoante nasal. Já em inglês, o véu pode baixar antes do início ou no início da articulação da vogal, e a duração da nasalização muda em razão de diferentes tempos de alcance. Isso colabora para manter, em inglês, distâncias perceptuais entre as vogais e evidencia que a nasalização não é automática nessa língua, como é em espanhol.
O fato de a nasalização ser automática ou mecânica em uma língua, não em outra, impacta na experiência linguística do falante e na sua percepção dos efeitos acústicos da emissão coarticulada de vogal+consoante nasal.
Fowler e Brown (2000) examinam a percepção dessas emissões por falantes nativos de inglês americano. Verificam que os ouvintes usam correlatos acústicos da nasalização da vogal para prever se uma consoante seguinte é nasal ou não.
Um desses correlatos é a altura (F1).11 De acordo com Kingston (2007), na emissão de vogais nasais ou nasalizadas, o acoplamento das cavidades oral e nasal adiciona pares de polos nasais (N) e zeros nasais (Z) aos produzidos na cavidade oral. O polo e o zero nasais mais baixos, N1 e Z1, respectivamente, ocorrem próximos ao polo oral mais baixo, F1. Isso implica mudança em F1 (e na altura da vogal percebida): altera-se a largura de banda e o centro de gravidade, agora uma média entre os dois picos espectrais (N1 e F1). N1 fica abaixo de F1 quando F1 é alto, abaixando o centro de gravidade e fazendo com que a vogal soe mais alta. O inverso também é verdadeiro. Ou seja, a nasalização pode dispersar as vogais tanto para cima (elevar) quanto para baixo (abaixar) no espaço vocálico, sendo a elevação o efeito mais frequente nas línguas do mundo.
Análises acústicas de altura das vogais nasais em português brasileiro (PB), como a de Medeiros (2007), cujos resultados estão na Tabela 1 (dados de um participante, falante de PB, provavelmente de São Paulo/SP), e de Souza e Pacheco (2012), cujos resultados constam na Tabela 2 (dados de três participantes, falantes de PB de Vitória da Conquista/ BA), atestam a tendência de a vogal nasal /a/ ( campo, condição (ɜ͂) na primeira análise, /ãN/ na segunda) realizar-se elevada, com F1 cerca de 200 Hz mais baixo do que /a/ oral, padrão formântico já verificado por Seara (2000), Sousa (1994) e Cagliari (1977).
Souza e Pacheco (2012) mostram que a vogal /a/ nasalizada ( ca.ma, condição /ã/) também pode exibir F1 mais baixo do que o da vogal /a/ oral.
A emissão da vogal nasal necessita durar o suficiente para que essas modificações espectrais sejam detectadas (Kingston 2007). Por isso, um correlato acústico da nasalização costuma ser uma maior duração vocálica, como se constata no português brasileiro (Moraes e Wetzels 1992, Seara 2000, Rothe-Neves e Valentim 2012).
Goodin-Mayeda (2011, 2016) testa a hipótese de que a experiência (com padrões de nasalidade) na língua nativa interage com a percepção da altura vocálica em diferentes contextos nasais. Contrasta a percepção da nasalidade por falantes nativos de português brasileiro (PB), espanhol cubano (EC) e espanhol peninsular (EP), porque os padrões de nasalização são diferentes em cada uma dessas línguas. Como vimos na seção 2, o PB apresenta vogais nasalizadas (nasalização alofônica) e vogais nasais (nasalização contrastiva), diferenciação relativa à posição da consoante nasal na sílaba, se em onset ou coda silábica, respectivamente. A nasal de coda pode ou não se realizar foneticamente, como exemplificado em 3.a. e 3.b.
Já o EP, como exposto ao longo desta seção, não apresenta nasalização perceptível aos falantes. A nasalização detectada acusticamente em EP é automática ou mecanicamente motivada.
O que se destaca nos contextos de vogal+consoante nasal na mesma sílaba, em EP, é a realização de /n/ como (n) em final de palavra (perdón (peɾˈdon) ‘perdão’), ou como uma nasal homorgânica em ponto de articulação à obstruinte seguinte (confiar (koɱˈfjaɾ) ‘confiar’, encuesta (eŋˈkwesta) ‘inquérito, pesquisa’, hombre (ˈombɾe) ‘homem’, antes (ˈan̪t̪es) ‘antes’). Essa consoante pode ser velarizada ou até mesmo absorvida nessas mesmas posições em EC e outras variedades menos conservadoras de espanhol, com eventual nasalização da vogal (pienso(‘pjeŋso)~ (;‘pje͂so) ‘1ps verbo pensar’, pan (ˈpaŋ) ‘pão’).
Controlando a percepção em três condições, realizadas em não palavras - vogal oral (gus)-(gos)), vogal nasal contextual (gu͂ns)go͂ns)), vogal nasal não-contextual (gu͂s)-((go͂s)) -, Goodin-Mayeda (2011, 2016) verifica que os falantes nativos de PB percebem acuradamente a altura de vogais nasais contextuais e não contextuais. Já os falantes nativos de EP, contrariamente, não conseguem perceber corretamente a altura de vogais nesses contextos: interpretam o efeito coarticulatório da nasalização como uma diferença de altura vocálica. O mesmo ocorre com os falantes de EC, o que leva a autora a concluir que, apesar de a vogal poder ser nasalizada no ambiente de velarização variável em EC, a nasalização não é perceptualmente relevante, e a abertura velar, não tão significativa quanto é em PB.
A revisão de estudos de produção e percepção da nasalidade vocálica na comparação de EP com inglês americano e de EP com EC e PB mostra a singularidade do português em relação às outras línguas: a nasalidade é mais extrema em PB, a percepção da nasalidade vocálica e da altura das vogais nasalizadas é mais acurada em PB, tanto em contextos de vogal nasal contextual quanto não contextual. “These results support that in both nasal contexts, BP listeners were able to perceptually ‘undo’ the effects of nasalization in order to accurately assess the height of the vowel”. conclui Goodin-Mayeda (2016: 83).
Os falantes de PB operam com regras ou restrições que geram as formas nasalizadas. Se as formas de input são sequências de vogal+consoante nasal, como acredita boa parte dos estudiosos da nasalização em português (seção 2), supõe-se que os falantes nativos de PB sejam capazes de perceber a qualidade (altura) da vogal nasalizada, a nasalidade derivada da consoante nasal e, por implicação, de reconhecer a presença da nasal de base. É o que testam Guimarães e Nevins (2013) com jogos de linguagem, em um estudo envolvendo vogais nasais em sílaba final de vocábulo, como nas formas em 2.b (alecrim, refém, batom, atum, maçã). Os autores fornecem aos participantes conjuntos de palavras, com e sem vogal nasal, e solicitam a eles, numa primeira etapa, que troquem toda e qualquer vogal pela vogal (o).
Numa segunda etapa, solicitam aos participantes manter as vogais e apagar todas os segmentos de fim de sílaba (codas). O objetivo dos autores é obter evidências de que a representação subjacente de vogais nasais seja bissegmental (interpretação /vN/ de Câmara Jr. 1970). Verificam, na troca da vogal final de uma forma como maçã por (o), que essa se realiza sem um apêndice nasal. Já nas formas com as demais vogais, a troca por (o) vem acompanhada do apêndice nasal. Retiradas as codas, a vogal /a/ ainda mantém a nasalidade (ou ao menos mantém-se elevada, pelo que se depreende do símbolo fonético empregado em seu registro), as demais vogais, não. Esses resultados levam os autores a confirmar a hipótese bissegmental12 em sequências com as vogais /i, u, e, o/, mas não em sequências com /a/.
Embora Guimarães e Nevins (2013) partam de um exame muito preliminar de dados, referentes a uma única posição das sílabas com vogais nasais na palavra, exame esse ainda não completamente realizado em termos acústico-perceptuais, tampouco integrado a outros fatos da nasalidade do português (vogais nasalizadas e ditongos nasais), chama atenção o comportamento distinto de /a/ em relação à nasalidade. Por que /a/ nasal de formas como maçã exibiu comportamento distinto ao ser manipulado pelos participantes nos jogos de linguagem?
É importante considerar, como faz Goodin-Mayeda (2016) baseando-se em Dupoux et al. (2011), que vogais nasais resultam de coarticulação e que a categorização perceptual de segmentos coarticulados (com base em pistas fonético-acústicas) é computada com base não só na representação subjacente das palavras, mas também na distribuição de superfície dos segmentos e nas probabilidades fonotáticas específicas de língua. Somos, então, tentados a pensar que a experiência dos falantes de PB com nasalidade em formas como maçã leve-os à categorização perceptual motivadora do comportamento distinto em jogos de linguagem como os de Guimarães e Nevins (2013).
Abaurre e Sandalo (2008) afirmam que, no PB de São Paulo, em termos de produção, a realização de uma coda nasal velar em formas como fã (ˈfǝ͂ŋ) só se verifica em caso de ênfase. Já na variedade de PB de que somos falantes nativos, o PB do Rio Grande do Sul, percebemos, de oitiva, variação no vernáculo entre (maˈsǝ͂ŋ), com apêndice nasal, e (maˈsǝ͂) ou (maˈsǝ), sem apêndice nasal, para maçã, por exemplo, não só em caso de ênfase. Ou seja, ‘ouvimos’ diferentes realizações de /a/ nasal em final de palavra, diante de pausa, com e sem apêndice nasal. A última realização, em específico, chama atenção em função de conter uma vogal que soa como um schwa (ǝ), mas em sílaba tônica, o que não é contemplado no inventário vocálico básico do português. Que vogal seria essa? É de fato oral (ou desnasalizada)? É, em termos de altura, a mesma vogal emitida quando nasalizada? Equivale à realização vocálica em formas emprestadas do inglês no português brasileiro como up, club, cuja altura não se pode atribuir a uma nasal? A inspeção acústica a seguir busca respostas para essas questões.
4. Inspeção acústica
4.1. Procedimentos metodológicos
Realizou-se uma inspeção acústica preliminar, de cunho qualitativo, de um conjunto de palavras que permitisse a comparação de realizações orais e nasalizadas de /a/. As palavras foram gravadas por um informante, homem de 24 anos, falante nativo de português brasileiro do Rio Grande do Sul, pesquisador da área de Linguística, com treinamento teórico-prático em fonética articulatória, altamente proficiente em inglês. As palavras com vogal /a/ nasal consideradas foram: maçã, Catan.13
A palavra Catan foi inserida na inspeção por, diferentemente de maçã, ser grafada com consoante final, para verificar se a diferença ortográfica teria efeito sobre a realização fonética em questão. Inicialmente, o informante foi instruído a produzir as formas Catan e maçã como seu costume, o que resultou na emissão elevada oral (sem nasalidade na vogal e sem apêndice nasal) da vogal /a/ nasal. O informante foi então instruído a produzir as formas com /a/ nasalizado + apêndice nasal. Finalmente, instruiu-se o informante a produzir /a/ nasalizado sem apêndice nasal, o que ele não conseguiu fazer. Por essa razão, não há nos dados inspecionados realizações de vogal /a/ nasalizada sem apêndice nasal.
Para controlar as emissões de /a/ em contexto não nasal, consideraram-se as palavras catar (verbo), com vogal /a/ oral baixa em sílaba tônica final; bug14, monossílabo emprestado do inglês de uso vernacular no português brasileiro, contendo vogal oral realizada em qualidade (altura) aparentemente equivalente à da vogal /a/ em contexto nasal; e bagre, com vogal /a/ oral baixa em sílaba tônica pré-final.
As palavras maçã e Catan foram inseridas em uma frase-veículo, “Digo palavra baixinho”15, e gravadas ora com vogal nasal mais apêndice nasal na coda da sílaba tônica, ora com vogal ‘elevada’ oral, sem o apêndice nasal em coda. Também na frase-veículo, a palavra catar foi gravada sem a marca de infinitivo, a palavra bug foi gravada com epêntese após a oclusiva velar vozeada, e a palavra bagre, com vogal final reduzida. A estrutura da frase-veículo garantiu que, durante a leitura na gravação, a palavra-alvo ganhasse proeminência.
O experimento contou com uma etapa de preparação, em que o participante leu todas as palavras-alvo três vezes, para então inseri-las na frase-veículo e efetivar a gravação. Cada frase-veículo foi lida três vezes na gravação. Utilizaram-se os dados da terceira leitura das frases, considerada de melhor qualidade para a análise qualitativa.
Os dados foram inspecionados com o software Praat (Boersma e Weenink 2018). As palavras foram segmentadas manualmente, e as medidas de F1, F2 e F3 foram extraídas, também manualmente, de porções centrais estáveis das emissões vocálicas sob investigação.16
4.2. Resultados
Os resultados obtidos estão apresentados nos espectrogramas (Figuras 1 2, 3, 4, 5, 6, 7) e na Tabela 3, que reúne as medições formânticas em Hertz (Hz) em valores médios.
A Figura 1 é um espectrograma da emissão da palavra maçã com vogal nasal mais apêndice nasal. O início da porção vocálica de interesse, (ǝ), difere do restante. É sua fase oral. A porção seguinte, (ǝ͂), corresponde à sua fase nasal. Na transição da porção oral para a porção nasal, F2 se dissipa. A terceira parte da produção corresponde à realização do apêndice nasal (N).
Na Figura 2, espectrograma da emissão de maçã sem apêndice nasal, observa-se que, diferentemente do que ocorre na emissão de maçã com o apêndice nasal (Figura 1), os formantes da vogal (ǝ) permanecem estáveis em toda a realização vocálica. Não há a presença de um murmúrio nasal ao final da emissão que possa ser perceptível no espectrograma.
Como na Figura 1, o espectrograma da Figura 3 permite identificar três fases na emissão vocálica. Novamente, F2 parece começar a se dissipar desde a transição da fase oral para a fase nasal.
O espectrograma na Figura 4, sem emissão do apêndice nasal, mostra que há estabilidade formântica em toda a emissão vocálica, como constatado antes na análise da emissão de maçã (Figura 2) sem apêndice nasal. Esse padrão difere daquele em que as palavras são emitidas com apêndice nasal (Figuras 1 e 3).
A inspeção confirma a suspeita de que, a despeito do diferente registro ortográfico das palavras maçã e Catan, as emissões vocálicas na sílaba tônica são equivalentes, seja o apêndice nasal emitido (Figuras 1 e 3) ou não (Figuras 2 e 4). A ‘história’ do item lexical (percurso diacrônico) tampouco tem peso sobre as realizações. O que importa é o contexto segmental presente na palavra e as possibilidades de realização.
Quanto à altura vocálica, é visível nos quatro espectrogramas (Figuras 1, 2, 3, 4) a similaridade no padrão do primeiro formante (F1).
Na comparação com os espectrogramas de /a/ tônico oral, como em cata(r) (Figura 5) e bagre (Figura 7), a seguir, o F1 da vogal tônica de maçã e Catan com ou sem apêndice nasal é relativamente mais baixo, isto é, a vogal é relativamente mais alta nos contextos de base nasal, seja o apêndice nasal realizado ou não.
O espectrograma na Figura 5, de /a/ tônico em contexto oral, mostra uma relativa estabilidade dos formantes, o que se atribui à ausência de nasalidade. Um aumento de F1 da vogal se percebe visualmente, o que indica, como se espera, que a vogal oral é mais baixa do que a nasal de maçã e Catan (Figuras 2 e 4).
No espectrograma da Figura 6, não há a dissipação de F2 exibida nas Figuras 1 e 3, de /a/ nasal (vogal mais apêndice nasal), o que se espera de uma emissão vocálica oral. O padrão formântico é similar ao de maçã e Catan sem apêndice nasal (Figuras 2 e 4), com F1 mais baixo do que o da emissão oral e baixa de /a/ (cata(r), Figura 5). A subida de F2 ao final da emissão deve-se à transição da vogal para a oclusiva velar vozeada.
O espectrograma da Figura 7 (bagre) mostra padrão constante dos formantes da vogal /a/ tônica oral, com transição para a oclusiva velar seguinte perceptível na subida de F2 ao final da emissão vocálica, transição que se vê também na Figura 6 (bug). Desconsiderando-se essa transição, o padrão formântico de /a/ tônico em bagre se assemelha ao de cata(r) (Figura 5) e representa as realizações de /a/ baixa oral. No entanto, difere do padrão de bug (Figura 6) em F1, que é mais alto, correspondendo a uma emissão relativamente mais alta da vogal.
Os espectrogramas nas Figuras 1 2, 3, 4, 5, 6 7 permitem visualizar similaridades e diferenças nos padrões formânticos das realizações vocálicas em questão. As medidas correspondentes a esses padrões estão reunidas na Tabela 3.
Índice (1): emissão da palavra com vogal nasal mais apêndice nasal
Índice (2): emissão da palavra com vogal oral, sem apêndice nasal
Fonte: Os autores
Dos valores médios da Tabela 3, enfatizam-se os de F1 e de F2. Os valores de F2 são todos bastante próximos, o que indica não haver grande diferença, nos dados analisados, no que diz respeito à anterioridade/posterioridade das vogais. Trata-se, em todos os casos, de vogais centralizadas nesse aspecto, com valor médio de 1441 Hz. Os valores de F1, contudo, são diferentes a depender da vogal inspecionada.
Na comparação de maçã (1) e maçã (2) , catan (1) e catan (2) , percebe-se que os valores de F1 para as vogais emitidas sem o apêndice nasal (formas de índice 2) são um pouco maiores. Contudo, esses valores são bastante inferiores ao valor de (a) em cata(r) , de 811 Hz, e em bagre , de 829 Hz. Vale dizer, tanto (ǝ͂) quanto (ǝ) são elevadas em relação a (a), mas a elevação é ligeiramente maior em (ǝ͂).
Na comparação de bug, com vogal de base não nasal mas elevada, e bagre, com /a/ oral, (ǝ) (bug) apresenta valores inferiores de F1, ou seja, é mais alta do que (a) (bagre).
Os resultados da inspeção qualitativa parecem apontar diferentes possibilidades de realização vocálica em palavras como maçã e Catan, uma das quais apresenta elevação, mas não necessariamente nasalidade. Essa emissão elevada e sem nasalidade em maçã e Catan parece ser quase a mesma realizada em bug.
4.3. Discussão
A inspeção acústica (dados de produção) confirmou variação nos outputs de /a/ nasal em final de palavra, entre uma emissão com vogal nasalizada/elevada+apêndice nasal e uma emissão com vogal elevada, sem nasalidade, tampouco apêndice nasal. Além disso, a inspeção mostrou que a emissão de (ǝ) não nasal em sílabas tônicas de empréstimos é possível em português. Esses resultados ajudam a responder a uma das perguntas de pesquisa, explicando por que falantes nativos de PB não recuperam a nasal de base em jogos de linguagem envolvendo percepção.
Se, como se constata na comparação com outras línguas (seção 3), a nasalização vocálica em PB não é mecânica ou fisiologicamente motivada, já que a língua distingue vogais orais de vogais nasais em termos contrastivos; e se, por essa razão, o falante-ouvinte de PB tem experiência para perceber acuradamente tanto a nasalidade quanto à modificação de altura vocálica resultante da nasalização (Goodin-Mayeda 2011, 2016), não deveria haver dificuldade de resgatar a base /aN/ em tarefas de percepção.
Se tal dificuldade existe, a motivação pode estar não no estatuto do processo de nasalização no PB, mas no fato de, como mostram os resultados de nossa inspeção acústica, haver mais de uma possibilidade de realização de /aN/ (vogal nasalizada/elevada+apêndice nasal e vogal elevada sem nasalidade nem apêndice nasal) e de, em termos de altura, a vogal resultante ser muito similar à vogal de empréstimos como bug, do inglês, em que não se identifica qualquer nasalidade. Ou seja, as pistas referentes à altura vocálica, usadas pelo falante-ouvinte para perceber os efeitos da nasalização, não são suficientemente exclusivas em PB, prejudicando o mapeamento de um para um das emissões de /a/ em contexto nasal com a representação bissegmental /aN/.17
A inspeção responde a outra pergunta da pesquisa, sobre a qualidade (altura) da vogal elevada/nasalizada (maçã (maˈsǝ͂ŋ)) e não nasalizada (maçã (maˈsǝ)): por que a altura é a mesma se a nasalidade não se manifesta? Hajek (1997: 22), sobre universais de mudança fônica referentes à nasalização, defende que “the phonologization of a contextual effect, in this case vowel nasalization, precedes and is independent of loss of the conditioning environment, N.” Mais adiante, no mesmo estudo, o autor afirma que “N-deletion will not normally be expected to occur unless phonologization of contextual vowel nasalization has already preceded it.” (Hajek 1997: 69).
As afirmações de Hajek (1997) permitem supor que a nasalidade de /aN/ em sílaba final de palavra já foi fonologizada. Nesse caso, se apagado o elemento nasal, a forma fica suscetível à desnasalização, não necessariamente ao abaixamento vocálico, talvez porque, em termos funcionais, a altura vocálica seja robusta o suficiente para garantir os contrastes existentes - o que explicaria, também, o fato de /a/ e não as outras vogais ser selecionada como alvo da desnasalização (as alterações de altura das demais vogais nasais não são tão grandes). Trata-se de suposições, apenas, que mereceriam ser testadas em estudos futuros, voltados à variação de /aN/ em sílaba final, à percepção das formas em variação, a aspectos acústicos que aprofundassem a inspeção qualitativa aqui feita.
Esses estudos poderiam contribuir para responder a uma questão correlata, a da evitação de vogais -ATR no output de vogais nasalizadas. Como se viu (seção 3) com base em Kingston (2007), tal evitação parece ser um parâmetro do português, língua que tende a dispersar vogais nasalizadas ‘para cima’ no espaço vocálico.
5. Conclusão
O estudo retomou a questão da representação das vogais nasais no português, com o que se justificou a adesão à hipótese da sequência /vN/ na base de /a/ nasal e se sustentou a interpretação da nasalização vocálica e da elevação da vogal nasalizada como processos fonologicamente derivados. Essa interpretação prevê e explica as realizações coarticulatórias verificadas em análises fonético-acústicas e perceptuais.
A revisão de literatura (Goodin-Mayeda 2011, 2016) comparando português e espanhol - línguas aparentadas, com um inventário segmental similar, mas distintas quanto à nasalização (‘mecânica’ em espanhol, fonológica em português) - mostrou que a experiência diferenciada dos falantes com esse processo tem efeito sobre sua capacidade de perceber acuradamente os segmentos envolvidos na coarticulação de vogal e consoante nasal: maior para o falante de português, menor para o falante de espanhol.
Dada essa capacidade, é de se esperar que o falante-ouvinte de português mapeie qualquer realização de vogal nasal à sequência /vN/ de base. A dificuldade de o falante-ouvinte fazer esse mapeamento na realização de /a/ nasal, como registrado na literatura (Guimarães e Nevins 2013), sugere que padrões fonéticos estejam obscurecendo a acurada percepção dos efeitos da nasalização.
A inspeção acústica realizada, mesmo que qualitativa e de caráter preliminar, confirmou que o padrão formântico característico de vogal /a/ nasalizada, com valores de F1 mais baixos, pode não vir acompanhado de qualquer pista acústica de nasalidade, o que diminui a capacidade de identificar a nasalidade e atribuí-la a um segmento nasal seguinte.
Esclarecer o padrão de desnasalização variável da vogal elevada, realizar análise acústica e perceptual das variantes verificadas, relacionar o constatado em sílaba final a outras posições na palavra são desenvolvimentos esperados deste estudo.