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Revista de Ciencias Sociales

versión impresa ISSN 0797-5538versión On-line ISSN 1688-4981

Rev. Cien. Soc. vol.38 no.56 Montevideo  2025  Epub 01-Jun-2025

https://doi.org/10.26489/rvs.v38i56.6 

Artículo

Representantes e representações da Amazônia. Justaposições entre «política» e «cultura»

Representaciones sobre la Amazonía: perfiles parlamentarios y yuxtaposiciones entre «política» y «cultura»

Representations of the Amazon: Parliamentary profiles and juxtapositions between “politics” and “culture”

Eliana Tavares dos Reis1 
http://orcid.org/0000-0001-9357-2339

Igor Gastal Grill2 
http://orcid.org/0000-0003-4285-9684

1 Universidade Federal do Maranhão. Email: eliana.reis@ufma.br

2 Universidade Federal do Maranhão. Email: igor.grill@ufma.br


Resumo

Os profissionais da política interferem no trabalho de representação das «causas» tidas como urgentes e na configuração dos repertórios de ação considerados legítimos. Neste artigo, examinamos perfis e investimentos de parlamentares oriundos de estados da «Amazônia Legal», que se dedicaram à confecção ou administração de bens simbólicos destinadas a «questões da região». Por meio da sociografia de casos (1945-2018) e da análise de trajetórias representativas, propomos apontar processos de diversificação das elites regionais; ponderar sobre as justaposições entre domínios, lógicas e princípios de hierarquização políticos e culturais; e problematizar as ênfases de estudos de porta-vozes e intérpretes autorizados da «região».

Palavras-chave: Parlamentares; perfis; representações; Amazônia

Resumen

Los profesionales de la política interfieren en el trabajo de representación de las «causas» consideradas urgentes y en la configuración de los repertorios de acción considerados legítimos. Examinamos aquí los perfiles y inversiones de parlamentarios originarios de estados de la «Amazonía Legal», que se dedicaron a la creación o administración de bienes simbólicos destinadas a las «cuestiones de la región». Por medio de la sociografía de casos y del análisis de trayectorias representativas, proponemos señalar procesos de diversificación de las élites regionales; reflexionar sobre las yuxtaposiciones entre dominios, lógicas y principios de jerarquización políticos y culturales; y problematizar los énfasis de los estudios sobre portavoces e intérpretes autorizados de la «región».

Palabras clave: Parlamentarios; perfiles; representaciones; Amazonía

Abstract

Professional politicians interfere in the work of representing ‘causes’ understood as urgent as well as in the setting of action repertoires considered to be legitimate. In this article, there will be examinations of profiles and investments by parliamentarians who are native from ‘The Legal Amazon’ and have engaged in the making or management of symbolic goods aimed at ‘issues from the region’. Through the sociography of cases and the analysis of representative trajectories, the purposes are to point out of diversification processes of regional elites; uncover juxtapositions of dominations, rationales and principles of cultural and political hierarchizations; and problematize the emphases of studies from spokespeople and authorized agents of the ‘region’.

Keywords: Parliamentarians; Profiles; Representations; Amazon Rainforest

Introdução

Não é novidade que a Amazônia é objeto de reflexão em distintas tradições disciplinares e alvo de contendas políticas as mais variadas. E, ao longo do tempo, podemos observar o progressivo incremento e matização das discussões travadas nos meios acadêmicos, políticos, midiáticos e da chamada «sociedade civil» acerca das potencialidades e desventuras que afetariam a «região» ou os seus componentes primordiais (natureza, meio ambiente, clima, povos, biodiversidade, riquezas, etc.)1. Entre os múltiplos porta-vozes interpelados a se posicionar sobre essas problemáticas, estão profissionais da política das tantas colorações partidárias-ideológicas, posicionados e posicionando-se em redes interdependentes de força.

Neste artigo, retomamos a problemática das intersecções entre domínios sociais (sobretudo políticos e culturais), para pensar como parlamentares, com determinadas características sociais, interferem no trabalho de representação (em duplo sentido) das «questões» tidas como urgentes, e na configuração dos repertórios de ação considerados legítimos. Consideramos que eles não intervêm em batalhas em torno da Amazônia somente exercendo suas funções legislativas. Isto é, para além da participação discursiva na tribuna; da atuação com vistas à regulamentação ou alteração do conteúdo da legislação no Congresso Nacional; ou das atividades legiferantes, de fiscalização e de intervenção no orçamento (Barros, 2020; Almeida e Sprandel, 2014; Araújo, 2020); produzem/transmitem representações qualificadoras e amplificadoras das características, idiossincrasias, potencialidades, carências, etc., que garantem o caráter de «evidência» da «região» e de si mesmos.

A noção de representação e a categoria «região» estão amarradas neste artigo. Isto é, seguimos as orientações de Bourdieu (2015; 1996), Pollak (1992), Martin (1992) e Bertho (1980) para examinar o duplo trabalho (performativo) de representação dos parlamentares voltados à «região»: categoria tributária do agenciamento de sistemas simbólicos (ideias, versões, concepções e classificações), acionados e disputados por agentes que visam impor sentidos de existência de grupos, comunidades ou questões, bem como o consenso sobre estes sentidos. As operações ativas de fabricação de divisões «regionais» são indissociadas daquelas de construção de memórias coletivas e estão em constante negociação e redefinição. E os/as protagonistas envolvidos, por seus recursos, inscrições e posições, conseguem, com alguma eficácia, exercer a tarefa de representar e produzir representações mediante a designação de fronteiras e de invenção de estereótipos regionais em múltiplos níveis e direções.

Entre os raros estudos que abordam a temática em pauta, são ainda mais escassos aqueles que se debruçam sobre os perfis e sentidos edificados por agentes oriundos de localidades da chamada «Amazônia legal»2. Sendo assim, propomos neste artigo seguir os encaminhamentos de uma sociologia com inspiração no modelo analítico bourdieusiano de construção e tratamento dos fenômenos políticos. Sobretudo, no que diz respeito à análise dos condicionamentos sociais e culturais intervenientes nas disposições, posições e tomadas de posição de porta-vozes autorizados à falar em nome, descrever e prescrever a «verdade» das «regiões» que representam (Bourdieu, 2015; Offerlé, 2017; Le Bart,1998; Lévêque, 1996).

Apresentamos, pois, desdobramentos da pesquisa que abrangeu uma sociografia3 de quase três centenas de casos de parlamentares, atuantes entre 1945-2018, que investiram consistentemente em trunfos políticos e culturais (especialmente na produção editorial). Nossa preocupação desde a origem esteve voltada à dupla representação de agentes cujas carreiras políticas4 estiveram associadas ao reconhecimento como «intelectuais» ou porta-vozes autorizados de causas legítimas (Grill e Reis, 2016). Uma das recorrências localizadas foi a tendência de alguns deles publicarem livros dedicados às suas configurações regionais (Grill e Reis, 2020). A nossa proposta aqui é a de situar especificamente os agentes com origens em estados amazônicos da federação, que investiram na administração de bens simbólicos e destinaram seus posicionamentos a «questões da região», trazendo à superfície princípios de produção/reprodução de representações dominantes. Por meio da análise de quatro perfis biográficos, acreditamos ser possível indicar elementos substantivos dos processos de diferenciação das elites regionais5; ponderar sobre as justaposições entre domínios, lógicas e princípios de hierarquização políticos e culturais; e destacar o lugar de intérpretes não «centrais», mas protagonistas locais dessas lutas6.

Essa pesquisa foi realizada basicamente no período da pandemia de COVID-19 (2019-2020), o que interferiu no recorte e tipo de fontes acessadas, entretanto, sem prejuízo de rigor. Coletamos e examinamos materiais sortidos, principalmente visando a reconstituição dos trajetos considerados representativos de parlamentares brasileiros que, em diversas conjunturas históricas, posicionaram-se sobre suas «regiões». Reunimos bibliografia temática, repertórios ou notas biográficas, currículos, publicações assinadas por parlamentares, sites virtuais de livrarias, textos dos agentes examinados ou sobre eles disponíveis na internet, matérias jornalísticas, webpages, blogs, etc., entre outros.

Sistematizamos as informações em quadros prosopográficos e sinópticos, com base em indicadores pertinentes à problemática de pesquisa aqui em pauta. Por meio do cotejamento de aspectos frequentes e discrepantes, construímos os eixos que estruturam a descrição qualitativa dos dados. E sustentamos a relevância da reflexão sobre quem são os representantes e as representações para descortinar intercruzamentos entre lógicas e domínios políticos e culturais, bem como sua tradução em princípios de hierarquização social.

Políticos profissionais e a gestão de bens simbólicos

Como citamos, examinamos inicialmente um conjunto de deputados/as e senadores/as que, além de intermediadores de demandas materiais e tangíveis, distinguiram-se pela disposição em fornecer fundamentos à designação de grupos, interesses e causas. Entre eles, verificamos a edificação de fronteiras regionais e de toda a sorte de sinais diacríticos operada por líderes políticos no exercício do papel de intermediadores de problemáticas e grupos. Graças a condições favoráveis à fabricação de identificações e à transmutação de atrativos categoriais em fatores constituintes da disputa política, os temas incitados são incorporados à chamada opinião pública ou à agenda de problemáticas políticas legítimas7. Por isso, a relevância da ampliação do horizonte de análise das batalhas e ações políticas, colocando-as no terreno comum dos modos de agir e de pensar nos quais os jogos sociais e políticos são tributários da produção de (di)visões do mundo social. Cabendo indagar sobre os papeis dos empreendedores individuais e coletivos em representação, seus recursos e capacidades para manejar repertórios dessemelhantes8. O que implica considerar o caráter performativo da linguagem política; as lutas simbólicas de classificação; as manipulações das fronteiras entre grupos; os mecanismos de monopolização da palavra e de legitimação dos intérpretes; os processos de institucionalização do capital político; entre outras dimensões (Bourdieu, 2015).

Parlamentares que escrevem sobre a Amazônia

Realizamos um levantamento dos agentes que publicaram textos sobre a região amazônica no período compreendido entre a primeira legislatura eleita pós-estado novo (1945) e a escolhida nas eleições de 2018. Identificamos 98 deputados/as e/ou senadores/as que lançaram 333 livros (ver Anexo 1). A Tabela 1 sistematiza a distribuição de casos pelas unidades federativas da Amazônia Legal, a quantidade de títulos encontrados e a recorrência de parlamentares com 3 ou mais livros em cada bancada estadual.

Tabela 1: Distribuição de deputados e volume de publicações por estados 

Fonte: elaborada pelos autores

Os dados apontam à significativa concentração de casos no Pará, Amazonas e Acre (nesta ordem). Nesses estados está localizada parte considerável dos porta-vozes da Amazônia no Congresso Nacional. Essa frequência pode estar relacionada ao fato de contarem com universidades e lideranças políticas de maior relevo no contexto nacional, e de serem os três estados originalmente constituidores da «região» e com as maiores bancadas na Câmara dos Deputados9.

O segundo procedimento foi classificar os livros assinados pelos parlamentares por gêneros de escrita10 e por temas. Observando títulos, sinopses e classificações em livrarias virtuais, matérias jornalísticas, resumos e comentários encontrados na internet, chegamos à quantificação apresentada na Tabela 2.

Tabela 2: Gêneros e temáticas prevalecentes 

Fonte: elaborada pelos autores

O terceiro procedimento foi correlacionar os gêneros de escrita e os temas diletos com as décadas de nascimento dos parlamentares. O objetivo foi detectar possíveis modificações de ênfases ao longo do tempo, conforme os períodos de atuação dos agentes. (Tabela 3)

Tabela 3: Gêneros e temas por décadas de nascimento: 

Fonte: elaborada pelos autores

Os gêneros de escrita reproduzem padrões gerais11. Os nascidos até a década de 1930 publicavam mais sistemática e predominantemente sobre generalidades, ocorrendo investimentos na publicação de biografias históricas, literatura e confissões políticas. Entre os que nasceram a partir de então, junto com o progressivo arrefecimento do investimento na produção de livros, houve o crescimento do tipo setorializado, que passou a dividir as predileções com os escritos generalistas. Aparentemente, as biografias históricas mantiveram alguma estabilidade, enquanto os demais tipos decresceram. Relativamente aos temas preferidos, fitando somente o quadro, avaliamos que não ocorreram grandes variações. No entanto, realçamos o declínio das questões políticas institucionais (partidos, eleições, etc.) entre os que nasceram em 1940 (e possivelmente inauguraram seus engajamentos políticos a partir da década de 1960). Apesar do relativo avanço da atenção conferida às questões econômicas para os nascidos na década de 1930, há diferenças de ênfases com relação às gerações anteriores, sobretudo tangentes aos debates acerca das virtudes ou obstáculo do «desenvolvimento». O «meio ambiente» parece relativamente constante, mas vemos uma frequência mais forte nos extremos. Nesse caso, vale lembrar que para aqueles nascidos antes da década de 1920, essa temática era comumente associada a um caráter idílico, romântico e dual do «mundo natural»; enquanto, mais recentemente, ela é definida por registros mais acadêmicos e especializados (amalgamados aos militantes) do que diletantes.

O mapeamento de 98 parlamentares permitiu circunscrever uma coleção de 30 casos de agentes que, de forma mais consistente, combinam carreiras políticas longevas e significativas inserções culturais, operando o duplo trabalho (político e intelectual) de representação da «região» (ver Anexo 1). Recorremos à análise sociográfica para caracterizá-los um pouco mais precisamente.

Apenas duas mulheres corresponderam a tais critérios. Para o conjunto, a distribuição dos estados de origem é: Pará (12), Amazonas (07) e Acre (05) - acompanhando a tendência já apontada -, seguidos por Maranhão (03), Mato Grosso (02) e Amapá (01). 26 deles possuem título superior e 04 estudaram até o ensino médio. 16 são formados em direito, 04 em engenharia, 03 em economia, 01 em medicina, 01 em arquitetura e 01 em história. Para a principal profissão, identificamos 11 professores, 07 funcionários públicos, 07 empresários e 05 exercendo atividades de cunho jurídico (advogados, promotores e juízes).

Quanto ao tempo de ocupação de cargos políticos (eletivos e administrativos), 14 somam mais de 30 anos de exercício de atribuições públicas, 06 mais de 20 anos e 10 mais de 12 anos. Ressaltamos ainda que: 12 chegaram ao posto de governador, 13 ao de senador; 10 foram prefeitos das cidades mais importantes da «região»; 04 foram ministros de estado, 12 secretários estaduais e 19 passaram por cargos de primeiro escalão em governos federais e estaduais.

As inscrições políticas se mesclam com as notabilidades alcançadas (em distintos graus e alcances, regionais ou nacionais) como autores de livros. Contabilizando somente os títulos sobre a Amazônia, localizamos mais de 08 publicações para 08 parlamentares; mais de 06 para outros 08; e entre 03 e 06 textos para os 14 demais. Ao que deve ser conjugado outras inserções culturais, que colaboram na apreensão das imbricações entre domínios e lógicas de atuação: 06 compõem Academias de Letras; 05 são membros de institutos históricos e geográficos estaduais; 16 atuaram em jornais; 08 ministraram aulas em universidades; 03 estiveram na direção de institutos partidários; e 09 participaram de órgãos responsáveis pela representação de categorias profissionais. Quando atentamos à conexão entre publicações e biografias, temos que para 12 agentes ela é majoritariamente respaldada por experiências em cargos políticos; para 06 pelas atividades profissionais exercidas; e para 12 são alicerçadas no reconhecimento desfrutado como portadores de uma «cultura geral».

O largo recorte temporal adotado possibilitou reparar em variações diacrônicas relativas aos perfis, conforme os períodos de nascimento e de ingresso na arena política (ano que ocupou o primeiro cargo); aos tipos de postos políticos e administrativos desempenhados e às filiações partidárias/ideológicas; aos investimentos escolares e as inserções culturais; e à publicação de textos como estratégia consagrada às tomadas de posição sobre a Amazônia.

Os dados sugerem que, quanto mais recuamos no tempo, mais encontramos agentes ligados a partidos que usualmente são localizados à direita do espectro político ideológico e com carreiras políticas que iniciam através do pertencimento a redes de políticos estabelecidos, e culminam na deputação federal e/ou cargos administrativos (como secretarias de estado e postos de primeiro escalão em governos). Contudo, paulatinamente, ocorre a diversificação de siglas partidárias com a presença de partidos tidos como de centro e esquerda; com o fortalecimento das redes tecidas nessas organizações e em outras formas de associativismos (de diferentes tendências); e as chegadas a governos de estado e a altos postos administrativos federais.

Os parlamentares ativos até meados do século XX são majoritariamente oriundos de famílias tradicionais, formados em direito e exerceram profissões jurídicas e no funcionalismo público. Eles monopolizaram múltiplas inscrições culturais (com destaque à participação em jornais, institutos históricos e academias de letras), e concentram alto volume de publicações de todos os gêneros (mais frequentemente do tipo histórico e generalista), com temáticas variadas e reconhecimentos pela posse de erudição cultural distintiva12.

Conforme nos aproximamos no tempo, apuramos o relativo incremento da diversificação nos diplomas obtidos (em menor medida) e nas ocupações exercidas (em maior grau), com frequência marcante de docentes e empresários. Enfraquecem-se as inserções culturais - mesmo que persistindo as abundantes, porém reconfiguradas, formas de intervenções midiáticas e participações em domínios de pesquisa, formulação e consagração intelectual - e as variações nos gêneros de escrita. Os registros das tomadas de posição são cada vez mais esteados nas experiências de cargos políticos ocupados, base fundamental da autoridade dos agentes a fabricar narrativas diversas sobre «política», «economia», «história» e «meio ambiente».

Vale assinalar que, nas últimas décadas, os amálgamas entre inscrições políticas e culturais são evidenciados também nas articulações entre: peso da vinculação a causas e teias militantes de movimentos sociais, sindicais e/ou Ongs; uso de redes sociais virtuais como canais privilegiados de formação/divulgação de posicionamentos; desempenho de ocupações e obtenção de formações escolares nas áreas de ciências humanas e economia, com maiores investimentos em pós-graduações (especializações, mestrados e doutorados realizados geralmente no país, desde os anos 1970); fraco volume de livros publicados (com exceção de perfis mais acadêmicos); avanço do tratamento especializado de problemáticas sociais/identitárias específicas (por exemplo, questões ambientais, gênero, raça, etc.), preferencialmente autorizadas por atestações militantes ou corporativistas, e certificados em títulos escolares e atuações profissionais.

Perfis representativos

Optamos por tracejar notas biográficas de representantes do Amazonas, do Acre e do Pará (estados que reúnem o maior número de casos), que atuaram politicamente entre o início dos anos 1960 ao final do século XX, e após a chamada «redemocratização», em especial no século XXI. Essa coleção de parlamentares permite qualificar as bases articuladas de reconhecimentos de agentes autorizados ao exercício de papeis de intérpretes de questões atinentes à «região», da qual são originários. E evidenciar indícios dos processos de reconfiguração, que abarcaram perfis, questões tomadas como legítimas e intersecções entre domínios e lógicas políticos e culturais13.

Filho de mãe indígena e pai do Ceará, Gilberto Mestrinho de Medeiros Raposo nasceu (1928) em Manaus (Amazonas). Ele cresceu no munícipio de Lábrea, às margens do Rio Purus.

Essa origem é ativada na reivindicação: «Toda a minha autoridade em falar sobre a Amazônia provem de minha vivência cotidiana com a floresta (...)». Acrescentando: «Essa vivência somada à minha formação pessoal e cultural permitiu a sistematização do meu conhecimento sobre a questão amazônica e aprimorar-se o que eu chamo de sentimento caboclo» (entrevista ao historiador Alfredo Lopes, em 16/04/9414).

Conhecido como «Professor» e descrito «por sua fala mansa, típica do caboclo amazonense», Mestrinho estudou na capital até o chamado secundário e foi professor de ensino médio e funcionário público (agente fiscal). Em 1957, aos 29 anos, foi nomeado prefeito de Manaus, pelo então governador, acumulado ao cargo de Secretário Estadual de Economia e Finanças. Logo em seguida, elegeu-se governador e, em 1963, chegou à Câmara dos Deputados (em ambas as eleições concorrendo pelo Partido Trabalhista Brasileiro) representando o território federal do Rio Branco (atual estado de Roraima). Nesse período contava com significativo patrimônio econômico (ações em empresas e fazendas), e estendeu sua influência na «região amazônica», passando a administrar vários empreendimentos no estado do Pará.

Com mandato político cassado em 196415, ele se deslocou para o Rio de Janeiro, onde diversificou ainda mais seus empreendimentos como empresário ao fundar uma indústria de tintas e revestimentos. Em 1979, com a anistia16, retomou a carreira política e se elegeu governador do Amazonas em dois pleitos (1982 e 1990), pelo Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB). Sua primeira gestão à frente do governo do estado foi marcada pela defesa do desmatamento e de incentivos para a Zona Franca de Manaus (ZFM)17. Já na segunda gestão, observamos uma mudança nos seus posicionamentos, agora em nome da proteção do meio ambiente. Chegou a estabelecer convênio com o Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) para pesquisas e preservação do potencial natural a partir da criação de um centro de biotecnologia na Amazônia. No final do mandato, em 1994, publicou o seu principal texto (de um total de seis dedicados à Amazônia), intitulado «Amazônia- Terra Verde: Sonho da Humanidade» (Editora Três), no qual explicita essa nova postura. Foi também senador (1999 e 2006). Um dos seus filhos foi deputado federal e suplente de senador.

Considerado um dos «ícones da história política do estado do Amazonas» e um dos «homens que trouxe grande influência e transformou o cenário político amazonense»18, Mestrinho faleceu (2009) aos 81 anos de idade. Em seu enterro, foi cantado um dos jingles mais conhecidos de suas campanhas, «O feitiço do boto navegador», que faz alusão ao seu apelido de «boto tucuxi», e explora alguns trunfos que mobilizava em pleitos eleitorais, como a familiaridade com a floresta, a experiência administrativa e o conhecimento dos «rumos» para a «região». A letra diz:

Pelo rio o caboclo navega sem medo. Vê arara, uirapuru, boto e tucunaré. E na terra tem tudo o que se imaginar. Da floresta das lendas encantar. Tanta vida nos braços do meu rio mar Amazonas... Apontou um rumo certo vamos navegar. No feitiço do boto navegador. Quem é mestre será mestre o meu governador. Rumo certo com Gilberto, com ele é que eu vou. Gilberto já! Quem é mestre, será mestre, o meu governador.

Como um «personagem mítico, para não dizer lendário», a narrativa em torno do «professor» espelharia as marcas de uma interpretação reincidente acerca do «passado de um estado federado que enfrentou grandes dificuldades de ordens econômicas e sociais desencadeadas» (Torres, 2009, p.19). Sobretudo, pelo «declínio da economia gomífera nos anos 1950», com «rápido reaquecimento» decorrente do «esforço de guerra, conhecido como campanha do soldado da borracha»19, e contundentemente marcado, na década de 1980, pela «reorganização da Zona Franca de Manaus» (Idem). Seu perfil «empreendedor» e que conquistou ascensão social, associado à sua vinculação ao que é considerado mais «típico» ou «genuíno» da Amazônia (florestas, rios, lendas, caboclos, botos, etc.), explicitam bases de clivagens recorrentes envolvendo concepções, por um lado, de «desenvolvimento», e, por outro lado, de imperativa manutenção da «riqueza natural» e da «tradição cultural». Tensão evidenciada na própria mudança de postura do agente entre uma passagem pelo governo do estado e a outra.

O filho de seringueiro nascido no Acre20 (quase 10 anos depois de Mestrinho), Aluízio Bezerra de Oliveira (1938-2019), no início da sua carreira, atuou como técnico legislativo na Câmara dos Deputados. Simultaneamente, investiu nas formações em Direito pela Universidade de Brasília (1969) - fez especialização na mesma área e instituição (1973) e doutorado em Direito Internacional e relações internacionais obtido na Sorbonne/Paris (1978) -, e em administração (curso concluído no Centro de Ensino Unificado de Brasília).

Durante sua juventude, ele foi militante do Partido Comunista do Brasil (PCdoB) e se filiou ao Movimento Democrático Brasileiro (MDB). Por essa legenda, concorreu a deputado federal, em 1974, ficando na primeira suplência. Depois, em 1979, assumiu o primeiro mandato parlamentar, reelegendo-se em 1982 pelo Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), do qual compunha a chamada «ala histórica do partido». No final do segundo mandato, presidiu a Subcomissão sobre a Devastação da Amazônia, que vinha como tentativa de contemplar o debate internacional que, na década de 1980, denunciava os impactos ambientais do desmatamento da Amazônia, não raro atribuindo às ações de madeiros e, principalmente, de pecuaristas impulsionados pelo modelo de desenvolvimento econômico conduzido pelo governo militar (1964-1985)21.

Aluízio Bezerra foi senador pelo Acre (elegendo-se em 1986 e em 1994), publicou uma coletânea de pronunciamentos feitos no Congresso Nacional (1979 e 1986) e uma série de textos como: «Virada para o Pacífico: a participação do Acre na integração latino-americana» (1986); «A Luta de Chico Mendes» (1989), e «A defesa da Amazônia exige transformações sociais» (1989). O primeiro livro («Virada...») tratou de uma das principais causas defendidas como parlamentar: a integração entre o Brasil e o Peru, através do estado do Acre22.

Ele não teve êxito na tentativa de reeleição ao senado (1994), mas chegou à prefeitura de sua cidade natal, Cruzeiro do Sul (1997-2000). Além de atuar nas campanhas da esposa, eleita três vezes deputada federal (1991-1999) e também prefeita de Cruzeiro do Sul (2005-2008). Paralelamente, Bezerra se dedicou à TV e rádios AM e FM Integração, de sua propriedade.

Nas homenagens póstumas que recebeu de lideranças de partidos de diferentes colorações, foi lembrado como «‘General da Borracha’, pois era conhecido pela sua luta em favor dos soldados da borracha» (Major Rocha/PSL), e como «autor da emenda constitucional que permitiu o atual pagamento de pensão vitalícia no valor de dois salários mínimos para os chamados ‘Soldados da Borracha’» (Perpétua Almeida/PCdoB)23.

Em contraste com o perfil de Mestrinho, Aluísio Bezerra tinha pós-graduação em um curso e instituição estrangeira renomados. Inicialmente militante comunista, o ingresso na carreira de ocupação de postos eletivos se deu em um contexto de afirmação do MDB como partido de oposição efetiva ao regime militar, e crescentemente viável do ponto de vista eleitoral24. O principal trabalho publicado reforça a ênfase nas inserções internacionais (pessoais e regionais), bem como os investimentos em telecomunicações apontam à diversificação dos perfis em marcha.

Fernando Coutinho Jorge também nasceu no final da década de 1930 (1939-2019), contudo, construiu sua carreira política-eletiva a partir do destaque alcançado como economista, professor universitário e gestor na área de planejamento público. Natural de Belém (Pará), é filho de um empresário do setor dos transportes, que se casara com a herdeira de uma tradicional família da mesma capital. Graduou-se em economia (1967) pela Universidade Federal do Pará (UFPA) e, em seguida, fez pós-graduação em Santiago do Chile, pelo Instituto Latinoamericano y Del Caribe de Planificación Económica y social (ILPES), em curso voltado ao planejamento do desenvolvimento de países subdesenvolvidos. Quando retornou ao Brasil, lecionou na faculdade de Economia da UFPA - na qual integrou o Núcleo de Altos Estudos Amazônicos (NAEA)25 - e publicou «Hipótese do desenvolvimento e programa de trabalho para Belém» (1971), «Necessidade do planejamento urbano e criação da Codem» (1971) e «Diagnóstico econômico da Amazônia» (1971/1972). Ele coordenou o Laboratório de Pesquisa do Programa Internacional de Formação de Especialistas em Desenvolvimento de Áreas Amazônicas. Em 1975, assumiu a função de diretor-geral do Instituto de Desenvolvimento Econômico e Social do Pará (Idesp).

Na sequência, Coutinho Jorge (como é conhecido) ocupou o posto de secretário de Planejamento e Coordenação Geral (1975-1983) nos governos de Aluísio Chaves e Alacid Nunes (políticos ligados à Aliança Renovadora Nacional/ARENA, eleitos indiretamente governadores do estado). Segundo o jornalista Lúcio Flávio Pinto26 (responsável pelo blog «A agenda amazônica de um jornalismo de combate»), Coutinho teria agregado, à época, «alguns dos melhores intelectuais da praça naquele período (...), principalmente economistas, apoiando-os e dando-lhes liberdade de pensamento e expressão», bem como constituído um «território diplomático de uma usina de ideias sobre como desenvolver o Estado»27. Ele ainda era secretário quando escreveu: «A estratégia de planejamento do estado do Pará frente ao II PND» (1975); «Fundos estaduais de desenvolvimento» (1977); e «I Plano de Diretrizes e Estratégias - PDE» (1978/1979).

Subsequentemente, exerceu os mandatos eletivos na Câmara dos Deputados (1983-1985) e no senado Federal (1991-1992 e 1994-1998), pelo Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB); funções alternadas com as de prefeito de Belém (1986-1988) e de ministro da Amazônia Legal e do Meio-Ambiente (1992-1993). Nesse período, publicou: «Política de meio ambiente e recursos naturais para o Brasil. Nova República» (1984); «Plano global de Belém. 1985/88» (1985); «Relatório final. Comissão Temporária da ECO-92. Atuação parlamentar» (1996); «Privatização da Vale do Rio Doce» (1997) e Seleção de Pronunciamento (1998). Coutinho Jorge foi Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (1998 e 2009) e, depois, voltou ao magistério superior, afastando-se da atividade político-partidária

As origens sociais, formações, publicações e inscrições de Coutinho Jorge são representativas de perfis de agentes que tendem a acionar seus trunfos academicamente especializados à produção e legitimação de discursos com registros mais planificados (ou planificadores) de interpretação e intervenção. Perfil oposto ao de Maria Osmarina Silva de Sousa, nascida (1958) no Acre e em uma família de seringueiros (como Aluízio Bezerra).

Marina Silva (como é conhecida) é uma das parlamentares brasileiras mais notabilizadas por sua origem na «região» e pela «defesa da Amazônia» e de causas que lhes são associadas. A própria (auto) construção da sua imagem política passa pela afirmação e uso dessas (auto) identificações. Na biografia disponível na sua webpage há referências à relação com Chico Mendes (seringueiro, líder do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Xapuri) e à inserção nas «lutas sociais» e de «resistência contra o desmatamento»; bem como às doenças que a acometeram ao longo da vida; ao trabalho como empregada doméstica; ao fato de ter desejado ser freira (morou durante dois anos em um convento); ao início do engajamento nas Comunidades Eclesiais de Base (CEBs); até a realização de curso de liderança sindical rural28.

Em 1984, Marina e Chico Mendes29 fundaram e coordenaram a Central Única dos Trabalhadores (CUT) naquele estado, da qual ela foi vice coordenadora até 1986. No ano seguinte, filiou-se ao Partido dos Trabalhadores (PT), fundado no início dos anos 1980, por lideranças envolvidas tanto nas disputas entre posseiros locais e agropecuaristas como nas preocupações de integração, sobretudo de seringueiros e ribeirinhos expulsos dos seringais, na cidade30. Segundo Fernandes (1999, p. 64), a base social do partido era composta por «cerca de 30 mil trabalhadores sindicalizados», predominantemente do meio rural, sendo 80% de camponeses e 20% de população urbana. O que só teria se alterado com a eleição de Marina à vereança de Rio Branco, em 1988 (Morais, 2016, p. 180-181).

Marina Silva foi eleita vereadora no mesmo ano do assassinato de Chico Mendes (personagem da qual retira dividendos políticos pela vinculação ao seu carisma)31. Elegeu-se deputada estadual (1991-1994) e, com 35 anos, conquistou o mandato como Senadora (1995-2002; 2008-2010). Depois de ser Ministra do Meio Ambiente durante o governo de Luís Inácio Lula da Silva (2003-2008), saiu do PT em 2009. Filiou-se ao Partido Verde (PV) e, em 2010, concorreu, sem êxito, à presidência da República. Em 2014, quando estava filiada ao Partido Socialista Brasileiro (PSB), perdeu outra eleição para o mesmo cargo32. Nesse ano passou a ministrar aulas na Fundação Dom Cabral e, em 2015, conseguiu o registro do seu atual partido, Rede Sustentabilidade, pelo qual disputou as eleições presidenciais, em 2018, novamente sem sucesso. Recebeu uma série de honrarias internacionais, principalmente de personalidades políticas e instituições/órgãos norte-americanos, consagrando sua representatividade entre seringueiros e índios, sobretudo, pela militância «ambientalista» ou «ecológica» junto à Amazônia.

Ela fez o Mobral33, licenciatura em História (Universidade Federal do Acre) - período no qual participou do Partido Revolucionário Comunista (PRC) - e pós-graduações em Teoria Psicanalítica (Universidade de Brasília) e em Psicopedagogia (Universidade Católica de Brasília). Atuou como professora de história da rede pública estadual e integrou o movimento sindical dos professores. Publicou: «História da hanseníase no Brasil»; «Acesso a recursos genéticos: o Brasil protege o conhecimento tradicional?»; «O desafio da sustentabilidade: um debate socioambiental no Brasil»34. E, nos últimos anos, investiu na manutenção e postagens em blogs e redes sociais .

A carreira de Marina Silva é contundentemente construída nas reconfigurações dos jogos políticos, sociais, culturais e ambientais intensificadas, em especial, nas últimas décadas do século XX. Aglutinando dimensões de uma mulher outsider, com origens sociais modestas, formação e disposição religiosa, engajamentos associativistas, entre outros que garantem sua condição de intermediadora da «região», com reconhecimento internacional. De tal forma que, com as controvérsias mais recentes em torno das questões ambientais e emergências climáticas - que se intensificaram com a gestão bolsonarista do país (2019-2022)35 -, a indicação do seu nome como ministra de Meio Ambiente e Mudança do Clima no terceiro mandato à Presidência da República conquistado por Luiz Inácio Lula da Silva, do PT (2023-presente), constituiu-se em estratégia fundamental na tentativa de retomada da credibilidade do país na condução dessas problemáticas, inclusive no plano internacional.

Considerações finais

Em que pese a fartura de trabalhos nas ciências humanas e sociais abordando questões relacionadas à Amazônia, raramente os representantes políticos ocupam lugar central nos objetos de análise. Todavia, seus perfis (sociais, políticos e culturais), circulações (em domínios militantes, empresariais, religiosos, acadêmicos, midiáticos, entre outros) e os posicionamentos assumidos permitem verificar os efeitos performativos de discursos sobre a «região». Isso reverbera no delineamento de fronteiras, formas de classificação e de identificação, alicerçamento de problemas sociais considerados urgentes, injunções para adequações às linguagens e às modalidades de atuação legítimos.

O que é ainda mais significativo quando tratamos de agentes originários dessas configurações regionais, que tentam acumular trunfos e bens simbólicos compatíveis com os critérios de legitimação dominantes, a um só tempo, políticos, culturais, econômicos e sociais. Porém, não sem condições de se esgueirar dos constrangimentos, que claramente os limitam aos espaços de possíveis «regionais». Três apontamentos derivados dessa reflexão podem ser acentuados.

O primeiro, mais geral, diz respeito à confirmação de que, ao longo do tempo, ocorre a diversificação dos perfis de parlamentares que, originalmente, ostentavam um saber ilustrado e genérico (diletante) e, progressivamente, seguem percursos mais predominantemente militantes e carreiras eletivas, apropriando-se (mesmo que ainda precariamente) de conhecimentos letrados e especializados (setorializados). Porém, mais do que uma oposição entre «tradicionais» e «modernos», tratam-se de justaposições dos registros que conferem autoridade a lideranças inscritas em domínios culturais e políticos para se posicionarem sobre a Amazônia.

O segundo informa as variações entre as «elites» políticas e culturais dos diferentes estados da «Amazônia legal» e a falácia de uma classificação reificante e homogeneizante. A posição de intérprete da história econômica, cultural e social da Amazônia é fonte de créditos e de reputações, tanto quanto de ambivalências em lidar com identidades em múltiplos e até conflitantes níveis (relacionados às histórias de cada estado, das integrações à «região», das lutas de fronteiras nacionais e internacionais, das biografias e interesses específicos, da sustentação de posições de representação política, etc.).

Os casos de parlamentares examinados neste artigo, atuantes no Amazonas, no Pará e no Acre, ilustram ênfases diversas empregadas nos posicionamentos. Aderindo à uma padronização (sempre redutora), observamos preocupações econômicas (no primeiro), acadêmicas (no segunto), e o peso da origem social e tutela de problemáticas que os associam aos chamados «povos da Amazônia» (para último).

O terceiro e último apontamento convida a pensar na hierarquia das posições e dos reconhecimentos à autoridade legítima para definir a «região» e suas questões. Deixamos em aberto a necessidade de compreender a desigual distribuição do lugar de porta-vozes de versões autorizadas, que abrange os representantes políticos nascidos nos estados da «Amazônia Legal», assim como os pesquisadores e intelectuais localizados nesses estados, em relação àqueles bem posicionados situados em outras configurações regionais (centrais e tidas como «nacionais»). Um estudo desse tipo, provavelmente evidencie o equilíbrio desigual da balança do poder (Elias, 1999), daquilo que é considerado como «questões regionais» ou «periféricas», e aquelas que podem ser percebidas como inscritas no discurso hegemônico da agenda mundial acerca da biodiversidade, dos socioambientalismos, das urgências de preservações de florestas e povos, das ameaças a existência humana, etc., uma que definidas a partir dos «centros».

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Nota Eliana Tavares dos Reis: Professora Associada e Pesquisadora da Universidade Federal do Maranhão. Vinculada ao Programa de Pós-graduação em Ciências Sociais (PPGCSoc, UFMA, Brasil). Coordenadora do Laboratório de Estudos sobre Elites Políticas e culturais (LEEPOC). Igor Gastal Grill: Professor Titular e Pesquisador da Universidade Federal do Maranhão. Vinculado ao Programa de Pós-graduação em Ciências Sociais (PPGCSoc, UFMA, Brasil). Coordenador do Laboratório de Estudos sobre Elites Políticas e culturais (LEEPOC).

Contribución de autoría (Taxonomía CRediT): Eliana Tavares dos Reis: conceptualización, curación de datos, análisis formal, investigación, metodología, redacción-borrador original, redacción-revisión y edición. Igor Gastal Grill: conceptualización, curación de datos, análisis formal, investigación, metodología, redacción-borrador original, redacción-revisión y edición.

Disponibilidad de datos El conjunto de datos que apoya los resultados de este estudio no se encuentra disponible.

1Em artigo anterior, examinamos detalhadamente as contendas acerca da Amazônia, englobando lideranças de frentes parlamentares, veículos midiáticos e grupos de interesse diversos. Ver Grill e Reis (2021).

2A área tem atualmente 5.217.423 km² (comporta 61% do território brasileiro), contemplando os estados do Acre, Amazonas, Rondônia, Roraima («Amazônia ocidental»), Pará, Amapá, Maranhão, Tocantins e Mato Grosso («Amazônia oriental»). Eles foram anexados em distintas conjunturas de luta política e econômica por suas fronteiras e acesso a recursos. Estão em divisas com a parte «internacional» constituída de «regiões» localizadas em outros oito países: Bolívia, Peru, Equador, Colômbia, Venezuela, Guiana, Guiana Francesa e Suriname. O que também se constitui em fonte histórica de conflitos, dilemas e interesses.

3Aplicamos o método sociográfico seguindo as indicações de Pierre Bourdieu sobre a importância de situar as condições objetivas dos agentes envolvidos em sistemas relacionais de força. Mapeamos, em pesquisa mais ampla e a partir de fontes variadas, 299 casos de parlamentares, que foram agrupados em quadros a partir de dados de: origem geográfica, características dos ascendentes, investimentos escolares e profissionais, períodos de atuação, cargos políticos ocupados, inscrição em instâncias de consagração intelectuais, entre outros. O que permitiu verificar regularidades e discrepâncias nos perfis políticos e culturais, bem como delimitar universos empíricos mais precisos. Ver Grill e Reis (2016).

4Esclarecemos que adotamos uma noção de carreira política definida nos marcos da sociologia política de tradição bourdieusiana, isto é, que prioriza a análise dos desdobramentos sucessivos de posições e posicionamentos, relacional e correncialmente assumidos por determinados agentes no decorrerdas suas trajetórias sociais, atentando às inscrições em múltiplos espaços sociais e às multiposicionalidades assumidas.

5Utilizamos a noção de elite de forma não substancializada, quer dizer, antes que um grupo homogêneo, fixo, reificado e antropomorfizado, interessa-nos perscrutar os recursos e os princípios de legitimação em pauta nas relações de forças entre especialistas em dado domínio social, assim como as bases sociais e as estratégias discursivas mobilizadas com vistas à busca de reconhecimento junto aos profanos. Ver Grill e Reis (2016).

6Uma sustentação da ideia de existência preponderante de justaposições entre lógicas e domínios sociais, que se reflete no papel central dos intépretes e mediadores, encontra-se em Reis e Grill (2023) e Grill e Reis (2018).

7Mecanismo descrito por Pizzorno (1986) e Bourdieu (1981).

8Sobre a transfiguração dos problemas sociais em problemática política legítima, ver Gaxie, Collovald, Gaïti, Lehingue (1990).

9Tocantins, Roraima, Rondônia e Amapá são da década de 1980; parte do território do Maranhão faz parte do Nordeste; e o Mato Grosso abrange grande parte do Pantanal (território no qual, afora o bioma amazônico, há os do cerrado e mata atlântica), possivelmente, dispersando a atenção dos representantes.

10Utilizamos a classificação de Le Bart (1998), que caracteriza os tipos de escrita: generalista: discussão de projetos de sociedade (nação, região, democracia, etc.); setorial: mobilizando saberes científicos e acadêmicos, ligados a determinada formação superior; biografias históricas: descrições de eventos, personalidades, etc.; confissões: narrativas autobiográfica e memórias de vida; e literatura: abarcando escritos de contos, romances, poemas, etc.

11Verificados, expostos e analisados em Grill e Reis (2016).

12É importante realçar que esse perfil de agentes, marcado pelo aristocratismo ilustrado (Coradini, 1998), quer dizer, por posição social de origem alta, entronização em vários «panteões» e personificação de uma cultura erudita e genérica, tem a presença na política «amazônica» arrefecida a partir dos anos 1950, tornando-se praticamente residual com o passar das décadas.

13É importante assinalar que utilizamos, como critério para a escolha de casos ilustrativos dos padrões a serem examinados mais detidamente, a combinação de carreiras políticas longevas, protagonismos na política estadual e nacional e reconhecimento enquanto intelectuais. Por isso, não necessariamente selecionamos os agentes com o maior número de produções escritas ou de anos de mandatos.

14Disponível em socioambiental.org, acesso em 26 de janeiro de 2021.

15Em abril de 1964, quando iniciou o regime militar brasileiro, foi publicado Ato Institucional nº 1 com a primeira lista de políticos que tiveram seus mandatos cassados e a suspensão de direitos políticos.

16Em 28 de agosto de 1979 foi promulgada a Lei n.º 6.683, que concede «Anistia a todos quantos, no período compreendido entre 02 de setembro de 1961 e 15 de agosto de 1979, cometeram crimes políticos ou conexo com estes, crimes eleitorais, aos que tiveram seus direitos políticos suspensos e aos servidores da Administração Direta e Indireta, de fundações vinculadas ao poder público, aos Servidores dos Poderes Legislativo e Judiciário, aos Militares e aos dirigentes e representantes sindicais, punidos com fundamento em Atos Institucionais e Complementares» (Art. 1). https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6683.htm acesso em 11 de setembro de 2024.

17Sobre «modelo da Zona Franca», como parte das estratégias de inserção do país na «ordem econômica mundial», e como «o caso mais paradigmático, e relativamente exitoso, entre os projetos planificados desde o Estado federal do Brasil, com o discurso de buscar o desenvolvimento da Amazônia», ver Alvarez (2016, pp. 125-126).

19Deflagrada quando trabalhadores e famílias nordestinas foram enviadas ao estado para trabalhar na extração do látex, que serviria de matéria-prima a ser enviada aos EUA, no âmbito dos Acordos de Washington. O fim era o abastecimento da indústria bélica norte-americana durante a segunda Guerra Mundial. Sobre os «soldados da borracha», seus sofrimentos e o «esquecimento» na história brasileira, ver Araújo e Neves (2015).

20Os processos de configuração urbana, econômica e as divisas do Acre, teriam sido tributários da migração de nordestinos, particularmente cearenses, dispostos a se dedicar ao extrativismo do látex. Nesse processo, na sua gênese, deu-se o delineamento de uma «sociedade padrão da borracha» e da luta pela edificação de uma «nova unidade territorial brasileira» (Morais, 2016, p. 31).

21Lembrando que a importação do modelo de agribusiness (na gênese do «agronegócio») teria ocorrido entre o final dos anos 1960 e início dos 70 (Grynszpan, 2012). Segundo Lenzi (2006), desde a recessão europeia dos anos 1970, os arranjos econômicos e a preservação do meio ambiente foram conciliados com vistas a fundar credibilidades mútuas. E o resultado dos embates teria sido a articulação entre preocupação «ecológica» ou «ambiental» e crescimento econômico, sintetizada na ideia de «desenvolvimento sustentável» (Zhouri, 2006).

22A maior parte (quase 72%) da linha de fronteira internacional acreana (que tem 2.183 km de extensão) é com o Peru. Para entender a gama de «fatores que regulam formal e informalmente o ritmo e o tipo de uso do território e de interações trans-fronteiriças entre o Acre e as regiões de fronteira do Peru e da Bolívia», ver Machado et alli. (2014).

24Sobre a redefinição do sentido na «luta contra a ditadura» a partir da atuação no âmbito do MDB, com o mapeamento de perfis, repertórios de mobilização e destinos de militantes que alcançaram posições políticas e reconhecimentos intelectuais, ver Reis (2015).

25Com sede em Belém (Pará), o NAEA é uma das unidades acadêmicas da Universidade Federal do Pará (UFPA). Esse Núcleo foi fundado em 1973 e orientado aos problemas de «sustentabilidade e ao desenvolvimento regional na Amazônia». Ver http://www.naea.ufpa.br/index.php/institucional-apresentacao acesso em 14 de fevereiro de 2021.

26Segundo consta no site da ONG «Amazônia real» (agência de jornalismo independente e investigativo criada em 2013, em Manaus, no Amazonas) ele é: «jornalista desde 1966. Sociólogo formado pela Escola de Sociologia e Política de São Paulo, em 1973. Editor do Jornal Pessoal, publicação alternativa que circula em Belém (PA) desde 1987. Autor de mais de 20 livros sobre a Amazônia, entre eles, Guerra Amazônica, Jornalismo na linha de tiro e Contra o Poder. Por seu trabalho em defesa da verdade e contra as injustiças sociais, recebeu em Roma, em 1997, o prêmio Colombe d’oro per La Pace. Em 2005 recebeu o prêmio anual do Comittee for Jornalists Protection (CPJ), em Nova York, pela defesa da Amazônia e dos direitos humanos. Lúcio Flávio é o único jornalista brasileiro eleito entre os 100 heróis da liberdade de imprensa, pela organização internacional Repórteres Sem Fronteiras em 2014» (https://amazoniareal.com.br/author/lucio-flavio-pinto/).

29Além de Chico Mendes, Wilson Pinheiro é outro líder seringueiro, presidente do Sindicato de Trabalhadores Rurais de Brasileia e presidente da Comissão Municipal do PT, que liderou o movimento armado conhecido como «Mutirão contra a Jagunçada», em 1979, e, em 1980, foi assassinado pelas costas (https://fpabramo.org.br/2020/07/21/ha-40-anos-wilson-pinheiro-foi-assassinado). Ele que chegou a ser homenageado na primeira Fundação de Pesquisas do PT, que recebeu o seu nome.

30Vale situar que, segundo consta, para desde a década de 1970 são verificados conflitos e resistências entre, de um lado, porta-vozes indígenas e seringueiros e, de outro, empresários e fazendeiros, que representariam os «protagonistas da frente agropecuária», interessados na «pecuarização do estado do Acre» (Morais, 2016, p. 124). Especialmente a partir da década de 1980, as Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) e a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (CONTAG) organizaram os Sindicatos de Trabalhadores Rurais no Acre. Ambientalistas teriam se identificado com as causas do movimento e colaborado na sua politização ecológica (Paula, 2005).

31Sobre como a associação pessoal a um «líder», estabelecida por um/a dos seus seguidores/as que passa a personificar a «causa» e seu «legado», oportuniza condições de apropriação do carisma, (Reis, 2020), Collovald (1999) e Coradini (1998), inspirados em Max Weber.

32Era candidata a vice-presidente na chapa do PSB liderada por Eduardo Campos, que faleceu durante a campanha. Marina passou, então, à condição de candidata à presidência.

33O extinto Movimento Brasileiro de Alfabetização foi criado em 1967 pelo Ministério da Educação, e efetivado em 1970, com vistas a superar o analfabetismo entre jovens e adultos em condições de carência escolar.

35Ver Grill e Reis (2021).

Editora responsable: Dra. Paola Mascheroni

Recebido: 08 de Novembro de 2024; Aceito: 20 de Março de 2025

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