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Lingüística

versión On-line ISSN 2079-312X

Lingüística vol.30 no.2 Montevideo dic. 2014

 

Lingüística / Vol. 30 (2), Diciembre 2014: 141-170

ISSN 1132-0214 impresa

ISSN 2079-312X en línea

 

 

DA DESCRIÇÃO AO ENSINO DA ORAÇÃO ADJETIVA: A PERSPECTIVA DOS LIVROS DIDÁTICOS DE LÍNGUA PORTUGUESA

 

FROM DESCRIPTION TO TEACHING OF RELATIVE CLAUSES: THE PERSPECTIVE OF TEXT BOOKS IN PORTUGUESE

 

 

Erotilde Goreti Pezatti

Universidade Estadual Paulista - São José do Rio Preto

pezatti@ibilce.unesp.br

 

Aliana Lopes Câmara

Universidade Estadual Paulista - São José do Rio Preto

aliana.precioso@gmail.com

 

O objetivo deste trabalho é analisar o tratamento dado à oração adjetiva pelos livros didáticos do nível fundamental, verificando como é implementada a proposta de ensino de gramática contida nos manuais do professor. Como consequência, pretende-se também relacionar alguns aspectos importantes a serem considerados no ensino da oração adjetiva. Para isso, foram selecionados cinco livros didáticos aprovados no Programa Nacional do Livro Didático-2014, que serviram de base para a análise da proposta de ensino, referente aos critérios de definição e de distinção entre oração adjetiva restritiva e explicativa. Os resultados mostram que o ensino de oração adjetiva ainda reflete os postulados da gramática tradicional e se baseia em atividades de identificação e classificação das unidades morfossintáticas, desconsiderando aspectos pragmáticos e prosódicos.

 

Palavras-chave: ensino de gramática, oração adjetiva, funcionalismo, livro didático

 

This paper aims at investigating the treatment given to relative clauses by elementary school text books, evidencing how the teaching of grammar is proposed in the teacher’s books. As a consequence, this study also intends to discuss important aspects to be considered as far as the teaching of relative clauses is concerned.  In order to achieve that objective, five Portuguese text books (approved by the Programa Nacional do Livro Didático-2014) were selected so that the grammar teaching proposals could be analyzed in relation to the definition and to the distinguishing criteria between defining and non-defining relative clauses. Results show that the teaching of relative clauses (as proposed by the teacher’s books) still reflects the postulates of the traditional grammar, based on activities of identification and classification of morphosyntactic units, ignoring the pragmatic and prosodic aspects.  

 

Keywords: grammar teaching, relative clause, functionalism, text book

 

 

1.                  Palavras iniciais

 

Um dos principais pressupostos do ensino de português no guia de livros didáticos PNLD[1] é que a gramática não é um saber em si mesmo, desvinculado do ensino de leitura e escrita; ao contrário, o ensino de gramática deve necessariamente partir do texto e para a compreensão de seus sentidos e de sua estruturação. A ideia de que o ensino de gramática é fundamental, se não indispensável, ao desenvolvimento das competências leitora e escritora transparece tempo nos discursos dos professores, da mídia e de documentos oficiais que regulamentam o ensino em nosso país.

Neves (1993: 93), há mais de duas décadas, observa que os professores acreditam que o ensino da gramática deve levar a escrever melhor, mas admitem que, de fato, isso não ocorre. Acreditamos que essa constatação feita pelos professores na pesquisa de Neves ainda tem reflexos no imaginário dos professores atualmente. Apesar de se defender que o ensino de gramática seja atrelado ao de leitura e escrita, como uma forma inclusive de se justificar o próprio ensino de gramática, exames nacionais e internacionais têm apontado o fracasso no desenvolvimento da habilidade leitora e escritora nos alunos. Pensamos que isso se deve, em grande medida, à ideia de gramática que permeia na escola, o da gramática normativa, definida como normas que regulam o uso correto da língua. De fato, está claro que o ensino dessa gramática idealizada e descontextualizada não auxilia de forma alguma no desenvolvimento das habilidades de leitura e escrita (cf. Bagno 2007: 194).

Na contramão desses fatos, encontram-se as inovações no ensino de português advindas de pesquisas em diversas áreas, como a sociolinguística, a linguística textual, a análise do discurso, a linguística funcional, entre outras, que se mostram muito produtivas e interessantes para o ensino. Essas teorias, que propõem a análise da língua para além do nível oracional, fazem com que diversos gêneros textuais invadam a sala de aula e passem a ser objeto do ensino de língua portuguesa. Neste artigo, propõe-se uma investigação sobre como o livro didático relaciona o ensino de gramática com a diversidade textual das seções de leitura. Há de fato um ensino de gramática contextualizado ou o texto serve apenas como pretexto para um ensino tradicional de gramática?

Neves (2002: 230-2) defende a necessidade de se trazer as descobertas dos estudos linguísticos para o ensino de gramática, mas adverte que, se isso não for efetuado de forma adequada, pode não trazer bons resultados. Um equívoco recorrente, segundo a autora, é munir os professores de conceitos teóricos, sem, porém, levá-los a refletir sobre o que pode e deve ser aproveitado em sala de aula, provocando muitas vezes a aplicação dos conceitos de maneira insensata e infrutífera. Um exemplo disso é o que ocorreu após o advento da teoria gerativa, quando diversas “árvores” foram inseridas nos livros didáticos, sem que com isso houvesse qualquer melhoria no ensino.

Nesse contexto, podemos afirmar que resta ao professor de língua portuguesa apenas três caminhos a serem seguidos: (i) abolir completamente a gramática das aulas de português; (ii) continuar repetindo as tradicionais práticas de ensino que consistem, basicamente, em identificação, classificação e memorização de conceitos gramaticais (em especial, da morfologia e da sintaxe); e (iii) trazer para a sala de aula as novas descobertas da linguística, sem fazer muita reflexão sobre o quê e como essa aplicação será realizada. Nenhum deles nos parece suficientemente adequado ao ensino de língua portuguesa. Este artigo pretende apontar um caminho mais adequado, propondo um ensino de gramática a partir da compreensão das estruturas linguísticas em seu uso, na construção do discurso, ou seja, partindo das intenções comunicativas do faltante/escritor.

Segundo Travaglia (2011: 14-5), o ensino de gramática deve ter como objetivo principal desenvolver a competência comunicativa do aluno, possibilitando-lhe a reflexão sobre os diversos mecanismos linguísticos disponíveis na língua, que podem e devem ser mobilizados adequadamente pelo aluno, na compreensão e produção de textos, nas mais diversas situações de comunicação a que ele é exposto. Para o autor, desenvolver a competência comunicativa do aluno contribui para melhorar sua qualidade de vida, pois ele será capaz de depreender os significados e efeitos de sentido que os outros lhe propõem na interação e ele próprio será capaz de expressar os sentidos que deseja, de acordo com os objetivos que pretende alcançar, já que:

 

a boa comunicação garante não só a qualidade de vida em uma sociedade, mas a própria vida, a própria existência da humanidade enquanto tal, tanto no sentido de “ser humano” em oposição ao “não ser humano”, quanto no sentido da própria existência das entidades que compõem a humanidade, uma vez que o não entendimento pode levar a problemas, conflitos e, em consequência, à própria extinção do homem, da humanidade. (Travaglia 2011: 25)

 

Com o intuito de contribuir para a escolha de um caminho adequado para o ensino da língua portuguesa, esse artigo discute alguns aspectos, especificamente relacionados à oração adjetiva, mostrando que estão envolvidos não só aspectos morfossintáticos e semânticos, mas também pragmáticos e fonológicos, que, se desconsiderados, levam a uma compreensão inadequada dessa estrutura. A justificativa dessa pesquisa ecoa nas palavras de Neves:

 

Essa aplicação da ciência linguística à atuação escolar há de servir a ambas as partes: assim como é a circulação da teoria linguística que há de renovar o tratamento escolar da linguagem, da língua, da gramática, assim também uma renovação efetiva desse tratamento há de realimentar discussões teóricas que com felicidade se apliquem à condução escolar da reflexão sobre a linguagem (Neves 2011: 25).

 

O objetivo deste trabalho é analisar o tratamento da oração adjetiva nos livros didáticos, verificando se eles concretizam a proposta de ensino de gramática declarada nos manuais do professor. Como consequência, pretende-se também relacionar alguns aspectos importantes a serem considerados no ensino da oração adjetiva. Para isso, analisam-se cinco livros didáticos de língua portuguesa, aprovados no PNLD 2014, conforme elencados a seguir:

 






 

A escolha dessas coleções fundamenta-se na proposta apresentada nos manuais para o professor de cada uma delas. Subjaz a elas, a ideia de que a atividade linguística ocorre necessariamente entre interlocutores em uma dada situação discursiva, ou seja, a língua é um instrumento de interação social, uma vez que o homem é um ser social e histórico que se constitui nas e pelas relações com os outros, que ocorrem em certo tempo e espaço (Manual do Professor – Figueiredo et al. 2012: 5). Os manuais mostram-se contrários a um ensino de gramática descontextualizado e baseado em sentenças criadas ou fragmentadas, que visam apenas a classificações e nomenclaturas. Essas obras propõem também a reflexão sobre a diversidade linguística brasileira, em função do combate ao preconceito linguístico, não desconsiderando, no entanto, o ensino das variedades mais prestigiadas, já que elas são usadas em situações públicas mais formais. A gramática é vista como um instrumento que auxilia o aluno a ler e escrever melhor. Assim privilegia-se a relação entre gramática-leitura-escrita, devendo os mecanismos linguísticos ser estudados no texto, em situações autênticas de comunicação.

É possível perceber nas coleções analisadas certa preocupação em inserir a proposta de material didático-pedagógico nas novas discussões teóricas sobre o ensino de língua, ao incorporar “alguns conceitos em geral não discutidos em gramáticas normativas e ausentes da nomenclatura gramatical oficial”, tais como enunciação, modalização, coesão e coerência, visando a “auxiliar e enriquecer o trabalho de compreensão e de produção de textos” (Manual do professor – Faraco e Moura 2012: 19-20). Isso não se observa, no entanto, na coleção PB que, contrariamente à própria proposta de ensinar as normas urbanas de prestígio e de se considerar a linguagem em situações de interação, adota uma “abordagem tradicional de gramática”, justificando sua escolha no fato de essa abordagem ser um “patrimônio de conhecimentos” para os alunos e para os professores (Manual do professor – Horta e Menna 2012: 5). Já a coleção SP adota uma postura dupla ao trabalhar com os conhecimentos linguísticos em duas seções: uma destinada à reflexão sobre a natureza da língua como forma de interação entre os indivíduos, considerando-se as situações de comunicação e as intenções dos interlocutores, e outra destinada a apresentar as classificações gramaticais, as nomenclaturas e as regras da gramática normativa.

O texto encontra-se estruturado da seguinte forma: a seção 2 descreve a proposta de ensino da oração adjetiva e do pronome relativo nos LD; na seção 3, apresentam-se as propriedades pragmáticas, semânticas, morfossintáticas e fonológicas da oração adjetiva, segundo o modelo teórico da Gramática Discursivo-Funcional (doravante GDF). Na última seção, por sua vez, contrastam-se os resultados encontrados nas seções 2 e 3 e apresentam-se algumas sugestões para o ensino da oração adjetiva.

 

 

2.                  A oração adjetiva nos livros didáticos

 

Todos os livros analisados partem de uma breve reflexão, mobilizada por meio de uma pergunta, sobre um exemplo de oração adjetiva, extraído de um texto. Tal reflexão consiste ou na substituição da oração adjetiva por um adjetivo (SP, VS e PB), ou na identificação das orações que caracterizam o substantivo (UN e PH). Dessa forma, parte-se de um conhecimento prévio do aluno sobre o tópico gramatical adjetivo para a apresentação da oração adjetiva. Fica claro, portanto, que a introdução do conceito de oração adjetiva não se relaciona ao seu funcionamento no texto do qual é extraída. Juntamente com essa breve reflexão, apresentam-se várias questões sobre identificação e classificação da oração subordinada, da oração principal e dos antecedentes. Mais uma vez, portanto, exploram-se apenas aspectos morfossintáticos da oração adjetiva, desprezando-se os sentidos advindos de seu uso. Tal proposta é exemplificada, a seguir, por uma atividade do livro VS (Tavares e Brugnerotto 2012: 116).

 

1 Releia a fala do cientista no 1º quadrinho. Atente para as orações em destaque.

O conselho decidiu que terá de ser você, Bárbara, a resolver a situação que você criou...

 

a) Quantas orações há no trecho em destaque?

b) Quais são as funções do que e como ele é classificado?

c) A oração que você criou pode ser substituída por qual dos termos a seguir? Reescreva o trecho, substituindo a oração pela expressão adequada.

Adequada – inventada – criada

d) Qual é a classe morfológica do termo pelo qual a oração foi substituída?

e) Qual é a função da oração que você criou no contexto em que foi empregada na HQ?

 

Observa-se que todas as perguntas exigem que o aluno mobilize conhecimentos sobre análise morfossintática do período composto, ora identificando e classificando o referente, ora identificando as orações. Há uma pressuposta equivalência semântica entre oração adjetiva e adjetivo (função caracterizadora), que é abordada por alguns dos LD na apresentação do conceito de oração adjetiva.

Na sequência, os LD fazem a sistematização do conceito e exemplificação, com sentenças criadas, normalmente em boxes destacados por cores diferentes. As orações subordinadas adjetivas são definidas nos LD como (i) subordinadas, porque dependem sintaticamente da oração principal, (ii) adjetivas, porque exercem função de um adjetivo; (iii) caracterizando, descrevendo, especificando, esclarecendo o antecedente; e (iv) sendo introduzidas por pronome relativo. Por função de adjetivo ora se entende função sintática (adjunto adnominal de um nome) ora função semântica (caracterização de seres). Não há, portanto, um consenso entre os autores sobre o termo função. Observa-se que a pergunta em (1e) não deixa claro se questiona a função sintática ou semântica da oração subordinada. Depois de apresentada a definição de oração adjetiva, são propostos exercícios que consistem na identificação das orações adjetivas, como exemplificado a seguir (Faraco e Moura 2012: 68).

 

2 Copie no caderno as orações subordinadas adjetivas das frases a seguir.

 

- Os jogadores que não participaram do jogo fizeram um treino tático.

- A casa onde nasci não existe mais.

- Este é o meu primo do qual lhe falei.

- “As aves que aqui gorjeiam não gorjeiam como lá” (“Canção do Exílio”, Gonçalves Dias)

 

Na apresentação da distinção entre oração adjetiva restritiva e explicativa, é também seguido o mesmo percurso: breve reflexão à conceito à atividades. A distinção é realizada de duas formas. Os livros PB e PH as distinguem pela possibilidade de omissão da oração explicativa, que deve vir destacada da oração principal por vírgulas. O aluno é levado a perceber que, diferentemente da oração adjetiva restritiva, ao omitir a oração explicativa, o período ainda fica com sentido completo. Já os livros VS, UN e SP levam o aluno à reflexão sobre a diferença de sentido entre elas. Enquanto a restritiva particulariza o termo, a explicativa acrescenta uma informação adicional. Percebe-se, assim, que, na distinção entre restritiva e explicativa, predominam critérios semânticos distintivos de ambas as construções e que se relacionam à dispensabilidade da segunda para a construção do sentido da sentença.  Após essa reflexão, parte-se para a sistematização do conceito. A oração adjetiva restritiva (i) é essencial ao sentido e à estrutura do enunciado; (ii) não é separada por vírgulas; e (iii) restringe, delimita, especifica o sentido de um termo. A oração adjetiva explicativa, por sua vez, (i) explica um termo antecedente, acrescentando-lhe informação adicional; (ii) não é essencial ao sentido do enunciado; (iii) vem entre vírgulas; e (iv) assemelha-se ao aposto. Na sequência, os LD apresentam atividades de classificação e identificação da oração adjetiva restritiva e explicativa; colocação de vírgulas em textos com orações explicativas; reescrita de dois períodos simples em um composto por subordinação, usando-se pronome relativo. A atividade reproduzida a seguir foi extraída do livro SP (Figueiredo et al. 2012: 237-8) e ilustra a preocupação dos LD com aspectos classificatórios da oração adjetiva.

 

3 Leia a tira.

 


 

a) O período “Não detestam aquelas migalhas que ficam boiando no café...” no primeiro quadrinho é composto por subordinação. Qual é a oração principal e qual é a subordinada?

b) A oração subordinada refere-se a qual termo da oração principal?

c) Essa oração restringe ou explica o termo ao qual se refere? Explique.

d) Dê a classificação dessa oração subordinada.

 

No que tange ao tratamento dos pronomes relativos, os LD normalmente se limitam a definir essa classe gramatical e a elencar os vários pronomes existentes na língua portuguesa e suas particularidades. O estudo do pronome relativo pode ocorrer antes ou junto com o da oração adjetiva. Nos LD, a definição de pronome relativo repete a definição tradicional de conferir-lhe um duplo papel: ao mesmo tempo em que substitui um termo da oração anterior, também estabelece uma ligação entre duas orações. Os pronomes relativos elencados nos LD são: que, o qual, onde, cujo, quem, quando, quanto e como e suas particularidades dizem respeito à possibilidade de admitir preposição, à categoria animado ou inanimado do referente e à obrigatoriedade de concordância com o antecedente.

A análise demonstrou que menos da metade dos LD apresentam um tratamento mais detalhado dos pronomes relativos, pois a maioria dos manuais limita-se a defini-los, a elencá-los e a afirmar que os pronomes relativos iniciam a oração adjetiva. Quando o fazem, o mecanismo adotado para o ensino dos pronomes relativos assemelha-se ao da oração adjetiva, ou seja, partem de uma breve reflexão para posterior sistematização. Mais uma vez, a reflexão inicial sobre o pronome relativo, refere-se basicamente a aspectos morfossintáticos, pedindo a identificação das orações principal e subordinada. Os LD normalmente propõem que se identifique o antecedente sem levar a nenhuma reflexão sobre o papel coesivo dos pronomes relativos.

Nas atividades referentes ao pronome relativo, é comum pedir ao aluno que una dois períodos simples em um período composto ou que transforme um período composto por oração adjetiva em dois outros períodos simples, sem nenhuma reflexão sobre a diferença entre as duas estratégias, como na atividade abaixo do livro PH (Faraco e Moura 2012: 72).

 

4 Agora reescreva os pares de orações a seguir, ligando cada par com o pronome relativo  que achar mais adequado:

 

a) Ele nos apresentará um amigo. Ela sempre falou dele.

b) Enviei-lhe uma carta. Essa carta continha informações importantes.

c) É uma associação de defesa do meio ambiente. A ação dessa associação é exemplar.

 

Esse tipo de atividade é uma ótima oportunidade para mostrar o mecanismo coesivo dos pronomes, o que seria muito relevante para promover uma reflexão sobre a função dos pronomes no texto. É claro que isso só seria possível em sentenças contextualizadas, diferentemente das que normalmente aparecem nesse tipo de atividade.

A análise dos cinco LD permite-nos observar o que segue.

De maneira geral, tentam apresentar a oração adjetiva a partir de um ensino indutivo, que parte da reflexão sobre os fatos linguísticos para posterior elaboração do conceito. Verifica-se que normalmente essa reflexão é feita muito rapidamente e apenas sobre um dos aspectos da oração adjetiva, enquanto o conceito é detalhadamente apresentado e ganha um espaço maior na obra. Assim, prioriza-se um ensino essencialmente transmissivo, que consiste na apresentação dos aspectos morfossintáticos e semânticos da oração adjetiva, normalmente desconectada de qualquer reflexão sobre o uso dessas construções no texto, o que contraria a proposta apresentada no manual do professor de promover um ensino indutivo de gramática. Verifica-se, portanto, que, ao priorizar essencialmente a identificação e a classificação da oração adjetiva, os LD analisados não fogem da postura tradicional de ensinar gramática.

Outro ponto observado é que, apesar de os LD afirmarem, nos manuais para o professor, sua preocupação em ensinar gramática no texto, as orações que servem para reflexão e definição do conceito são, de modo geral, construídas pelos autores. Quando, por outro lado, os exemplos são extraídos de textos, não há um trabalho para mostrar o papel da oração no contexto de onde foi retirada. Na verdade, o texto é usado apenas como pretexto para o ensino de gramática, pois, ao ser extraída, a sentença ganha autonomia e é tratada isoladamente sem nenhuma reflexão sobre seu papel na construção dos sentidos do texto e na efetivação das intenções comunicativas do falante.

Além disso, ao relacionarem o uso da vírgula para distinguir a oração adjetiva restritiva da explicativa, os LD levam os alunos a equivocadamente identificarem a língua com a modalidade escrita, pois não deixam claro que a presença/ausência de vírgula na escrita é consequência da escolha do falante, da sua intenção comunicativa de construir uma restritiva ou uma explicativa. Essa concepção errônea de língua, infelizmente, é muito corrente nos alunos do nível fundamental.

A análise dos LD revela ainda que o que as coleções propõem no manual do professor raramente se cumpre nas atividades apresentadas no livro do aluno.

A próxima seção apresenta a oração adjetiva sob a perspectiva da Gramática Discursivo-Funcional, que leva em consideração os aspectos pragmáticos, semânticos, morfossintáticos e fonológicos.

 

 

3.                  Descrição discursivo-funcional da oração adjetiva

 

A GDF é uma teoria funcionalista que concebe o componente gramatical como inserido em uma modelo de interação verbal que abarca também os componentes conceitual, contextual e de saída. Nessa teoria, a estrutura da gramática reflete o processamento linguístico real do indivíduo, o que implica numa organização hierárquica e descendente de quatro níveis: interpessoal, representacional, morfossintático e fonológico. Essa organização reflete um ponto-de-vista funcionalista que preconiza uma relação de prioridade entre os níveis na seguinte direção: o nível interpessoal governa o semântico, ambos governam o morfossintático, e os três governam o fonológico.

O Nível Interpessoal compreende “todos os aspectos formais de uma unidade linguística que se refletem na interação entre Falante e Ouvinte” (Hengeveld e Mackenzie 2008: 46), já que as mensagens são produzidas considerando-se as expectativas que o Falante tem com relação ao conhecimento pragmático do Ouvinte. O Nível Interpessoal apresenta uma estrutura hierárquica, cuja camada mais alta, o Movimento, é composta por um (ou mais) Ato Discursivo. O Ato se organiza em torno de um esquema Ilocucionário, que indica a finalidade de um ato verbal, envolve os Participantes, representativos da díade essencial Falante-Ouvinte, e contém o Conteúdo Comunicado, a totalidade do que o Falante deseja evocar na sua comunicação com o Ouvinte. O Conteúdo Comunicado é constituído de um ou mais Subatos, que, por sua vez, expressam tentativas do Falante de evocar uma propriedade ou um referente. É nesse nível que se atribuem funções pragmáticas a Subatos ou ao Conteúdo Comunicado como um todo.

Interessa-nos aqui a função pragmática Tópico, que assinala como o Conteúdo Comunicado se relaciona ao registro construído gradualmente no Contexto (Hengeveld e Mackenzie 2008: 92). O Falante, ao atribuir a função Tópico a um Subato, assinala ao Ouvinte que a informação, já compartilhada, serve como suporte para outras informações, ou seja, o Tópico é a perspectiva a partir da qual o Falante elabora sua mensagem. As informações disponíveis no Contexto são ativadas como Subatos, que podem receber a função Tópico. Segundo Hengeveld e Mackenzie (2008: 92), as línguas dispõem de propriedades formais específicas para marcar a função pragmática Tópico.

Pezzatti (2014) considera que, em português, a função Tópico é marcada pela posição na oração, ou seja, o constituinte Tópico ocupa sempre a posição inicial da oração, denominada PI

 

Uma vez que se relaciona ao Contexto Situacional e Discursivo, o Tópico é responsável pela progressão temática do texto e contribui para a coesão textual. Segundo Connoly (2007: 13), o contexto apresenta um caráter mutável: conforme o discurso prossegue, o contexto também muda, e vice-versa, pois cada sentença vai ser produzida/interpretada no contexto do que já foi dito até aquele momento e será acrescentada ao contexto em que serão produzidas novas sentenças. As sentenças já presentes no contexto são informações dadas, as que entram no contexto são informações novas. Devido a limitações da memória, algumas informações presentes no Contexto caem no esquecimento dos falantes. Esse processo dinâmico de acréscimo de informações ao Contexto é visto de maneira metafórica, na GDF, como uma pilha em que as informações novas são inseridas no topo, levando as outras informações para uma posição mais baixa na pilha e, consequentemente, as últimas informações caem no esquecimento (Hengeveld e Mackenzie no prelo).


O Nível Representacional é responsável pelos aspectos semânticos de unidades lexicais e de unidades complexas, independentemente da maneira como são usadas na comunicação. A unidade mais alta deste nível é o Conteúdo Proposicional (conhecimentos, crenças e desejos), seguido pelo Episódio (combinação de Estados-de-Coisas com unidade ou continuidade de tempo, espaço e Indivíduos). O Estado-de-Coisas, por sua vez, constitui uma entidade que pode ser localizada no tempo e no espaço e avaliada em termos de sua realidade. Essa entidade é constituída por uma Propriedade Configuracional, que contém uma combinação de unidades semânticas sem relação hierárquica entre si: Indivíduos, Locação, Tempo, Modo, Razão e Quantidade.

O Nível Morfossintático recebe o input dos níveis Interpessoal e Representacional e representa-o estruturalmente. A camada mais alta, no nível Morfossintático, é a Expressão Linguística, que é constituída de, pelo menos, uma unidade, que pode ser usada independentemente, seja Oração seja Sintagma.

O papel do Nível Fonológico é converter essas estruturas morfossintáticas em construtos fonológicos. A camada mais alta é o Enunciado, que é composto de uma (ou mais) Frase Entonacional, constituída por uma (ou mais) Frase Fonológica, que contém uma (ou mais) Palavra Fonológica, que, por sua vez, é composta de um (ou mais) Pé, formado por pelo menos uma Sílaba.

Dentro desse arcabouço teórico, Camacho (2012, 2013) e Precioso (2013) apresentam uma descrição da oração adjetiva, considerando a formulação pragmática e semântica e sua codificação morfossintática e fonológica. Diferentemente do que se propõe nos LD, a distinção entre explicativa e restritiva não se define apenas por critérios semânticos (explicar vs. restringir). Pelo contrário, enquanto a oração explicativa é formulada pragmaticamente, a oração restritiva é formulada semanticamente. Assim, a oração explicativa em (5) é formulada como um Ato Discursivo, que fornece uma informação de fundo sobre o núcleo nominal. É, portanto, um Ato subsidiário que modifica o Ato nuclear (os dinossauros continuam exercendo fascínio nas pessoas), o que o caracteriza com a função retórica Aposição (Aside). As funções retóricas refletem o modo de ordenação dos componentes de um discurso para a realização da estratégia comunicativa do Falante de levar o Ouvinte a aceitar seus propósitos comunicativos.

 

5 Os dinossauros, que viveram há milhões de anos na Terra, continuam exercendo fascínio nas pessoas. (extraído de VS, 2012: 116)

 

O estatuto de Ato Discursivo da oração adjetiva explicativa pode ser comprovado pelo contorno entonacional próprio, que independe do da oração principal, conforme a sentença reformulada em (5’); e também pelo fato de permitir modificadores do Nível Interpessoal, como em (5”):

 

5’ Os dinossauros, que viveram há milhões de anos na Terra, continuam exercendo fascínio nas pessoas?

 

5’’  Os dinossauros, que viveram há milhões de anos na Terra pô!, continuam exercendo fascínio nas pessoas.

 

Em (5’), a ilocução interrogativa atinge apenas a oração principal (os dinossauros continuam exercendo fascínio nas pessoas?), pois a oração adjetiva continua com ilocução declarativa (os dinossauros viveram há milhões de anos na Terra). Já em (5”), pô! é um modificador enfático de Ato Discursivo. Esse tipo de modificador só pode ocorrer com oração adjetiva explicativa, jamais se aplicando a uma adjetiva restritiva, que pertence ao Nível Representacional.

Por outro lado, a oração restritiva em (6), modifica o núcleo nominal os dois carros, levando o Ouvinte a formular uma imagem adequada do referente, identificando-o dentro de um conjunto infinito de referentes possíveis (cf. Dik 1997); nesse caso, dentre todos os carros que estão na vitrine. Diferentemente da explicativa, a oração adjetiva restritiva não tem um contorno entonacional próprio e consequentemente não apresenta uma ilocução. Em outras palavras, não constitui por si só um Ato Discursivo, ao contrário, modifica o núcleo do sintagma nominal a que pertence e com o qual forma uma Frase Entonacional.

 

6 Os dois carros que estavam na vitrine eram de um modelo novíssimo (PB, 2012, p.96)

 

Essas diferenças na formulação, no entanto, não acarretam diferenças na codificação morfossintática, ou seja, tanto a oração adjetiva restritiva como a explicativa têm padrão morfossintático idêntico: um sintagma nominal recruta, por meio da recursividade, um molde oracional, formando uma estrutura complexa. A diferença na formulação das orações adjetivas é mapeada exclusivamente na representação fonológica. Conforme observa Câmara (inédito), a oração adjetiva explicativa, por apresentar um contorno entoacional próprio, constitui uma Frase Entoacional, claramente marcada na fala por mudança na tessitura, o que não se verifica na oração adjetiva restritiva. Essa diferença prosódica é então assinalada, na modalidade escrita, pelo uso de vírgulas, na oração adjetiva explicativa, e por sua ausência, na oração adjetiva restritiva.

 

 

4.                  Contribuições para o ensino

 

Há tempos se aponta o perigo de aplicar teorias linguísticas diretamente (e sem reflexão) ao ensino, o que pode levar os professores ao fracasso e à descrença quanto à necessidade de unir a prática aos resultados de importantes pesquisas na área da linguística. O ponto de vista aqui adotado é que o objetivo principal da escola não é ensinar teoria(s) linguística(s), mas sim tornar os alunos competentes no uso da língua nas mais diferentes situações, e no manejo adequado das modalidades falada e escrita.  O que se propõe é o trabalho com a descrição e a reflexão sobre os fatos linguísticos, para que o aluno desenvolva sua criatividade no uso adequado e eficaz de seu instrumento de interação social que é a sua língua materna. Considerando a língua um instrumento de interação social, é imprescindível tratar a gramática no contexto de interação, ou seja, no texto, com base nos pressupostos do falante sobre as informações pragmáticas do ouvinte.

Nesta seção, relacionamos alguns princípios teóricos da Gramática Discursivo-Funcional (Hengeveld e Mackenzie 2008) ao ensino da oração adjetiva, mostrando que a visão de gramática desse modelo teórico se coaduna com as propostas atuais de ensino, já que, segundo a GDF, a língua codifica morfossintática e fonologicamente informações gramaticalmente pertinentes que representam as intenções comunicativas do falante na interação. Dessa forma, o ensino de orações adjetivas, assim como de qualquer outro conteúdo gramatical, deve partir da intenção comunicativa do falante (pragmática), para a forma de expressão (codificação morfossintática ou fonológica), e não o contrário, como comumente se observa na literatura linguística.

Conforme observado anteriormente, as orações adjetivas explicativa e restritiva são formuladas diferentemente de acordo com o objetivo comunicativo do falante. Enquanto a explicativa, que representa uma estratégia do falante para levar o ouvinte a aceitar seus propósitos comunicativos, é formulada como um Ato de fala que fornece uma informação de fundo a respeito de um referente, a adjetiva restritiva permite ao ouvinte formular uma imagem semanticamente adequada do referente, identificando-o dentro de um conjunto infinito de referentes possíveis. Mostrar essa distinção, sem necessariamente usar essa terminologia, é o que primeiramente deveriam fazer os LD, ou seja, mostrar que o propósito comunicativo do Falante é que determina o tipo de oração adjetiva. Se a intenção é levar o Ouvinte a aceitar seus propósitos comunicativos na interação, fornecendo uma informação de fundo a respeito do referente em pauta, a oração será construída com um contorno entonacional próprio, que será marcado na escrita com as vírgulas. Se, por outro lado, a pretensão do Falante é levar o Ouvinte a formular uma imagem semanticamente adequada do referente, identificando-o dentro de um conjunto infinito de referentes possíveis, a oração será construída sem um contorno entonacional próprio, mas em conjunto com o contorno do sintagma nominal a que pertence a oração adjetiva. Essa propriedade implica o não uso de vírgula na escrita. Dessa forma, não é a presença da vírgula na escrita que determina o tipo explicativo; pelo contrário, o uso da vírgula é consequência de uma formulação pragmática, que se reflete na prosódia; e a ausência da vírgula na restritiva é indício de uma formulação puramente semântica.

Como os LD trabalham com textos escritos, o professor deve levar o aluno a perceber a intenção comunicativa do escritor ao formular uma oração adjetiva como explicativa ou restritiva. Infelizmente o que se observa é que os LD, mesmo quando extraem a oração adjetiva do texto, tratam-na como um exemplo isolado e descontextualizado, como se pode observar na atividade a seguir, extraída do livro PB (Horta e Menna 2012: 95-6):

 

7 Agora leia esta tira:

 

 

a) A tirinha faz menção ao projeto de transposição de parte das águas do rio São Francisco para a região do semiárido nordestino. Por que a personagem aparece com uma boia no último quadrinho?

b) A que termo antecedente se refere o pronome relativo que?

c) Se a oração subordinada adjetiva que desvia rio para o sertão fosse retirada, poderíamos entender completamente o período?

 

Em (7a), há um exercício de interpretação de texto que exige que o aluno relacione a fala do personagem com a imagem do último quadrinho. Já em (7b-c) há exercícios sobre a oração adjetiva. Não se estabelece nenhuma relação entre (7a) e (7b-c), ou seja, não se estabelece uma relação entre o uso da oração adjetiva e a construção dos sentidos no texto.

Considerar o contexto de uso de uma oração adjetiva, ou seja, a relação que ela estabelece com os outros enunciados dentro do (con)texto é uma atividade que precisa se tornar uma prática, como o que é excepcionalmente efetuado em Ramos e Takeuchi (2012: 158), ao proporem uma atividade de reflexão sobre o uso da oração adjetiva em textos enciclopédicos:

  

8 Releia os trechos a seguir.

 

I.               “A Irmandade de Nossa Senhora da Boa Morte nasceu nas senzalas, locais que abrigavam escravos negros nos engenhos de cana-de-açúcar, há cerca de 150 anos.”

 

II. “Mistura de herança africana com toques da cultura portuguesa, a Congada representa a coroação dos reis congos, que desfilam mascarados e trajados com fardas ornamentadas de ouro e diamantes, cercados do bailado dos guerreiros. (...).”

           

b) Qual é a função das orações destacadas em relação aos termos referidos? Copie a opção correta no caderno.

Opção 1 – Caracterizá-los, acrescentando juízos de valor ao que é dito.

Opção 2 – Caracterizá-los, transmitindo informações de forma mais objetiva.

c) Tendo em vista sua resposta ao item anterior, que classificação pode ser atribuída às orações destacadas?

d) Considere sua resposta à atividade 4b. Qual é a importância, num texto enciclopédico, da função identificada?

 

Apesar da questão (8c) ser uma atividade exclusivamente de classificação, nas outras, o aluno é levado a refletir sobre a função da oração adjetiva na construção do texto enciclopédico, considerando a característica desse gênero de transmitir informações de modo mais objetivo, o que de fato constitui um ensino reflexivo e contextualizado de gramática. Deve-se atentar, porém, para a equivalência que se estabelece entre o uso da oração adjetiva e a transmissão de informações objetivamente, como proposto na questão (8c). De fato, essa é uma característica própria do gênero enciclopédico, e não da oração adjetiva. Nada impede que, em outros contextos, a oração adjetiva também acrescente juízos de valor. O aluno não pode ser levado a pensar nem que a oração adjetiva transmite informações apenas objetivamente, nem que essa é uma característica que a define.

Outro recurso usado pelos LD para distinguir a oração adjetiva restritiva e a explicativa é a supressão da oração subordinada. Assim, segundo os LD, apenas a explicativa pode ser omitida sem prejudicar a compreensão da sentença. Faraco e Moura (2012: 76-7), no PH, baseiam-se nos exemplos (9) e (10) para mostrar que a oração explicativa em (9) pode ser extraída sem afetar a compreensão do enunciado, enquanto a omissão da oração adjetiva restritiva em (10) compromete o sentido do enunciado.

 

9 Grazzi Massafera, que é ex-participante de um reality show, concedeu entrevista a um site de revista. (Faraco e Moura 2012: 76)

 

10 As pessoas acreditaram na notícia que saiu naquela manhã. (Faraco e Moura 2012: 77)

 

Na realidade, a omissão tanto de uma como de outra não impossibilita a compreensão do enunciado, porque, em ambas as construções, a gramaticalidade da sentença é mantida, o que se justifica pelo fato de serem modificadores e não constituintes obrigatórios. Como consequência, esse critério de diferenciação das orações adjetivas mostra-se inválido, como se comprova nas reformulações em (9’) e (10’):

 

9Grazzi Massafera concedeu entrevista a um site de revista.

 

10’ As pessoas acreditaram na notícia.

 

Além disso, é impossível levar o aluno a refletir sobre a (im)possiblidade de omissão da adjetiva em exemplos descontextualizados como esses. O livro didático UN (Ramos e Takeuchi 2012: 261), de maneira singular, parte da reflexão sobre o uso da oração adjetiva no texto para levar os alunos a compreenderem a diferença de sentido entre restritiva e explicativa, embora use o mesmo critério de omissão da oração adjetiva.  Considere-se o texto a seguir.

 

11 Leia a notícia abaixo, tirada de um site de entretenimento.

Sarau du Brown reune Stomp Experience & Projeto Quabales e Paralamas do Sucesso

 

Carlinhos Brown recebe no palco do Museu du Ritmo, neste domingo, os ingleses do Stomp Experience & Projeto Quabales. Assim como nosso Cacique, os ingleses criam músicas com instrumentos não convencionais como vassouras, toneis, latas e o próprio corpo. No mesmo dia, divide também o palco com o artista baiano um dos grandes líderes da Velha Guarda, Jerry Adriani. O cantor, que completa este ano 47 anos de carreira, traz para o evento multilinguagem baladas românticas como “Doce, Doce Amor”.

 

E a noite segue no Sarau com o Rock in Roll dos Paralamas do Sucesso. Na apresentação, clássicos se misturam a faixas do recente “Brasil Afora” (2009), álbum que originou a última turnê. Quem também participa do evento é a cantora baiana Márcia Castro. Para os conterrâneos, ela apresenta o mais recente trabalho, a nova versão da música “Preta, Pretinha”, de Moraes Moreira.

 

Na segunda sentença, realmente não é possível omitir que originou a última turnê, pois é justamente a oração restritiva que especifica o núcleo álbum; sem essa informação, o Ouvinte não constrói uma imagem mental do referente. A agramaticalidade de Na apresentação, clássicos se misturam a faixas do recente ‘Brasil Afora’ (2009), álbum, advinda da omissão da adjetiva, explica-se pelo fato de a palavra álbum não ser, nesse contexto, suficiente para constituir um enunciado independente, e não pelo estatuto da adjetiva restritiva, que por ser modificador, não é um constituinte obrigatório.

Por sua vez, a oração explicativa em O cantor, que completa este ano 47 anos de carreira, traz para o evento multilinguagem baladas românticas como ‘Doce Doce Amor’, pode ser omitida sem prejudicar a gramaticalidade da sentença, já que é também um modificador. Fica, no entanto, prejudicado o poder argumentativo do texto, já que a adjetiva explicativa que completa este ano 47 anos de carreira traz uma informação de fundo que o escritor julga necessário acrescentar à informação pragmática do leitor, visando atingir determinados objetivos comunicativos. No exemplo, o objetivo do escritor é construir uma imagem, para o referente cantor, de pessoa experiente no campo musical, conferindo-lhe o poder de fazer um excelente show, comprovada pelo uso do sintagma um dos grandes líderes da velha guarda, citado anteriormente no texto para se referir ao cantor Jerry Adriani. Portanto, apesar de as adjetivas não serem constituintes obrigatórios da oração, sua omissão traz prejuízo para a interação na medida em que deixa de expressar a real intenção comunicativa do Falante, ou de acrescentar uma informação adicional sobre o referente (explicativa) ou de identificar adequadamente um referente (restritiva).

Outro aspecto que normalmente se observa nos LD é relacionar a oração adjetiva a um adjetivo. Isso pode ser adequado se se considerar que ambos são modificadores, ou seja, são constituintes opcionais e, justamente por isso, podem ser extraídos da sentença sem afetar a sua gramaticalidade, diferentemente do que ocorre com os constituintes argumentais. Devido a essa equivalência, os LD propõem constantemente atividades de substituição de oração adjetiva por adjetivo. Essas atividades devem, no entanto, mostrar que a equivalência entre adjetivo e oração adjetiva diz respeito apenas à função modificadora que desempenham, e não a uma suposta equivalência de sentido, do tipo O homem que trabalha progride/ O homem trabalhador progride (Figueiredo et al. 2012: 234), como frequentemente se leva a pensar. Além disso, deve-se observar que raramente é possível encontrar um adjetivo com o mesmo sentido da oração adjetiva. Qual adjetivo, por exemplo, seria equivalente à oração adjetiva na sentença a Páscoa é uma festa móvel que costuma cair em março ou no começo de abril (Figueiredo et al.  2012: 234)? Para o aluno, é mais interessante entender os diferentes efeitos de sentido derivados do uso de um ou outro recurso de modificação. Enquanto o adjetivo trabalhador tem como foco uma qualidade do indivíduo (ser trabalhador), a oração adjetiva tem como foco um Estado-de-Coisas e, por isso, pode acrescentar mais informações sobre o referente do que o adjetivo, conforme se observa em (12), em que se acrescentam duas circunstâncias de modo ao sentido do verbo.

 

12 O homem que trabalha duro e com seriedade progride.

 

Um aspecto importante ao tratar a oração adjetiva é mostrar que morfossintaticamente as duas orações adjetivas são idênticas, ou seja, um sintagma nominal recruta uma oração, formando um composto mais complexo. Apesar de os LD enfatizarem o fato de o pronome relativo referir-se a um antecedente expresso anteriormente, ao definirem a oração adjetiva, afirmam que ela é dependente sintaticamente da oração principal (cf. Faraco e Moura 2012: 94). Essa é uma concepção equivocada de subordinação das adjetivas. Como se sabe, a oração adjetiva constitui um modificador do núcleo de um sintagma nominal, ou seja, subordina-se sintaticamente a um sintagma e não a uma oração. Essa propriedade permite construções como as da sentença Na apresentação, clássicos se misturam a faixas do recente ‘Brasil Afora’ (2009), álbum que originou a última turnê, citada anteriormente, em que o sintagma álbum que originou a última turnê constitui um Ato discursivo, com ilocução própria, constituído unicamente de um sintagma nominal modificado por uma oração adjetiva, ou seja, não há uma oração principal à qual a oração adjetiva se relacione.

O Nível Fonológico desempenha um papel fundamental para a distinção de ambos os tipos de adjetivas, já que a diferença de formulação das duas reflete em diferentes formas de codificação fonológica. É indispensável que o aluno perceba esse percurso que vai da formulação para a codificação da oração adjetiva, para não incorrer no risco de achar que é a presença/ausência de vírgulas que define as orações adjetivas. Os LD, baseados na gramática normativa, têm uma forte intuição sobre isso, ao acentuar a importância de se usarem vírgulas para separar a oração explicativa. Entretanto, os LD, tendo principalmente objetivos prescritivos, se limitam a pedir para o aluno colocar vírgulas na oração explicativa, identificar a diferença de pontuação entre as duas e usar essa diferença para classificar as orações adjetivas. A diferença prosódica entre as duas adjetivas, conforme já salientado, se deve ao contorno entonacional próprio e à mudança de tessitura da explicativa. Como se vê, a prosódia, característica da modalidade falada, tem um importante papel na gramática do português. Esse é um aspecto raramente tratado nos LD, mas importante para que o aluno perceba que essa diferença de codificação fonológica é que determina o uso de vírgulas na oração adjetiva explicativa. Essa é também uma ótima oportunidade para mostrar a importância da língua falada; de fazer o aluno perceber que a língua falada, tanto ontogenética quanto filogeneticamente, precede a escrita.

Como se sabe, a oração adjetiva é sempre encabeçada por um pronome relativo que retoma o sintagma nominal, núcleo da oração adjetiva. Esse papel coesivo anafórico é reconhecido nos LD em atividades em que se solicita ao aluno identificar o núcleo a que o pronome se refere ou unir períodos simples em compostos, evitando repetição. É importante, no entanto, mostrar ao aluno que o pronome relativo é uma estratégia coesiva, que serve para retomar uma informação imediatamente anterior, e que, no processo de construção textual, as entidades já inseridas ficam à disposição para serem retomadas a qualquer momento. Além disso, deve-se mostrar ao aluno que essa estratégia de retomada não é restrita ao pronome relativo, ocorrendo também no uso de pronomes pessoais, nominalizações etc.

Na notícia, reproduzida anteriormente, há diversos exemplos dessas estratégias, usadas para fazer referências aos shows que serão apresentados no Museu du Ritmo:

 

1)     Carlinhos Brown/ nosso cacique/ o artista baiano

2)     Os ingleses do Stomp Experience & Projeto Quabales/ os ingleses

3)     O cantor/ um dos grandes líderes da Velha Guarda/ Jerry Adriani/ que

4)     A cantora baiana Márcia Castro/ ela

 

Deve-se, todavia, mostrar que essas estratégias correspondem a objetivos comunicativos diferentes: enquanto sintagmas nominais, como nosso cacique e grande líder da Velha Guarda, trazem uma avaliação subjetiva do escritor, os pronomes pessoal ou relativo constituem apenas o elo coesivo, nada acrescentando informacionalmente ao referente. É indispensável, portanto, que se contraste o funcionamento dos pronomes relativos com outras estratégias coesivas, o que só é possível considerando o contexto em que está inserida a oração adjetiva.

Esse caráter anafórico do pronome relativo está relacionado a outro aspecto que deve ser considerado no estudo da oração adjetiva. O pronome relativo, como elemento anafórico que é, codifica uma informação (situacional ou discursiva) já presente no componente contextual, compartilhada, portanto, pelos falantes no momento da interação. Em outras palavras, ele fornece um tipo específico de orientação para o estoque de informação nova a ser apresentada, assinalando como o conteúdo comunicado se relaciona ao registro construído gradualmente no componente contextual. Em outras palavras, o pronome relativo é formulado como um Subato com função pragmática Tópico, pois relaciona o conteúdo comunicado a informações existentes no componente contextual. Dessa forma, o pronome relativo será sempre Tópico na oração adjetiva, o que o leva para a posição inicial da oração (PI), que marca a função Tópico em português (cf. Pezatti 2014)[2]. É o que se observa na oração adjetiva que completa este ano 47 anos de carreira, constante no enunciado O cantor, que completa este ano 47 anos de carreira, traz para o evento multilinguagem baladas românticas como ‘Doce Doce Amor’, da notícia, reproduzida anteriormente. O pronome que retoma o sintagma núcleo o cantor, que, por sua vez, refere-se a um dos grandes líderes da Velha Guarda expresso no enunciado anterior (No mesmo dia, divide também o palco com o artista baiano um dos grandes líderes da Velha Guarda). Assim, tanto ao sintagma o cantor como ao pronome relativo que é atribuída a função pragmática Tópico, respectivamente da oração principal e da oração adjetiva, que, por isso, são alocados na posição inicial de cada uma das orações, conforme se representa a seguir.

 

13

o cantor, que completa este ano 47 anos de carreira,

traz

para o evento multilinguagem

baladas românticas como ‘Doce Doce Amor

 

PI

PM

PM+1

PF

 

14

   que

    completa

     este ano

       47 anos de carreira

 

PI

 PM

PF-1

PF



 

No ensino da oração adjetiva, deve-se levar o aluno a compreender o pronome relativo como um mecanismo de coesão, em comparação com outros mecanismos disponíveis ao falante. Entender a função do pronome relativo na construção textual implica que atividades como as de unir períodos simples em um período composto sejam propostas a partir de textos (e não de orações descontextualizadas). Desse modo, o aluno deve ser levado a perceber que o pronome relativo substitui um determinado nome, evitando a sua repetição e deixando o texto escrito mais adequado (segundo uma tradição de produção de texto que elenca a repetição como um “defeito”).

 

 

5. Palavras finais

 

O ensino da oração adjetiva deve basear-se na reflexão sobre a língua em uso, o que só ocorre em situações reais de interação, que devem ser não só o texto escrito, mas também o texto falado, pois aspectos prosódicos, como entonação e tessitura, são fundamentais para o estudo da oração adjetiva. Isto é, o aluno deve entender que a diferença entre oração adjetiva explicativa e restritiva deriva do fato de a primeira ser formulada pragmaticamente, como uma informação adicional sobre o núcleo nominal, e a segunda ser formulada como um modificador cuja função é possibilitar que o ouvinte selecione o referente adequado dentre outros referentes possíveis. Essa diferença irá refletir em diferentes codificações no Nível Fonológico. Levar o aluno a perceber isso é mais interessante do que simplesmente levá-lo a uma inútil classificação em adjetiva explicativa ou restritiva.

Inserir o texto oral na escola é um grande desafio, pois o ensino de gramática se baseia, geralmente, na análise de exemplos inventados e descontextualizados. Nas raras vezes em que se propõe alguma reflexão sobre a língua falada, parte-se de uma dicotomia fala e escrita que aproxima a primeira das variedades desprestigiadas e a segunda da norma padrão, ou seja, a inserção da língua falada nas atividades de gramática reflete uma concepção de que certas estruturas presentes na fala devem ser evitadas na língua escrita e tem como propósito levar os alunos à correção de construções mal formuladas. Contrariamente a esse fato, o professor de língua portuguesa deve ter em mente que a diferença entre fala e escrita se dá em termos de um continuum. As histórias em quadrinhos, tão presentes nas seções dos manuais didáticos que tratam de ensino de gramática, seriam um ótimo recurso para se mostrar isso, já que se trata de um gênero escrito que reproduz a fala dos personagens.

A principal contribuição deste trabalho ao ensino consiste em uma nova postura frente aos fatos linguísticos. Os LD apresentam um percurso para estudo da oração adjetiva que parte da forma em direção ao sentido das orações, isto é, primeiramente abordam-se os aspectos morfossintáticos, e, a seguir, apresentam-se os sentidos veiculados pelas orações subordinadas.  Como demonstrado aqui, são as intenções comunicativas do falante que determinam quais estruturas linguísticas serão escolhidas, ou seja, a opção por uma adjetiva restritiva ou uma adjetiva explicativa depende dos propósitos que o falante tem em mente e irá refletir na prosódia das orações adjetivas. Somente com uma reflexão, em que se inverta o olhar sob os aspectos linguísticos, o aluno será capaz de mobilizar adequadamente os recursos linguísticos necessários para uma comunicação eficaz.

 

 

Referências

 

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Connolly, John H. 2007. Context in functional grammar, Alfa, 51 (2): 11-33.

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Horta, Maria Regina Figueiredo e Lígia Regina Máximo Cavalari Menna. 2012. Português: uma língua brasileira, 9º ano, São Paulo, Leya.

Neves, Maria Helena de Moura. 1993. Reflexões sobre o estudo da gramática nas escolas de 1º e 2º graus, Alfa, 37: 91-98.

Neves, Maria Helena de Moura. 2002. A gramática: história, teoria e análise, ensino, São Paulo, Editora da Unesp.

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Pezatti, Erotilde Goreti. 2014. A ordem das palavras no português, São Paulo, Parábola Editorial.

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Tavares, Rosemeire Aparecida Alves e Tatiane Brugnerotto. 2012. Vontade de saber português, 1ª ed., São Paulo, Editora FTD.

Travaglia, Luiz Carlos. 2011. Gramática ensino plural, 5ª ed., São Paulo, Cortez.
 
 

 




[1] O Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) foi implantado em 19 de agosto de 1985 pelo Ministério da Educação (MEC) do Brasil por meio do Decreto-Lei nº 91.542 e tem como finalidade a distribuição gratuita de livros didáticos que sirvam como subsídio pedagógico ao trabalho dos professores da rede pública desde os anos iniciais do Ensino Fundamental até os anos finais do Ensino Médio (Informações extraídas do site http://www.fnde.gov.br/programas/livro-didatico. Acesso em: 10 de abril de 2014).

 

[2] Para codificar a ordem dos constituintes, Hengeveld e Mackenzie (2008) postulam três posições disponíveis na oração para a inserção de elementos em posições apropriadas: a posição inicial (PI), a posição medial (PM) e a posição final (PF). As duas posições periféricas (PI e PF) são psicologicamente salientes e extremamente relevantes para o processo de comunicação. PM pode conter outras posições não absolutas, como PM-1, PM-2, PM-n no lado esquerdo e PM+1, PM+2, PM+n no lado direito.

 

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