SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.11 número2Adaptación de una escala para evaluar contacto entre ciudadanos de distinta clase social del Gran Córdoba (Argentina)La construcción de la identidad en el trastorno mental severo: estudio discursivo en Radio Nikosia índice de autoresíndice de materiabúsqueda de artículos
Home Pagelista alfabética de revistas  

Servicios Personalizados

Revista

Articulo

Links relacionados

Compartir


Psicología, Conocimiento y Sociedad

versión On-line ISSN 1688-7026

Psicol. Conoc. Soc. vol.11 no.2 Montevideo  2021  Epub 01-Ago-2021

https://doi.org/10.26864/pcs.v11.n2.3 

Trabajos originales

Validação da estrutura fatorial da Escala de Procrastinação em estudantes universitários brasileiros

Validación de la estructura factorial de la Escala de Procrastinación en estudiantes universitarios brasileños

Validation of the factorial structure of the Procrastination Scale in Brazilian university students

Giovanna Barroca de Moura1 
http://orcid.org/0000-0001-7970-4323

Tamyres Tomaz Paiva2 
http://orcid.org/0000-0001-9415-0963

Sergio Dominguez-Lara3 
http://orcid.org/0000-0002-2083-4278

1Universidade de Coimbra, Brasil

2Universidade Federal da Paraíba, Brasil

3Universidad Privada San Juan Bautista, Lima, Perú Autor referente: giovannabarroca@gmail.com


Resumo

A procrastinação faz os estudantes universitários adiarem e atrasarem seus trabalhos acadêmicos, ignorando suas responsabilidades acadêmicas durante todo o período de estudos. No entanto, ainda há poucas pesquisas sobre este assunto e poucos instrumentos validados para os brasileiros, com o objetivo de medir os níveis de procrastinação. O objetivo deste estudo é confirmar a estrutura fatorial da Escala de Procrastinação Acadêmica (EPA). Contou-se com 360 estudantes de graduação, a maioria de universidade privada (56,9%) e do sexo feminino (71,4%). Os resultados mostraram que a EPA possui duas subescalas: adiamento de atividades e autorregulação acadêmica. Esse modelo apresentou melhores índices de bondade, o que significa que na cultura brasileira os fatores subjacentes aos itens são os mesmos de outras culturas (e.g., Peru e Canadá). A análise dos dados por meio da Teoria de Resposta ao Item mostrou níveis de calibração dos itens significativos, isto é, os itens conseguem discriminar as pessoas, assim como apresentam níveis de dificuldade diferenciados para cada categoria de resposta do item. Logo, a estrutura bidimensional segue parâmetros estruturais significativos para adequação aos estudantes universitários brasileiros.

Palavras chaves: Procrastinação acadêmica; autorregulação acadêmica; validade; confiabilidade

Resumen

La dilación hace que los estudiantes universitarios pospongan y retrasen su trabajo académico, ignorando sus responsabilidades académicas durante su período de estudio. Sin embargo, todavía hay poca investigación sobre este tema y pocos instrumentos validados para brasileños, con el objetivo de medir los niveles de procrastinación. El propósito de este estudio es confirmar la estructura factorial de la Escala de Procrastinación Académica (EPA). Había 360 estudiantes de pregrado, la mayoría de universidades privadas (56,9%) y mujeres (71,4%). Los resultados mostraron que la EPA tiene dos subescalas: aplazamiento de actividades y autorregulación académica. Este modelo mostró mejores tasas de bondad, lo que significa que, en la cultura brasileña, los factores subyacentes a los ítems son los mismos que en otras culturas (por ejemplo, Perú y Canadá). El análisis de los datos a través de la Teoría de la Respuesta al Item, mostró niveles de calibración de los ítems significativos, es decir, los ítems son capaces de discriminar a las personas, además de tener diferentes niveles de dificultad para cada categoría de respuesta del ítem. Por lo tanto, la estructura bidimensional sigue parámetros estructurales significativos para adaptarse a los estudiantes universitarios brasileños.

Palabras clave: Procrastinación académica; autorregulación académica; validez; confiabilidad

Abstract

Procrastination causes college students to postpone and delay their academic work, ignoring their academic responsibilities throughout their study period. However, there is still little research on this subject and few instruments validated for Brazilians, with the aim of measuring levels of procrastination. The purpose of this study is to confirm the factorial structure of the Academic Procrastination Scale (APS). There were 360 undergraduate students, most from private universities (56.9%) and women (71.4%). The results showed that the APS has two subscales: postponement of activities and academic self-regulation. This model showed better rates of goodness, which means that in Brazilian culture, the factors underlying the items are the same as in other cultures (e.g., Peru and Canada). The analysis of the data through the Item Response Theory, showed levels of calibration of the significant items, that is, the items they are able to discriminate people, as well as have different levels of difficulty for each item's response category. Therefore, the two-dimensional structure follows significant structural parameters to suit Brazilian university students.

Keywords: Academic procrastination; academic self-regulation; validity; reliability

Depois de amanhã, sim, só depois de amanhã... Levarei amanhã a pensar em depois de amanhã, E assim será possível; mas hoje não... Fernando Pessoa

O tema da procrastinação que o poema aborda é algo recorrente entre os estudantes universitários brasileiros. Este fenômeno com consequências negativas e muito típicas nas sociedades significa deixar para fazer no dia seguinte o que poderia ser realizado no mesmo dia (Balkis & Duru, 2016; Klingsieck, 2013). Entende-se a procrastinação como o adiamento de uma tarefa que foi planejada anteriormente. O próprio termo procrastinação vem do verbo latino procrastinare, que significa deixar algo para o dia seguinte. Contudo, procrastinar não é o mesmo que não fazer nada ou sinônimo de ócio (Schouwenburg, 2004), mas sim realizar outras atividades menos importantes em vez daquelas com caráter de urgência (Schouwenburg, 2004).

É sabido que a prática de procrastinar ocorre em alguns domínios da vida, incluindo o ambiente acadêmico (Balkis & Duru, 2016; Klingsieck, 2013). Uma pesquisa realizada nos Estados Unidos com estudantes universitários indicou que mais de 70% destes discentes regularmente procrastinam seus estudos e 20% o fazem habitualmente (Schouwenburg, 2004). No contexto brasileiro, cerca de quatro em cada cinco universitários procrastinam suas tarefas acadêmicas e mais da metade deles fazem isso ao menos uma vez por semana (Geara & Teixeira, 2017). Um estudo de Balkis & Duru, (2016) demonstrou que 80 e 90% dos estudantes universitários praticam a procrastinação, ao adiar constantemente as suas atividades acadêmicas.

Seja qual for o tipo de procrastinação, ela retarda o desempenho dos alunos, fazendo com que os outros os enxerguem como descuidados, preguiçosos, passivos e academicamente estagnados e irresponsáveis. A maioria dos alunos que procrastina caracteriza o comportamento como prejudicial, e a procrastinação está realmente associada ao baixo desempenho acadêmico (Kim & Seo, 2015), pouco cuidado com a saúde física (Scent & Boes, 2014) e aumento da ansiedade e do estresse (Klingsieck, 2013). Pode também estar relacionada ao bem estar subjetivo em seus componentes afetivos e cognitivos (Soares, Andrade-Filho, Ribeiro, & Rezende, 2020), além de estar associada de forma negativa com as estratégias de regulação motivacional. Dessa forma, a procrastinação acaba sendo um elemento que desmotiva as pessoas a buscarem alternativas para a realização das tarefas (Grunschel, Schwinger, Steinmayr, & Fries, 2016), bem como pode diminuir a motivação para a realização das leituras acadêmicas (Silva, Machado, Oliveira, & Fonsêca, 2020).

A procrastinação acadêmica ainda é um tema pouco explorado no Brasil. Em um levantamento com o descritor “procrastinação acadêmica” nas bases de dados SCIELO, LILACS, Biblioteca Virtual de Saúde, PePSIC, IndexPSI, MedLine, Banco de Teses da CAPES e Portal de Periódicos da CAPES, considerando todo o período disponível nas bases, foram localizados 19 diferentes estudos publicados em Português. Esses estudos abordavam a procrastinação em diferentes contextos a partir de perspectivas de áreas como Psicologia, Educação, Administração e Economia. Por outro lado, a busca feita com o descritor “academic procrastination” no PsycInfo, uma das bases de dados mais abrangentes da psicologia mundial, gerou 626 resultados para todo o período disponível para a pesquisa.

A partir de uma revisão detalhada por meio dos resumos e títulos dos estudos, incluiu-se apenas os estudos que obtiveram como finalidade a validação de escalas de procrastinação. A escala Tuckman Procrastination Scale (TPS) composta, inicialmente, por 15 itens, pois sua validação excluiu um, restando apenas 14, é validada para o contexto brasileiro por Couto, Fônseca, Silva, Medeiros e Carvalho (2020). Esta medida busca avaliar a procrastinação situacional, frequente em áreas específicas da vida de uma pessoa. A escala apresentou boa consistência interna em dois níveis de análise: no alfa de Cronbach e no ômega de McDonald, apresentando valores respectivos, 0,88 e 0,88. Furlan, Heredia, Piemontesi e Tuckman (2012) também realizaram uma adaptação da Tuckman Procrastination Scale (TPS), em uma amostra argentina, o qual adaptou sua versão para Escala de Procrastinación de Tuckman (ATPS). Neste estudo de validação, foi utilizado uma escala de 15 itens e a evidência de teste de critério foi obtida com correlações negativas (r = -0,217 p <0,001) com o desempenho acadêmico. A Escala de Procrastinación de Tuckman não é idêntica a versão abreviada sugerida por Tuckman (1990), desse modo, a escala pode ser usada apenas na região que foi realizada a pesquisa. Segundo os autores do estudo, a escala ATPS não é considerada equivalente para fins de pesquisa transcultural.

Outra escala encontrada foi o instrumento construído por Geara e Teixeira (2017) para avaliar, com 69 itens, a percepção de universitários sobre diversos aspectos da procrastinação acadêmica. Participaram desse estudo 534 universitários do Rio Grande do Sul, que responderam ao instrumento via internet. O alfa (α) de Cronbach observado para esta escala foi de 0,84. Segundo Dominguez-Lara, Navarro-Loli e Prada-Chapoñan (2019), instrumentos com grande quantidade de itens tornam a pesquisa demorada devido à percepção de redundância dos itens apresentados, o que pode resultar em fadiga, falta de energia para completar as pesquisas, representando uma ameaça à validade das interpretações (Dominguez-Lara et al., 2019).

Mais tarde, Geara, Nunes, Hauck-Filho e Teixeira (2019) construíram uma nova ferramenta com a finalidade de avaliar um amplo espectro latente de procrastinação acadêmica. Análises fatoriais exploratórias permitiram selecionar 20 itens (com 60 iniciais) criados com base nas definições dos construtos presentes na literatura, que apresentaram cargas de magnitude moderada a alta em um fator geral de procrastinação. A fidedignidade encontrada para a escala foi de 0,91 pelo coeficiente alpha e 0,93 pelo coeficiente ômega, havendo uma ampla cobertura latente, como sugerido a partir da curva de informação do teste.

Diante do exposto, podemos observar diferentes escalas para medir o fenômeno da procrastinação acadêmica no campo da educação. Notavelmente, algumas escalas possuem desvantagem, como número de itens muito grandes (e.g., Geara & Texeira, 2017). É importante ressaltar que já existem escalas com quantidade de itens menor (Couto et al., 2020) e que se mostram favoráveis a aplicação em contextos acadêmicos, mas são utilizadas em contextos gerais e não específicos para área acadêmica. É justamente essa lacuna teórica que pretendemos preencher, objetivando, assim, validar a estrutura fatorial Escala de Procrastinação Acadêmica (EPA), desenvolvida por Busko (1998).

Essa estrutura fatorial já foi validada em outras culturas como: Álvarez (2010), no Canadá, em estudantes adolescentes, e por Dominguez-Lara, Villegas e Centeno (2014), no Peru, em estudantes universitários, pela necessidade de se ter uma escala pautada exclusivamente na procrastinação acadêmica, além de possibilitar estudos comparativos com outras culturas com número de itens reduzidos (Dominguez-Lara, 2016a; Dominguez-Lara et al., 2014). Cabe mencionar que a escala de Procrastinação Acadêmica (EPA) foi elaborada originalmente para avaliar a procrastinação como um construto unidimensional (Busko, 1998) e, desse modo, foi aplicada inicialmente no Peru (Álvarez, 2010). Entretanto, em alguns estudos posteriores realizados em outros países dessa região, se confirmou que, na realidade, existem dois construtos subjacentes: adiamento de atividades e autorregulação acadêmica (Barraza-Macías, & Barraza-Nevárez, 2018; Dominguez-Lara, 2016a; Dominguez-Lara et al., 2014; Moreta-Herrera & Durán-Rodríguez, 2018).

Assim, o presente estudo instaurou o seguinte problema de pesquisa: Como os itens se comportarão diante da mesma análise fatorial confirmatória? (Dominguez-Lara et al., 2014). Será que os que estará subjacente aos itens dois traços latentes ou surgirão outras subescalas subjacentes ao construto teórico da procrastinação acadêmica que possam demonstrar melhor ajuste ao modelo?

Como diferencial da validação peruana, acrescentamos ainda a análise mais refinada da Teoria de Resposta ao Item (TRI), que avalia o quanto cada item contribui na formação da EPA. Levantamos como hipótese que o modelo bidimensional apresentará melhor índice de ajuste ao modelo, ratificando a estrutura bidimensional encontrada em outros estudos realizados no Peru, México e Equador (Barraza-Macías & Barraza-Nevárez, 2018; Dominguez-Lara et al., 2014; Moreta-Herrera, & Durán-Rodríguez, 2018).

Método

Participantes

Participaram do estudo 360 estudantes de graduação, a maioria de universidade privada (56,9%), da área de humanas (56,4%) do curso de pedagogia (57,2%), que estudam cerca de 1 hora por dia (29,4%) por influência do professor (51,7%). Têm idades entre 17 e 64 anos (M = 26,90; DP = 9,44), sendo a maioria do sexo feminino (71,4%), solteiros(as) (67,2%), que residem com filhos e cônjuges (24,4%) e que se autodeclararam um pouco religiosos (30,6%).

Instrumento

A Academic Procrastination Scale (APS) foi construída inicialmente por Busko (1998) e aplicada em estudantes canadenses. Em seguida, foi aplicada em estudantes peruanos, traduzida e validada para o contexto do Peru como Escala de Procrastinación Académica (EPA; Dominguez-Lara, 2016a; Dominguez-Lara et al., 2014). Para o Brasil, solicitamos que dois professores bilingues de língua espanhola e portuguesa realizasse a tradução para o português como Escala de Procrastinação Acadêmica (EPA, ver anexo 1), mantendo a semântica e a estrutura linguística parecida. Em seguida, as duas versões em português para o espanhol foram repassadas por outro pesquisador bilíngue, realizando, dessa forma, a retrotradução dos itens. Após esse processo de tradução e retrotradução, os autores do presente estudo escolheram a melhor versão dos itens, levando em consideração a carga semântica e linguística para compor a escala.

Essa escala é uma medida composta por 12 itens e apresenta duas dimensões a adiamento de atividades (três itens) e a autorregulação acadêmica (nove itens). Os itens são respondidos conforme a frequência com que estes comportamentos são praticados em uma escala em formato Likert variando entre 1 (nunca) e 5 (sempre). Assim, quanto maior a pontuação, maior a presença da dimensão avaliada.

Realizamos um questionário sociodemográfico com a finalidade de traçar o perfil amostral do estudo. Perguntamos acerca da idade, sexo, nível de escolaridade, classe social, curso, estado civil, nível de religiosidade, quantidade de horas dedicadas aos estudos e nível de influência dos docentes na procrastinação das atividades acadêmicas.

Procedimento

Antes de iniciar a pesquisa, a escala foi devidamente traduzida para o português e, após a tradução, foi realizado um estudo piloto com 10 alunos para a compreensão da escala. Em seguida, obtivemos a permissão dos coordenadores de curso e professores; após o consentimento, foram agendadas as coletas de dados, conforme a disponibilidade dos professores e do quadro de aulas.

Para a coleta de dados, apresentamos os objetivos do estudo, bem como o caráter voluntário da pesquisa. Para aqueles alunos que manifestaram interesse em participar da pesquisa, solicitamos a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, conforme exigência prevista no Código de Ética para pesquisas com seres humanos (Resolução 466/12 e a 510/16). Quanto às instruções de respostas, os pesquisadores instruíram os alunos para que respondessem o conjunto de perguntas individualmente, deixando-os livres para abandonar o estudo a qualquer momento.

Por fim, foram dirigidos os agradecimentos aos alunos, aos professores e aos coordenadores dos cursos envolvidos na pesquisa. O tempo médio para que os participantes respondessem ao questionário foi de aproximadamente 5 minutos.

Análise dos dados

Realizamos uma análise fatorial confirmatória para averiguar a estrutura da Escala de Procrastinação Acadêmica por meio do Sofware R Studio (versão 4.03) e auxílio do pacote Lavaan. Usamos o estimador Weighted Least Squares Mean and Variance Adjusted (WLSMV) para variáveis ordinais. Para avaliar os indicadores de melhor ajuste ao modelo testado, usamos os seguintes índices: χ2 /df aceita valores entre 2 e 3 (Schermelleh-Engel, Moosbrugger & Müller, 2003); Comparative Fit Index (CFI) e Tucker-Lewis index (TLI) aceita valores > 0,90 (Kline, 2015), Goodness-of-Fit-Index (GFI) aceita valores > 0,90 (Schermelleh-Engel et al., 2003), Root mean square error of approximation (RMSEA) aceita valores < 0,05 (Kline, 2015); Standardized Root Mean Square Residual (SRMR) aceita valores < 10 e o Expected Cross Validation Index (ECVI), indicando que, quanto menor for o valor, mais esse modelo se torna melhor em comparação ao modelo anterior (Schermelleh-Engel et al., 2003). A respeito da confiabilidade, se analisou a consistência constructo por meio do ômega de McDonald e a consistência pelo coeficiente do alfa de Cronbach, esperando magnitudes > .70 (Boateng, Neilands, Frongillo, Melgar-Quiñones, Yong, 2018; Kline, 2015).

Para a análise da teoria de Resposta ao Item (TRI), usamos o Graded Response Model(GRM) para itens politômicos a fim de estimar os 2 parâmetros dos itens (a e b) na fase de calibração dos itens (Boateng et al., 2018). A discriminação (a) representa a capacidade de o item diferenciar o indivíduo com diferentes níveis do traço latente. Já o parâmetro de dificuldade (b) indica o quão difícil é este item para o indivíduo aceitá-lo, de acordo com níveis de categorias de resposta. Também analisamos a contribuição de cada item na formação do traço latente, isto é, a proporção da informação por meio numérico e por meio da curva de informação.

Resultados

Inicialmente, testamos os modelos proposto pelo autor Dominguez-Lara (2016a) em uma estrutura unidimensional (procrastinação acadêmica) e bidimensional (adiamento de atividades e autorregulação acadêmica). O modelo unidimensional (12 itens) mostrou uma adequação do modelo χ² (54) = 172,93 (p < 0,001), CFI = 0,92, RMSEA = 0,07 (IC90%; 0,06-0,09), GFI = 0,96, SRMR = 0,08 (IC90%; 0,07;0,09); TLI = 0,91 e ECVI = 0,61. Mas, os índices do modelo bidimensional demonstraram ser significativamente melhores: χ² (53) = 75,712 (p < 0,001), CFI = 0,97, RMSEA = 0,04 (IC90%; 0,04;0,06), GFI = 0,98, SRMR = 0,06; TLI = 0,96 e ECVI = 0,40. Desse modo, concordou com a estrutura demonstrada por Dominguez-Lara (2016a). Além disso, as cargas fatoriais dessa estrutura foram estatisticamente diferentes de zero, apresentando magnitudes que variaram de moderada (item 4; λ = 0,45) a forte (item 7; λ = 0,71). A correlação entre os fatores foi moderada e negativa (ϕ = -0,53). A espessura das linhas mostradas na figura 1 demonstram o quanto cada item contribui para o fator: quanto mais grossas, mais as cargas de contribuição são altas e, quanto mais finas, menos se contribui.

O coeficiente de confiabilidade, por meio do ômega de McDonald, foi aceitável > 0,70 tanto para a dimensão da procrastinação (ω = 0,73), como também para a dimensão da autorregulação acadêmica (ω = 0,84). Os coeficientes dos alfas de Cronbach e dos theta de armor para a dimensão de adiamento de atividades (α = 0,70; H = 0,71) e autorregulação acadêmica (α = 0,79; H = 0,80) também foram estatisticamente satisfatórios (Dominguez-Lara, 2016b; Kline, 2015).

Figura 1: Estrutura fatorial da Escala de Procrastinação Acadêmica. Nota: F1 = Adiamento de atividades; F2 = Autorregulação acadêmica. 

Além de replicar a estrutura do autor, acrescentamos uma análise mais refinada, a Teoria de Resposta ao Item, com o pressuposto da unidimensionalidade e independência local, a fim de avaliarmos quais itens contribuem de fato para cada construto teorizado previamente. Para isso, empregamos na fase da calibração dos itens os parâmetros de discriminação (a) e dificuldade (b), por meio do modelo de GRM. Nesta etapa, identificamos que todos os itens apresentam discriminação moderadas, o que significa que os itens conseguem discriminar as pessoas. Quanto ao parâmetro da dificuldade, identificamos probabilidade de os participantes endossarem os itens de forma mais coerente (Boateng et al., 2018). Com isso, identificou-se que a categoria nunca é facilmente endossada pelas pessoas que afirmam não procrastinar suas atividades, como também por pessoas que não possuem uma autorregulação acadêmica diária. A categoria sempre é a mais difícil de ser endossada, por isso apenas pessoas com alto nível de procrastinação e de autorregulação marcaram essa opção (Ver tabela 1).

Tabela 1: Parâmetros de discriminação, dificuldade do item e da informação 

Nota: * = Itens representando da dimensão do Adiamento de atividades

Para um maior aprofundamento do quanto cada item contribui, verificamos a curva de informação do item (figura 2), e quanto cada item contribui na proporção da informação do item na formação do traço latente (tabela 1). Como podemos observar por meio da figura 2, o item 1, 8 e 9, apresentam curvas mais achatas, significando que esses itens contribuem pouco em termos de proporção na formação do traço latente. Mas, ao verificarmos a proporção numericamente de cada item, os itens que menos contribuem são os itens 1 e 4, apesar de discriminarem as pessoas e apresentarem dificuldade diferenciada. Isso porque, quanto mais o thetas for baixo no nível dos participantes, mais difícil será as pessoas endossarem altas categorias, isto é, as pessoas não apresentam dificuldade em marcar o item na categoria sempre, afirmando que também deixam as atividades para fazer no último minuto (item 1). Já as pessoas que precisam frequentar as aulas diariamente sentem dificuldade em mudar de categoria de sempre para quase sempre. A categoria mais endossada foi a frequentemente, porém é necessário que as pessoas tenham um nível de thetas altos para endossar essa categoria de respostas, ou seja, é necessário que elas frequentem sempre as aulas, mantendo-se comprometidas com suas atividades acadêmicas. Isso porque, as aulas são regulamentadas para que os alunos possam ter o mínimo de frequência presencial, afim de não serem reprovados e lograr outros semestres sem pendências, por isso, os participantes endossaram mais a categoria sempre. De modo, geral todas as categorias foram endossadas pelos participantes, bem como apresentaram dificuldade variadas entre itens fáceis e difíceis de serem endossados.

Figura 2: Curvas de informação dos itens 

Discussão

Os resultados foram consistentes com a hipótese formulada no início do estudo. Acreditou-se que os fatores subjacentes aos itens seriam formados por dois construtos teóricos: adiamento de atividades e autorregulação acadêmica. Logo, confirmamos a mesma estrutura fatorial validada no Peru, México e Equador (Barraza-Macías & Barraza-Nevárez, 2018; Dominguez-Lara et al., 2014; Moreta-Herrera, & Durán-Rodríguez, 2018), resultando em uma análise confirmatória da estrutura fatorial da Escala de Procrastinação Acadêmica.

Compreende-se que a EPA apresentou boas propriedades psicométricas necessárias para o processo de adaptação e validação para o contexto brasileiro, identificando que o melhor modelo para nossa cultura também é o modelo bidimensional. Ademais, existem aspectos que são muitos parecidos entre as culturas quando se trata da procrastinação.

A partir das comparações estatísticas entre os modelos, observamos que o menor valor do ECVI referente a um índice preditivo (Kline, 2015) e parcimonioso (Schermelleh-Engel et al., 2003) apresenta seu menor valor referente ao modelo bidimensional, isso indica o quão bom um modelo é para prever o futuro, ou seja, podem ser replicados em amostras futuras relacionando com outros construtos (Schermelleh-Engel et al., 2003). Além desse índice, o SRMR também apresentou menor valor nesse modelo bidimensional. Esse índice absoluto indica que no que concerne à relação entre as discrepâncias da covariância preditas e as observadas, quanto menor for o valor, menos resíduos esse modelo terá (Kline, 2015). Logo, observamos que o modelo bidimensional apresentou menor quantidade de resíduos entre os modelos. Ademais, todos os fatores apresentaram consistência interna satisfatórios em todos os coeficientes de análises, theta de armor, alfa de Cronbach e ômega de McDonalds (Dominguez-Lara, 2016b; Kline, 2015).

Além disso, a análise por meio da TRI mostrou que todos os itens discriminam os participantes, isto é, apresentam variações nos padrões de respostas relacionados aos thetas dos indivíduos, indicando que as pessoas distinguem cada item de forma singular por meio do valor da discriminação > 0,60 (Baker, 2001). Os itens também apresentam diferenças quanto a dificuldade dos itens, ou seja, existem os que são mais fáceis de serem endossados como o caso do item 1 “Quando tenho alguma tarefa, normalmente deixo para o último minuto”, como também existem itens que são mais difíceis de não serem endossados como o item 4 “Assisto regularmente as aulas”. De modo geral, todas as categorias foram endossadas pelos participantes, bem como apresentaram dificuldade variadas entre itens fáceis e difíceis de serem endossados (Boateng et al., 2018).

Apesar dos resultados bastante coerentes com as hipóteses do estudo e com a validações feitas no Peru, México e Equador, este estudo não está isento de limitações. A primeira é que a amostra não é equiparada entre os sexos, o que talvez tornasse possível fazer uma análise de invariância quanto aos sexos dos participantes. Estudos futuros poderão testar essa análise. A segunda é que foi realizado em um único estado brasileiro, impossibilitando generalizar os dados para todo o Brasil. Logo, têm-se a necessidade de replicar os dados em outros estados brasileiros. A terceira é a não aplicação da EPA com outras escalas já validadas, o que não permitiu a realização da validade convergente dessa escala, logo, estudos futuros poderão suprir essa limitação, aplicando mais de uma escala de procrastinação, bem como de escalas para realização da validade discriminante.

É importante ressaltar que não se pode negligenciar a desejabilidade social que pode estar subjacente aos padrões das respostas, indicando que as pessoas podem ter refletido sobre a procrastinação e respondido de acordo com o que ele pensa que o pesquisador deseja como resposta. Com isso, estudos experimentais deverão ser aplicados, a fim de reduzir a desejabilidade social. Uma das limitações supridas pelo estudo de Dominguez-Lara (2016a) foi a ampliação para outra cultura que, no presente estudo, foi a brasileira. Mas, entendemos que esse estudo precisa ser desenvolvido para outras categorias profissionais também, assim como foi sugerido por Dominguez-Lara (2016a).

Portanto, a EPA pode servir como ferramenta para se avançar na construção do conhecimento sobre o tema da procrastinação acadêmica. Podendo ser associada com o desempenho escolar, processo de aprendizagens, coeficientes de inteligência e motivações para leituras, dentre outros construtos psicológicos. O conhecimento acerca da procrastinação pode ajudar aos psicólogos a manejar o processo psicoterapêutico de forma mais produtiva para o cliente/paciente, de forma a estimula-os a lidar e superar as dificuldades cotidianas e diminuir a procrastinação que pode ser maléfica tanto para estudantes quanto para profissionais. Os professores também possuem um papel importante, visto que o conhecimento acerca desse fenômeno pode ajudar os alunos a traçarem estratégias de enfrentamento à situação e, assim, conduzir a uma orientação para a resolução das demandas acadêmicas.

Referências

Álvarez, O. (2010). Procrastinación general y académica en una muestra estudiantes de secundaria de Lima. Persona, 13, 159- 177. [ Links ]

Baker, F. B. (2001). The basics of item response theory. Washington, DC: ERIC. [ Links ]

Balkis, M., & Duru, E. (2016). Procrastination, self-regulation failure, academic life satisfaction, and affective well-being: underregulation or misregulation form. European Journal of Psychology of Education, 31, 439-459. http://dx.doi.org/10.1007/s10212-015-0266-5 [ Links ]

Barraza-Macías, A., & Barraza-Nevárez, S. (2018). Evidencias de validez y confiabilidad de la escala de procrastinación académica en una población estudiantil mexicana. Revista de psicología y ciencias del comportamiento de la Unidad Académica de Ciencias Jurídicas y Sociales, 9(1), 75-99. [ Links ]

Boateng, G.O., Neilands, T., Frongillo, E., Melgar-Quiñonez, H., & Young, S. (2018). Best Practices for Developing and Validating Scales for Health, Social, and Behavioral Research: A Primer. Frontiers in Public Health, 6, 149-167. http://dx.doi.org/10.3389/fpubh.2018.00149 [ Links ]

Busko, D. A. (1998). Causes and consequences of perfectionism and procrastination: A structural equation model. Tesis de maestría no publicada. Guelph, Ontario: University of Guelph. [ Links ]

Couto, R.N., Fônseca, P.N., Silva, P.G.N., Medeiros, E. D., & Carvalho, T. A. (2020). Versão brasileira da Tuckman Procrastination Scale: adaptação e evidências psicométricas. Revista Interamericana de psicologia/Interamerican Journal of Psychology, 54(3), 1-17. http://dx.doi.org/10.30849/ripijp.v54i3.863 [ Links ]

Dominguez-Lara, S. A., Villegas, G., & Centeno, S. B. (2014). Procrastinación académica: Validación de una escala en una muestra de estudiantes de una universidad privada. Liberabit, 20(2), 293-304. [ Links ]

Dominguez-Lara, S. (2016a). Datos normativos de la Escala de Procrastinación Académica en estudiantes de psicología de Lima. Evaluar, 16(1), 20-30. http://dx.doi.org/10.35670/1667-4545.v16.n1.15715 [ Links ]

Dominguez-Lara, S. (2016b). Evaluación de la confiabilidad del constructo mediante el coeficiente H: breve revisión conceptual y aplicaciones. Psychologia: Avances de la Disciplina, 10(2), 87-94. https://doi.org/10.21500/19002386.2134 [ Links ]

Dominguez-Lara, S., Navarro-Loli, J. S., & Prada-Chapoñan, R. (2019). Ítem único de autoeficacia académica: evidencias adicionales de validez con el modelo Big Five en estudiantes universitarios. Avaliação Psicológica, 18(2), 210-217. http://dx.doi.org/10.15689/ap.2019.1802.16070.12 [ Links ]

Furlan, L. A., Heredia, D. E., Piemontesi, S. E., Tuckman, B. W. (2012). Análisis factorial confirmatorio de la adaptación argentina de la escala de procrastinación de Tuckman (ATPS). Perspectivas en Psicología: Revista de Psicología y Ciencias Afines, 9(3), 142-149. http://200.0.183.216/revista/index.php/pep/article/view/111Links ]

Geara, G. B., Nunes, C. A. M., Hauck-Filho, N., & Teixeira, M. A. P. (2019). Construção e análise psicométrica de um inventário breve de procrastinação acadêmica. Trends in Psychology, 27(3), 693-706. http://dx.doi.org/10.9788/tp2019.3-07 [ Links ]

Geara, G. B., & Teixeira, M. A. P. (2017). Questionário de Procrastinação Acadêmica - Consequências negativas: Propriedades psicométricas e evidências de validade. Avaliação Psicológica , 16(1), 59-69. http://dx.doi.org/10.15689/ap.2017.1601.07 [ Links ]

Grunschel, C., Schwinger, M., Steinmayr, R., & Fries, S. (2016). Effects of using motivational regulation strategies on students’ academic procrastination, academic performance, and well-being. Learning and Individual Differences, 49, 162-170. http://dx.doi.org/10.1016/j.lindif.2016.06.008 [ Links ]

Kim, K. R., & Seo, E. H. (2015). The relationship between procrastination and academic performance: A meta-analysis. Persona lity and Individual Differences, 82, 26-33. http://dx.doi.org/10.1016/j.paid.2015.02.038 [ Links ]

Kline, R. B. (2015). Principles and practice of structural equation modeling. New York, NY: The Guildford Press. [ Links ]

Klingsieck, K. (2013). Procrastination: When good things don’t come to those who wait. European Psychologist, 18, 24-34. https://doi.org/10.1027/1016-9040/a000138 [ Links ]

Moreta-Herrera, R., & Durán-Rodríguez, T. (2018). Propiedades psicométricas de la Escala de Procrastinación Académica (EPA) en estudiantes de psicología de Ambato, Ecuador. Salud & Sociedad, 9(3), 236-247. https://doi.org/10.22199/S07187475.2018.0003.00003 [ Links ]

Scent, C. L., & Boes, S. R. (2014). Acceptance and commitment training: A brief intervention to reduce procrastination among college students. Journal of College Student Psychotherapy, 28(2), 144-156. https://doi.org/10.1080/87568225.2014.883887 [ Links ]

Schermelleh-Engel, K, Moosbrugger, H., & Müller, H. (2003). Evaluating the fit of structural equation models: Tests of significance and descriptive goodness-of-fit measures. Methods Psychological Research Online, 8(2), 23-74. [ Links ]

Schouwenburg, H. (2004). Procrastination in academic settings: General introduction. In: H. Schouwenburg, C. Lay, P. Timothy & J. Ferrari (Eds.), Counseling the procrastinator in academic settings. (pp.3-18). (s.l.): American Psychological Association. [ Links ]

Silva, P. G. N., Machado, M. de O. S, Oliveira, L. B. S. de, & Fonsêca, P. N. (2020). Motivação para leitura e variáveis sociodemográficas como preditoras da procrastinação acadêmica. Psicología, Conocimiento y Sociedad, 10(1), 139-159. https://dx.doi.org/10.26864/pcs.v10.n1.7 [ Links ]

Soares, A. K. S., Andrade-Filho, J.A.L., Ribeiro, M. G. C., & Rezende, A. T. (2020). Avaliando o papel da procrastinação acadêmica e bem-estar subjetivo na predição da satisfação com o programa de pós-graduação. Ciencias Psicológicas, 14(1), 1-15. https://doi.org/10.22235/cp.v14i1.2078 [ Links ]

Tuckman, B.W. (1990). Group versus goal-setting effects on the self-regulated performance of students differing in selfefficacy. Journal of Experimental Education, 58, 291-298. [ Links ]

Declaração do contributo dos autores GB contribuiu no desenho, implementação da investigação e colaborou na introdução do manuscrito. GB e TT realizaram a metodologia, TT nas análises e TT e SD nas discussões dos resultados. Todos os autores revisaram o artigo para versão final.

Editor de sección El editor de sección de este artículo fue Álvaro Cabana. ORCID ID: 0000-0002-8637-290X

Anexo 1 Escala de procrastinação acadêmica (EPA)

Abaixo você encontrará uma série de perguntas que se referem à sua maneira de estudar. Leia cada frase e responda de acordo com seus últimos 12 meses de sua vida como estudante marcando com um X de acordo com a seguinte escala de classificação:  

Recebido: 21 de Novembro de 2020; Aceito: 26 de Abril de 2021

Creative Commons License Este é um artigo publicado em acesso aberto sob uma licença Creative Commons