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Lingüística

versión On-line ISSN 2079-312X

Lingüística vol.38 no.1 Montevideo jun. 2022  Epub 01-Jun-2022

https://doi.org/10.5935/2079-312x.20220003 

Articles

ESCALARIDADE E PROTOTIPIA NO DOMÍNIO DA INTERCALAÇÃO: O CASO DAS CLÁUSULAS HIPOTÁTICAS CIRCUNSTANCIAIS TEMPORAIS NO ESPANHOL MEXICANO ORAL

ESCALARIDAD E PROTOTIPÍA EN EL DOMINIO DE LA INTERCALACIÓN: EL CASO DE LAS CLÁUSULAS HIPOTÁTICAS CIRCUNSTANCIALES TEMPORALES EN EL ESPAÑOL MEXICANO ORAL

SCALARITY AND PROTOTYPE IN THE DOMAIN OF INTERCALATION: THE CASE OF TEMPORAL CIRCUMSTANTIAL HYPOTATIC CLAUSES IN ORAL MEXICAN SPANISH

Sávio André de Souza Cavalcante1 
http://orcid.org/0000-0001-5152-6924

Márluce Coan2 
http://orcid.org/0000-0001-7809-8624

1Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará. savio.andre@ifce.edu.br

2Universidade Federal do Ceará. coanmalu@ufc.br


Resumo

Com base em pressupostos e princípios da Linguística Funcional Centrada no Uso (Bybee 2010 e Furtado da Cunha et al. 2013), analisamos, neste artigo, a intercalação de Cláusulas Hipotáticas Circunstanciais Temporais em dados de 54 entrevistas do Corpus Sociolingüístico de la Ciudad de México (CSCM), tratando-a como uma categoria de protótipos. Os 514 dados revelam 13 types, entre os quais o exemplar Verbo auxiliar de perífrase (∆) Temporal (∆) Verbo principal de perífrase foi considerado o caso mais prototípico de intercalação de Temporais, com base em alta complexidade estrutural, baixa frequência token e baixa produtividade (frequência no type). Percebemos, também, que a função textual-discursiva mais típica das temporais intercaladas é guia/orientação circunstancial. Do ponto de vista cognitivo, os usos de cláusulas intercaladas, do protótipo à margem, são motivados por mecanismos que tendem a reduzir esforços de codificação, refletindo marcação, iconicidade (Givón 1995, 2001) e expressividade (Dubois e Votre 2012).

Palavras-chave: intercalação; escalaridade; prototipia; cláusula temporal; espanhol mexicano oral

Resumen

Con base en presupuestos y principios de Lingüística Funcional Centrada en el Uso (Bybee 2010 y Furtado da Cunha et al. 2013), analizamos, en este artículo, la intercalación de Cláusulas Hipotáticas Circunstanciales Temporales en datos de 54 entrevistas del Corpus Sociolingüístico de la Ciudad de México (CSCM), tratándola como una categoría de protótipos. Los 514 datos revelan 13 types, entre los cuales se consideró el ejemplar Verbo auxiliar de perífrasis (∆) Temporal (∆) Verbo principal de perífrasis el caso más prototípico de intercalación de Temporales, basado en alta complejidad estructural, baja frecuencia token y baja productividad (frecuencia en el type). También se pudo percibir que la función textual-discursiva más típica de las temporales intercaladas es guía/orientación circunstancial. Desde el punto de vista cognitivo, los usos de las cláusulas intercaladas, desde el protótipo hasta el margen, son motivados por mecanismos que tienden a reducir los esfuerzos de codificación, reflejando marcación, iconicidad (Givón 1995, 2001) y expresividad (Dubois y Votre 2012).

Palabras clave: intercalación; escalaridad; prototipía; cláusula temporal; español mexicano oral

Abstract

Based on the assumptions and principles of Usage-based Theory (Bybee 2010 e Furtado da Cunha et al. 2013), in this article, we analyze the intercalation of Temporal Circumstantial Hypothatic Clauses in data from 54 interviews from the Corpus Sociolingüístico de la Ciudad de Mexico (CSCM), treating it as a category of prototypes. The 514 data reveal 13 types, among which the exemplary Auxiliary verb of periphrasis (∆) Temporal (∆) Main verb of periphrasis was considered the most prototypical case of intercalation of Temporal, based on high structural complexity, low token frequency and low productivity (frequency in type). We also realized that the most typical textual-discursive function of intercalated clauses is guide/circumstantial orientation. From a cognitive point of view, the uses of intercalated clauses, from the prototype to the margin, are motivated by mechanisms that tend to reduce coding efforts, reflecting iconicity, markedness (Givón 1995, 2001) and expressiveness (Dubois and Votre 2012).

Keywords: intercalation; scalarity; prototype; temporal clause; oral mexican spanish

1. Introdução

Dentre os estudos funcionalistas referentes à ordenação, ganha relevo, neste artigo, o fenômeno de intercalação oracional, em detrimento dos casos de anteposição e posposição, tão amplamente tratados em outros estudos, como os de Nebrija (1990(1492)), Padilla García (2001) e Cavalcante (2015), por exemplo. Por ser a intercalação um padrão que apresenta características tanto de antepostas como de pospostas, conforme Cavalcante e Cardoso (2016), não há critérios bem definidos para delimitá-la, tampouco estudos exaustivos pautados em dados reais. Por esse motivo, decorre a necessidade de uma investigação mais detalhada acerca da intercalação, mencionada como um padrão de ordenação ao lado das antepostas e pospostas, segundo figure a oração antes, no meio ou após a nuclear. Assim sendo, neste artigo, com base na proposta de Cavalcante (2020), rediscutimos resultados e refinamos o modelo de intercalação ora proposto.

A literatura sobre o tema da ordenação de cláusulas comumente reconhece que intercalação é inserção na cláusula nuclear, como apontado em García de Paredes (1993: 202, tradução nossa), por exemplo, que mostra, que, às vezes, a subordinada se “interpola, separando assim a principal”. Também Conti Jiménez (2012: 282, tradução nossa) define-a como “um subtipo de cláusulas antepostas ou pospostas, às quais, por sua vez, antecede ou segue um constituinte da cláusula principal”. Jiménez Norberto (2014: 77, tradução nossa), por sua vez, diz que “tais orações interrompem a sequência da oração principal e algum elemento da mesma fica antes da oração subordinada adverbial de tempo”. Souza (2001: 75) mostra, outrossim, que “as OTs (orações temporais) intercaladas podem posicionar-se após o sintagma adverbial (SAdv) temporal (...) ou após um sintagma nominal (SN) sujeito (...)”. Nesse sentido, qualquer interrupção de uma cláusula nuclear representaria intercalação, como ilustramos em (1), em que há uma oração temporal entre sujeito e verbo.

1. …sí/ yo también cuando la conocí / pensé que era más joven//sí dije ay no/ pues <~pus> yo cuando la conocí/ pensé que tendría unos/ veintisiete (o algo así). (sim/ eu também quando a conheci / pensei que era mais jovem// sim disse ai não/ pois eu quando a conheci/ pensei que tinha uns/ vinte e sete (ou algo assim)). (ENTREVISTA 7 - ME-107-31M-00)

O que parece, a priori, resolvido, leva-nos a outras indagações, se considerarmos os exemplos (2) e (3) a seguir, pois, às vezes, como em (2), há uma oração temporal inserida entre conector e coordenada, uma inserção que provoca quebra entre constituintes menos agregados do que aqueles em (3), exemplo no qual a temporal se insere entre os elementos de uma perífrase verbal. Configuramos, a partir dessas primeiras observações, nossas questões de partida: a) entre que constituintes mais/menos agregados uma temporal se insere? b) Se há vários tipos de intercalação, então há um continuum de intercalação que vai daquela que rompe uma estrutura mais agregada àquela que rompe uma estrutura menos agregada? c) Como se configuraria tal modelo gradiente, em termos de descrição da intercalação das cláusulas temporais? d) O continuum é motivado por iconicidade e marcação?

2. 443 I: (pues no me) operé porque también cuando tuve mi hijo tuve una preeclampsia muy fuerte / entonces tiendo a que se me suba la presión/. (443 I: (pois não me) operei porque também quando tive meu filho tive uma pré-eclampsia muito forte / então minha pressão tende a subir/). (ENTREVISTA 48 - ME-265-21M-06)

3. …yo yo me vine de/ doce años/ y de trece años aquí <~aquí:>/ estoy desde que tengo trece años aquí (trabajando). (...eu eu vim aos/ doze anos/ e aos treze anos aqui <~aqui:>/ estou desde que tenho treze anos aqui (trabalhando) ). (ENTREVISTA 37 - ME049-21H-99)

Para tratar das questões acima, propomos, neste artigo, uma análise da intercalação como uma categoria que exibe efeitos prototípicos. Distanciamo-nos, portanto, de estudos anteriores, que apresentam a intercalação como um grupo homogêneo, aproximando-nos da visão funcionalista da linguagem, na qual, para além da discretude, os padrões organizam-se em continuum (Givón 1993, 1995 e Bybee 2010).

2. O fenômeno da intercalação

Embora a intercalação não tenha ganhado o relevo que merece, a literatura menciona os propósitos de tal uso, como o faz Gili Gaya (2000), que explica que as orações podem ser interrompidas pela introdução de outros elementos oracionais, redundando em efeitos de expressão, afetividade, extensão etc. Também Quirk e Greenbaum (1973) apontam que as cláusulas adverbiais podem apresentar-se em posição inicial, medial ou final à cláusula principal, advertindo para a baixa frequência das mediais.

García de Paredes (1993) analisa como critério de intercalação a posição em relação à cláusula nuclear, como o fazem Conti Jiménez (2012) e Jiménez Norberto (2014), abordando interpolação. Para Conti Jiménez (2012), a pausa marca as orações interpoladas, que costumam se inserir entre sujeito e demais elementos da nuclear, o que também é apontado por Jiménez Norberto (2014). Por outro lado, Souza (2001) e Jiménez Norberto (2014) consideram intercalação também os casos de Temporal entre adjunto adverbial e a cláusula núcleo. Quanto à função no discurso, a Nova Gramática da Real Academia Espanhola, tratando das Condicionais, analisa-as como incisos, que “introduzem comentários, sejam metalinguísticos ou não, ao que se estabelece na apódose, ou ao menos no primeiro fragmento dela” (ASALE 2010: 905, tradução nossa).

Tomando por base a definição do termo interpolar como “pôr algo entre coisas ou entre pessoas” (DLE: online, tradução nossa), somos favoráveis a uma concepção macro de intercalação, que engloba inserção oracional entre termos sintaticamente e/ou discursivamente integrados, o que nos leva a considerar intercalação o dado (2), outrora analisado como anteposição de Cláusula Temporal. Por essa divisão não categórica entre anteposição/posposição e intercalação, é possível que estejamos diante de um fenômeno que exibe efeitos prototípicos, com exemplares mais próximos e outros mais distantes do protótipo de oração intercalada.

Acompanhando a proposta de Lehmann (1988), que mostra uma atração centrípeta (Nogueira 1999) de cláusulas em direção a seu núcleo, enxergamos a intercalação em níveis hierárquicos, com diversos types distribuídos em um continuum de maior/menor aderência ao núcleo. No entanto, esse procedimento, por sua complexidade estrutural, separando verbo e termos a ele relacionados, não teria alta produtividade na língua.

Partindo das considerações de Halliday (2004), uma cláusula é uma unidade gramatical que se analisa como um construto multifuncional. Além do verbo e de seus argumentos/circunstantes, há o tema textual e o tema interpessoal, que justificam a presença de conector, marcador discursivo e vocativo. Desse modo, uma cláusula teria a seguinte composição: (tema textual/interpessoal) + tema tópico + (sujeito) + (verbo auxiliar) + verbo principal + (objeto direto) + (objeto indireto) + (circunstantes) + (tema textual/interpessoal)1, termos que possuem distintos níveis de aderência entre si. A aderência dos constituintes em relação ao verbo pode ser descrita escalarmente: (+aderido) morfemas modo-temporais > morfemas número-pessoais > predicados nominais, tempos compostos, voz passiva, locuções verbais > objeto direto > objeto indireto > adjunto adverbial (posposto) > sujeito > conjunções, advérbio de frase (adjunto anteposto), marcadores discursivos (-aderido) (Carone 2003). Em face dessa proposta, consideramos que há tipos distintos de intercalação, que refletem diversos lugares de posicionar uma cláusula entre esses termos e o verbo, implicando múltiplas funções textual-discursivas (Matthiessen e Thompson 1988 e Decat 2001).

3. Pressupostos teóricos

Pautam nossa proposta de análise escalar das cláusulas temporais intercaladas pressupostos advindos da Linguística Funcional Centrada no Uso (LFCU) (Bybee 2010 e Furtado da Cunha et al. 2013), em cujas temáticas relevantes acham-se, dentre outras, categorização e prototipia, marcação, iconicidade e frequência (Furtado da Cunha et al. 2013), temas considerados em nossa pesquisa.

Sobre efeitos prototípicos, Rosch (1973) observa que o processo de categorização não é arbitrário, e que categorias não são discretas nem se compõem de atributos simples e adquiridos. Pelo contrário, há variações físicas em continuum, em que determinados exemplares exibem melhor um conceito do que outros. Essas operações cognitivas permitem expressarmos o máximo de informação com baixo esforço cognitivo e que possamos arquivar, sistematicamente, as informações do mundo que percebemos (Rosch 1978).

A categorização de itens linguísticos é um processo básico da cognição humana (Lakoff 1987) e exibe níveis de abstração (Rosch 1978). Esse processo, segundo Bybee (2010), pode envolver categorias de fonemas, de morfemas, de itens do léxico, de sintagmas, de cláusulas, de construções etc.

No ato de categorizar, procuramos agrupar elementos por traço de semelhança, com base no que há de comum, apesar de o fenômeno ser bem mais complexo (Rosch 1973, 1978 e Lakoff 1987).

Segundo Rosch (1978), em nível vertical, percebemos a abstração de uma categoria, desde um nível supeordenado, passando por um nível subordinado, chegando a um nível mais básico. Em nível horizontal, identificamos os itens que variam em um mesmo nível, organizados em torno de exemplares prototípicos, que exibem um maior número de traços da categoria inteira. Nessa direção, Taylor (1995) explica que o protótipo pode ser visto (i) como o(s) membro(s) central(is) ou como (ii) uma representação abstrata desse núcleo conceptual. No entanto, prefere adotar a segunda visão, o que o leva a postular que uma entidade particular não é o protótipo; pelo contrário, instancia-o.

Na mesma linha de pensamento, Givón (1986) admite que as categorias são imprecisas e contingentes no contexto/propósito de uso e explica que, no âmbito da linguagem, itens lexicais, morfemas e construções sintáticas são alguns exemplos que mostram evidências de categorialidade e, também, de não discretude. Já Lakoff (1987) argumenta em favor da existência de efeitos prototípicos na linguagem, que revelam assimetrias e gradações dentro das categorias linguísticas, em todas as áreas, desde a fonologia à semântica, passando pela morfologia e pela sintaxe. Assim como o fazem Rosch (1973, 1978), Givón (1986), Lakoff (1987), Taylor (1995), Furtado da Cunha et al. (2013), entre outros, também adotamos a concepção de prototipia para a análise da intercalação, porque percebemos que não se trata de uma categoria discreta.

Quanto à marcação, Givón (1995) propõe que a estrutura marcada tende a ser mais complexa estruturalmente, cognitivamente e menos frequente do que sua correspondente não marcada. Por ser a intercalação uma categoria marcada, acreditamos que o protótipo de intercalada tenha como características alta complexidade e baixa frequência. No entanto, segundo Dubois e Votre (2012), alguns procedimentos marcados podem servir justamente para tornar a estrutura menos complexa, reduzindo-a ou dando mais transparência. Em face dessas discussões, os pesquisadores propõem o princípio de expressividade: um procedimento marcado pode ser menos complexo e mais frequente, na intenção de o falante optar por mitigar ou cancelar os efeitos dos esforços de codificação. Segundo Braga e Paiva (2017), padrões de ordenação menos frequentes, mais marcados, também o são pragmaticamente, “ou seja, (estão) a serviço de funções discursivas mais específicas” (Braga e Paiva 2017: 205). Diessel (2005) mostra, por exemplo, que uma sentença complexa apresenta processamento mais rápido se a adverbial preceder a principal; o mesmo parece acontecer com as intercaladas pré-verbais e/ou mais próximas à margem esquerda do período em que se inserem.

A opção por um ou outro tipo de intercalação também pode refletir iconicidade, por ser a língua “adaptativamente motivada e, portanto, em princípio, não arbitrária” (Givón 2001: 34, tradução nossa). Para Givón (1995, 2001), há equilíbrio entre dispositivos icônicos (princípios) e arbitrários (regras), por isso propõe princípios (ou regras da protogramática), dentre os quais destacamos as regras de espaçamento e de sequência. No primeiro caso, postula o autor que elementos conceptualmente e/ou funcionalmente relacionados são dispostos com maior proximidade entre si.

No segundo caso, ensina-nos Givón (2001) que a codificação linguística do enunciado tende a refletir a ordem dos eventos no mundo extralinguístico e que as informações mais importantes/salientes tendem a ser narradas em primeiro lugar.

Cavalcante (2015) e Cavalcante e Cardoso (2016) mostraram a relevância de regras de sequência para a ordem das orações, por refletirem a ordem dos eventos narrados, confirmando a iconicidade (Givón 1995, 2001), o que também é relatado em Romero Gualda (1985), García de Paredes (1993), Olivares Pardo (2002) e Guerrero et al. (2017). Ademais, ainda no âmbito das regras de sequência, quanto maior a ligação entre os constituintes que a cláusula temporal rompe, maior será seu grau de prototipicidade, por isso a intercalação prototípica seria evitada, a menos que o propósito seja o de refletir a ordem dos eventos no mundo.

Quanto às regras de espaçamento, relacionando-as às intercaladas, Cavalcante (2015, 2016) concluiu que esse é o padrão menos icônico, por operar ruptura entre o verbo e seus argumentos. Em outras palavras, inserções entre verbo e argumentos tendem a ser evitadas, dado seu grau de imbricação (Tomlin 1986). Por isso, hipotetizamos que a intercalação prototípica tende a ser pouco produtiva, por ser o padrão de ordenação mais complexo, considerando complexidade estrutural, a menos que se queira efeito estilístico ou redução de complexidade cognitiva.

Outro ponto bastante ressaltado pelos autores que trabalham com a visão funcionalista da linguagem é a frequência de uso. Para Bybee (2007), efeitos da repetição levam à emergência de uma estrutura aparentemente estável, como, por exemplo, as dunas de areia, que, apesar de apresentarem relativa rigidez, exibem mudanças ao longo do tempo e do espaço, assim como o sistema linguístico. Os efeitos da frequência de uso são tão poderosos que, consoante Bybee (2010), unidades que frequentemente ocorrem juntas tendem a ser interpretadas como um bloco unitário e dão origem a novas formações análogas. Sendo a mente sensível à repetição, tal característica molda a gramática. Bybee (2007) distingue frequência de ocorrência (token frequency) e frequência de tipo (type frequency), respectivamente, para se referir à contabilização de quantas vezes um item aparece no texto e aos padrões de ocorrências desses itens. Para Bybee (2010), alta frequência type relaciona-se com a produtividade de uma construção linguística.

Tendo em vista tais discussões e adaptando os critérios propostos por Moure (1994) para a caracterização do protótipo: (i) frequência, (ii) autonomia no discurso, (iii) grau de adequação e (iv) produtividade, acreditamos que o protótipo de intercalação (i) tem baixa frequência token, (ii) está inserido entre termos agregados da oração, (iii) reverbera os traços gerais do grupo completo das intercaladas e (iv) é pouco produtivo, em termos de frequência type, considerando a complexidade que envolve a intercaladas.

4. Procedimentos metodológicos

Nesta pesquisa, utilizamos o raciocínio abdutivo-analógico (Givón 1995), pela necessidade de verificação, no uso, dos diversos modos de intercalar uma Cláusula Temporal.

Valemo-nos também do método estatístico, já que, segundo Bybee (2007, 2010), a gramática é modelada por princípios, dentre os quais, a frequência. Os percentuais apontam, portanto, para tendências de uso (Guy e Zilles 2007).

Para a composição da amostra, utilizamos 54 entrevistas do Corpus Sociolingüístico de la Ciudad de México (CSCM)2, observando esta distribuição: 2 gêneros X 3 idades X 3 graus de instrução X 3 informantes por célula. Ressaltamos que nossa intenção não é verificar os reflexos sociais no uso das intercaladas, mas ter uma amostra representativa, segundo Guy e Zilles (2007).

Do conjunto de dados de Cláusulas Temporais, descartamos aquelas em início absoluto de período, em fim absoluto de período, que se caracterizam como parte do sujeito de outra oração ou têm função de sujeito, também aquelas com função de predicativo e os casos em que a oração nuclear não era recuperável pelo cotexto imediato. Os demais dados foram analisados visando à configuração de um continuum.

Nossas hipóteses, pautadas nas premissas teóricas apresentadas na seção anterior, dizem respeito à marcação e à iconicidade. Assim, quanto mais uma oração se intercala a constituintes mais agregados, mas marcada seria, por ser um padrão mais complexo cognitivamente, estruturalmente e de baixa frequência, tanto em relação à anteposição/posposição como entre os demais tipos de intercaladas. No entanto, quanto à complexidade cognitiva, acreditamos que, pela função de guia (Chafe 1984 e Decat 2001) que as Temporais comumente codificam (Cavalcante 2015), a intercalação serviria para trazer informações necessárias para o entendimento da sentença nuclear, em um esforço de redução de complexidade cognitiva (Dubois e Votre 2012). Em relação à iconicidade, considerando os subprincípios de proximidade e relevância e proximidade e escopo (Givón 1995, 2001), a inserção de uma Cláusula Temporal entre constituintes agregados tornaria a interpretação da sentença mais complexa. Por outro lado, se atende à ordem de ocorrência e à ordem reportada (regras de sequência, conforme Givón 2001), não carregaria o enunciado de complexidade.

5. Um continuum de intercalação

Dos 514 dados analisados, verificamos que 65 se encaixam dentro da cláusula nuclear, entre verbo e seus argumentos/circunstantes, o que converge com a descrição de intercalação proposta pela literatura (García de Paredes 1993; Souza 2001; ASALE 2010; Conti Jiménez 2012; Jiménez Norberto 2014, entre outros). Além da inserção à nuclear, observa-se aumento de marcação (maior complexidade) (Givón 1995, 2001), por ferir a iconicidade (rompe termos agregados) (Givón 1995, 2001). Em perspectiva prototipicamente orientada (Rosch 1973, 1978; Givón 1986; Lakoff 1987; Taylor 1995, entre outros), observamos que esses 65 dados de uma mesma categoria - a intercalação - apresentam várias características típicas (Rosch e Mervis 1975), mas não ‘suficientes e necessárias’ (Givón 1986).

Outrossim, ao observamos os contextos de ocorrência, verificamos que há cláusulas temporais que estão entre a nuclear e outros elementos a ela acoplados, como marcador discursivo, tópico, antitema, adjunto adverbial de frase, além de ocorrência de cláusula temporal entre um conectivo de oração coordenada (e subordinada) e a referida oração. Esses padrões de disposição da Temporal, em análise que não considere intercalação, poderiam ser classificados como anteposição ou posposição, por estarem fora dos limites da estrutura argumental do verbo. Esses casos de intercalação da Temporal em contextos de menor integração entre itens foram observados em 449 dados.

Na tabela 1, a seguir, propomos um tratamento escalar aos types de intercaladas localizados no corpus. Em primeiro lugar, os padrões de Temporal intercalada foram organizados segundo o grau de aderência dos termos que rompe, consoante a hierarquia de Carone (2003). Nessa primeira etapa, atendendo ao critério de grau de aderência/complexidade sintática, tomamos por base a hipótese de que a intercalada prototípica se insere entre termos mais aderidos entre si. A aplicação do critério citado possibilitou a distribuição de uma hierarquia de prototipia dos seis primeiros types. Em seguida, ordenamos os demais types, casos de intercalação entre termos não aderidos entre si, de acordo com sua frequência token e no type, considerando que a intercalada prototípica tem baixa frequência e baixa produtividade, em virtude de sua complexidade inerente. Após a aplicação dos critérios descritos, as estruturas intercaladas foram organizadas como segue, em ordem decrescente de prototipicidade:

Tabela 1: Distribuição dos padrões de intercalação oracional no Corpus Sociolingüístico de la Ciudad de México (CSCM)3. Legenda: V1 - verbo auxiliar de perífrase, T - Oração Temporal, V2 - Verbo principal de perífrase, V - verbo/núcleo da predicação em contexto não perifrástico, CD - Complemento direto, CI - Complemento indireto, CN - Complemento nominal, AA - Adjunto adverbial, S - Sujeito, N - Oração Nuclear, An - Antitema, M - Marcador discursivo, To - Tópico, CS - Conector de oração subordinada, OS - Oração subordinada, CC - Conector de oração coordenada, OC - Oração coordenada. 

Fonte: Elaborada pelos autores.

Ao contrário do que faz Cavalcante (2020), que estabeleceu dois continua de intercalação, preferimos unificar todos os types em apenas um quadro, dando uma visão global do fenômeno. As intercaladas que se encontram mais abaixo no quadro coincidem com os padrões mais frequentes de se dispor uma Temporal intercalada ao longo do período. Esses types constituem as estruturas que mais se distanciam do protótipo de intercalação, seja por sua maior produtividade (frequência no type), por sua alta frequência token ou menor complexidade. Dessas, as mais frequentes, como mostra a tabela 1, são os types CC (∆)4T (∆) OC (33.7%) e M (∆) T (∆) N (25.1%). Os percentuais mais baixos, atrelados aos quatro primeiros subtipos expostos na tabela 1, apontam para padrões que refletem procedimentos menos icônicos (Givón 1995, 2001).

O protótipo de intercalação não é o item mais frequente, por ser dotado de alta complexidade estrutural, separando termos com grau forte de aderência. Conforme verificou Cavalcante (2015), a intercalação é uma posição mais marcada. No entanto, no que diz respeito à complexidade cognitiva, é possível que os efeitos da complexidade estrutural sejam suavizados pela função de guia/orientação das Temporais, como veremos, a seguir, na exposição e ilustração de cada type.

O padrão V1 (∆) T (∆) V2, conforme exemplo (4), ocorre em 1 único dado (0.2% do total), sem dúvida, o mais saliente caso de intercalação detectado neste trabalho, seja por sua frequência, seja por sua complexidade, em virtude de ser uma estrutura marcada (Givón 1995, 2001). Além de ter sido o dado que motivou este estudo, percebe-se claramente que ele revela maior aproximação ao protótipo de uma estrutura bastante complexa. Embora fira o subprincípio de iconicidade proximidade e escopo (Givón 1995, 2001), separando termos agregados, a função de orientação temporal dessas orações parece determinar sua posição próxima à margem esquerda e sua média extensão (5 vocábulos) (Cavalcante 2020). Quanto à realização, o informante optou por um item diferente de cuando, provavelmente pelo valor semântico de desde que, que é classificado por Pilar Garcés (1994) como um meio que apresenta o momento em que uma ação inicia.

4. …yo yo me vine de/ doce años/ y de trece años aquí <~aquí:>/ estoy desde que tengo trece años aquí (trabajando). (...eu eu vim aos/ doze anos/ e aos treze anos aqui <~aqui:>/ estou desde que tenho treze anos aqui (trabalhando) ). (ENTREVISTA 37 - ME049-21H-99)

Do type V (∆) T (∆) CD, há 7 dados (1.4% do total). Em (5), essa estratégia sintática deixa claro que, em termos de iconicidade (Givón 1995, 2001), há informações que não podem aparecer apenas no fim da cláusula, dada sua relevância para a compreensão do enunciado. No exemplo sob análise, situar o momento da escolha do estilo do bonsai é de crucial importância para a adequada produção da arte. Esse padrão cumpre a função de orientação na construção do estado de coisas expresso como complemento direto, que, em (5), é apresentado em forma oracional:

5. 124 I: (el/ el bonsái)/ se hace/ en un estilo/ específico// cada árbol/ tenemos que elegir/ previamente/ antes de empezar/ qué estilo/ en qué estilo lo vamos a hacer //. (124 I: (o/ o bonsai)/ é feito/ em um estilo/ específico// cada árvore/ temos que escolher/ previamente/ antes de começar/ que estilo/ em que estilo vamos fazer //) (ENTREVISTA 14 - ME-056-32H-99)

O padrão V (∆) T (∆) CI também foi revelado em apenas 1 dado (0.2%), apresentado abaixo, em (6). Esse dado é bastante complexo por ser marcado estruturalmente (Givón 1995, 2001), por isso, notamos baixíssima frequência. Entretanto, reflete menor complexidade cognitiva, por situar o momento em que o fungo aparece. A Temporal cuando llueve mucho, cumprindo função de orientação temporal com efeito no referente em função de complemento indireto, intercala-se entre o verbo sale e seu complemento indireto al maíz, que aparece reduplicado por meio do pronome le, em posição pré-verbal. Como vimos argumentando, essa estratégia, apesar de carregar a sentença de maior complexidade, pode ser explicada em termos de expressividade (Dubois e Votre 2012): ao invés de exigir maior custo cognitivo/estrutural (Givón 1995, 2001), “um procedimento discursivo marcado pode reduzir ou anular o esforço de codificação” (Dubois e Votre 2012: 69).

6. 174 I: no// yo me he dado cuenta// más o menos// que/ que el/ el huitlacoche le sale/ cuando llueve mucho/ al maíz . (174 I: não// eu me dei conta// mais ou menos// que/ que o/ o huitlacoche surge/ quando chove muito/ no milho ). (ENTREVISTA 49 - ME-048-22H-99)

O padrão N (∆) T (∆) CN, representado somente pelo dado (7), também corresponde a 0.2% dos dados. Em (7), a cláusula llevo huevos duros atua como complemento de la costumbre. Nesse trecho, figura a Temporal intercalada cuando salimos así de viaje largo/ y de corto también, com função de guia na descrição de um estado de coisas. Esse arranjo sintático é carregado de complexidade estrutural, já que há termos agregados sendo separados por uma Temporal, que tem como nuclear orações completivas em lista (Mann e Thompson 1988). Fato curioso é que as completivas assumem a forma verbal flexionada llevo (levo) e não a forma reduzida, o que seria mais típico. Provavelmente, por questões de proximidade, a flexão verbal da Temporal intercalada interfira na completiva, que é sua nuclear, em atendimento ao subprincípio de iconicidade (Givón 1995, 2001). O fato de uma oração se intercalar em outra pode ocasionar uma separação que leve o falante a obedecer a padrões estruturais distintos, dado o peso de princípios funcionais.

7. 1246 I: (salía) el agua/ entonces yo/ siempre tengo la costumbre de cuando salimos así de viaje largo/ y de corto también/ llevo huevos duros/ llevo sándwiches <~sángüiches>/ llevo fruta/ llevo/ llevamos refresco / o si no pasamos en la caseta y compramos refresco. (1246 I: (saía) a água/ então eu/ sempre tenho o costume de quando saímos assim de viagem longa/ e curta também/ levo ovos cozidos/ levo sanduíches/ levo fruta/ levo/ levamos refresco / ou se não passamos na barraquinha e compramos refresco). (ENTREVISTA 56 - ME-219-22M-02)

O padrão V (∆) T (∆) AA, apresentado abaixo, ocorre em 4 dados no corpus, correspondendo a 0.8% entre todos os tokens. Em termos de aderência dos termos que essa intercalada rompe, apesar de o adjunto adverbial nem sempre ser um termo requerido pelo verbo, o que o difere dos complementos circunstanciais, guarda com o elemento central alguma relação. Vemos, nesse padrão, uma intercalada com função de moldura temporal, compondo uma lista de enumeração de circunstâncias, apresentando as coordenadas do processo verbal, como exemplificado em (8):

8. … y que se podía aprender/ otra manera de/ eh/ actoralidad/ con el Stanislavski de los últimos años/ que sólo se vino a conocer/ ya mucho tiempo después/ cuando cayó la Unión Soviética/ cuando pasaron muchas cosas . (… e que podia ser aprendida/ outra maneira de/ é/ atuar/ com o Stanislavski dos últimos anos/ que apenas veio a ser conhecido/ muito tempo depois/ quando caiu a União Soviética/ quando passaram muitas cosas ). (ENTREVISTA 17 - ME-254-32H-05)

Há 51 dados do padrão S (∆) T (∆) V (9.9%), ilustrado em (9). Como vimos afirmando, por pressões relacionadas à iconicidade e marcação (Givón 1995, 2001), as intercaladas tendem à baixa frequência, já que separam termos agregados entre si. Entretanto, também cremos em graus diferentes de prototipicidade, a depender do nível de aderência dos termos que a intercalada rompe. Na escala proposta por Carone (2003), o elemento sujeito figura como o menos aderido dos elementos argumentais do verbo. Por isso, esse type é o de mais alta frequência entre os que envolvem termos mais aderidos. No que diz respeito à função, como essa Temporal tende a retomar o sujeito da nuclear, e, assim, delimitá-lo, identificamos a função de ponto de incidência (Souza 2001), ou o que podemos chamar de guia/orientação referencial, já que ajuda a construir informações detalhadas sobre o referente sujeito da nuclear.

9. 238 I: la madera sí/ cuando es natural/ todavía tiene la posibilidad de regresar a su forma natural cuando/ tiene mucha humedad o/ o s-/ o agua directo . (238 I: a madeira sim/ quando é natural/ ainda tem a possibilidade de retornar à sua forma natural quando/ tem muita umidade ou/ ou s-/ ou água direto ). (ENTREVISTA 61 - ME-144-23H-01).

Há apenas um dado do padrão N (∆) T (∆) An, correspondente a 0.2% da amostra. Em (10), o informante introduz um antitema (tail) (Dik 1997), a fim de aclarar/reforçar a informação de que os jovens que viram o fantasma eram os seus irmãos.

Essa Temporal também exerce uma função de fundo avaliativo, já que serve como suporte argumentativo. Além disso, apresenta função fórica, “retomando e especificando a informação anterior” (Souza 2001: 76), que culmina na retomada do referente-alvo por meio do antitema.

10. 761 I: pues <~ps> ahí en el cerro hay una/ de un viejito que se aparece/ en/ en el cerro

762 E: ihh/ ¿un viejito?

763 I: sí/ vestido de blanco

764 ¿qué?/ ¿murió él ahí o (por qué aparece?)

765 I: (quién) sabe/ no no/ no sé// a mí nunca se me ha aparecido/ al que se le apareció es a <~a:>/ mis dos hermanos más chicos/ cuando eran más chicos ellos .

(761 I: pois lá na colina há uma/ de um velhinho que aparece/ na/ na colina

762 E: ihh/ um velhinho?

763 I: sim/ vestido de branco

764 G: quê?/ ele morreu lá ou (por que aparece?)

765 I: (quem) sabe/ não não/ não sei// para mim nunca apareceu/ a quem apareceu foi a/ meus dois irmãos mais jovens/ quando eram mais jovens eles ). (ENTREVISTA 49 - ME-048-22H-99)

A estrutura N (∆) T (∆) M ocorre em 10 dados no corpus (1.9%). Em (11), o marcador discursivo, de função apelativa/interativa (Poblete Bennett 1997), cria um ponto de contato com o interlocutor, convocando-o a concordar com o ponto de vista do falante. Tal recurso é relevante para operar argumentação no discurso.

11. (…) o sea// un bonsái debe sentir pánico/ cuando un principiante se le acerca/ ¿no? ((...) ou seja// um bonsai deve sentir pânico/ quando um principiante se aproxima/ não? ). (ENTREVISTA 14 - ME-056-32H-99)

O padrão To (∆) T (∆) N corresponde a 31 dados (6%), ocupando a sexta posição em total de dados. Em (12), o informante, falando de si mesmo, precisa introduzir outro referente para tratar de uma situação relacionada a si próprio. Para tanto, mantém a subjetividade por meio do elemento com função pragmática de tópico (yo) (Givón 2001) e insere a oração temporal intercalada desde que estaba aquí, que traz mais informações sobre esse referente. A Temporal cumpre, nesse caso, juntamente com o tópico, a função de guia, para a informação que seguirá.

Nos termos de Dik (1997), podemos falar em função pragmática de orientação, neste caso, orientação de referente tópico/orientação referencial tópica.

12. 489 I: yo desde que estaba aquí pues <~pus> él <~él:>/ pues <~pus> él me quería mucho porque/// eh/ conmigo tenía mucha confianza porque desde que yo estaba/ desde que llegué yo aquí siempre/.... (489 I: eu desde que estava aqui pois ele/ pois ele gostava muito de mim porque/// é/ tinha muita confiança em mim porque desde que eu estava/ desde que eu cheguei aqui sempre/...) (ENTREVISTA 37 - ME-049-21H-99)

Com 7.6%, em quinta posição quanto à frequência token, o padrão AA (∆) T (∆) N, ilustrado em (13), responde por 39 dados. É um type bastante variado, tendo em vista as diversas subclasses de adjuntos adverbiais existentes (ASALE 2010: maneira, instrumento, meio, matéria, companhia, quantidade ou grau, lugar, tempo, causa, finalidade, proveito ou benefício), além dos advérbios oracionais (ASALE 2010). Em todos esses casos, a intercalada funciona como um guia circunstancial em enumeração.

13. 592 I: no/ yo nomás/ yo nunca he dejado que maten en mi casa/ o si matan/ yo no veo// un día/ cuando mi hermana se casó/ mataron ocho poll-/ ochenta pollos/ (pero ya tiene años). (592 I: não/ eu / eu nunca deixei que matassem em minha casa/ ou se matam/ eu não vejo// um dia/ quando minha irmã se casou/ mataram oito frang-/ oitenta frangos/ (mas já faz anos)). (ENTREVISTA 43 - ME-007-21M-97)

O padrão CS (∆) T (∆) OS ocorre em 66 dados (12.8%). No ranking da frequência, é o terceiro locus mais comum. No exemplo abaixo, a Temporal intercala-se entre o conector de uma subordinada e a própria subordinada, instituindo-lhe um guia sentencial para a compreensão do que será narrado na oração seguinte.

A diferença é o traço de modalização, tendo em vista que o contexto em que se insere (entre o verbo e uma oração completiva) é marcadamente mais modalizado (Givón 2001), como vemos em (14):

14. 344 I: … yo creo que desde que entré// no/ un poquito antes/ como un año antes de entrar a la universidad/ el último año de prepa/ me desligué mucho de aquí/ (porque). (344 I: … eu creio que desde que entrei// não/ um pouquinho antes/ um ano antes de entrar na universidade/ o último ano de preparatório/ me desliguei muito daqui/ (porque)). (ENTREVISTA 8 - ME-181-31M-01)

Há 129 dados (25.1%) do type M (∆) T (∆) N, o que lhe confere a segunda posição em termos de frequência, em meio ao contingente total de dados, um type que pode expressar variadas funções, a depender do tipo de marcador discursivo: relacionante, apelativo/interativo ou conector modal (Poblete Bennet 1997). No exemplo (15), deparamo-nos com um marcador relacionante, com função continuativa, que, acoplado à intercalada, auxilia na continuidade discursiva. Assim, essa Temporal pode servir como ponte de transição (Decat 2001), valendo-se de material linguístico citado para dar continuidade ao relato.

15. … la idea era hacer revisión de programas/ revisábamos/ le revisamos los programas de todos los Cetis y Cebetis/ entonces <~tons> cuando se hizo/ se terminó de hacer la revisión/ pues ya no había otra cosa que hacer /... (… a ideia era fazer revisão de programas/ revisávamos/ revisamos os programas de todos os Cetis e Cebetis/ então quando foi feita/ terminou de ser feita a revisão/ pois já não havia outra cosa para fazer / …). (ENTREVISTA 18 - ME-257-32H-05)

O padrão CC (∆) T (∆) OC, ilustrado em (16), abaixo, apresenta 173 dados (33.7%), o que o leva, em termos de frequência, à primeira posição em relação a todos os dados. Percebemos uma função de guia sentencial, que se acopla à função semântica da coordenada que encabeça. Em se tratando de relação adversativa, contribui ainda mais para realçar o valor adversativo da sentença que virá adiante. Por se valer de material anterior e encabeçar novas informações a partir dele, também identificamos a função de ponte de transição (Decat 2001).

16. … yo vivía en mi mundo de “ay sí coches/ antro/ casas y y y amigos”// muy banal/ muy materialista// pero cuando entras a la carrera de medicina/ híjole// no/ en serio que/ aprendes a valorarte/ a valorar tu cuerpo/ a valorar cada cosa que tienes/. (… yo vivia em meu mundo de “ai sim carros/ antro/ casas e e e amigos”// muito banal/ muito materialista// mas quando você inicia a carreira de medicina/ não/ é verdade que/ você aprende a se valorizar/ a valorizar seu corpo/ a valorizar cada coisa que tem/ ). (ENTREVISTA 12 - ME-252-31M-05)

Esses types, associados às funções que apresentamos, descrevem os padrões localizados em nosso universo de pesquisa. Como se pôde notar, a intercalação de orações, mais que uma opção estrutural, reflete uma gama de funções, portanto não pode ser tratada como um objeto uno e monolítico.

6. Considerações finais

Nossa análise de cláusulas hipotáticas adverbiais temporais no espanhol mexicano oral revelou gradiência de intercalação a constituintes mais/menos aderidos, do que decorre a constatação de que há exemplares mais/menos prototípicos, escalarmente hierarquizados.

Após análise de 514 dados de Temporais intercaladas, verificamos 13 diferentes types, que revelaram as múltiplas posições de uma oração Temporal em um período, quando não está em seu extremo esquerdo ou direito.

O padrão que mais se assemelha ao protótipo de Temporal intercalada, de acordo com os critérios grau de complexidade, frequência token e frequência no type, é V1 (∆) T (∆) V2, que cumpre função de orientação temporal. A esse type, seguem-se, em ordem decrescente de intercalação prototípica, as estruturas V (∆) T (∆) CD (função de orientação na construção do referente expresso como complemento direto), V (∆) T (∆) CI (função de orientação temporal com efeito no referente em função de complemento indireto), N (∆) T (∆) CN (função de orientação na descrição de um estado-de-coisas), V (∆) T (∆) AA (função de moldura temporal/enumeração de circunstâncias), S (∆) T (∆) V (função de ponto de incidência/orientação referencial), N (∆) T (∆) An (função de fundo avaliativo e função fórica), N (∆) T (∆) M (suporte interacional discursivo), To (∆) T (∆) N (orientação de referente tópico), AA (∆) T (∆) N (guia circunstancial em enumeração), CS (∆) T (∆) OS (guia sentencial em contexto marcadamente mais modalizado), M (∆) T (∆) N (função de ponte de transição) e CC (∆) T (∆) OC (guia sentencial/intensificador da função semântica da oração coordenada).

Os achados ratificam a posição de que a intercalação prototípica, por sua complexidade estrutural, tem baixa frequência, violando as regras de espaçamento (Givón 1995, 2001). No entanto, esse critério é contrabalanceado por suavização na complexidade cognitiva do período como um todo, servindo a Temporal à função de guia/orientação, em atendimento ao princípio de expressividade (Dubois e Votre 2012).

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1O uso de parênteses indica que tais elementos não necessariamente podem estar codificados na cláusula.

2Disponível em: https://lef.colmex.mx/corpus_sociolinguistico.html. Acesso em: 06 jan. 2021.

3Seguindo a proposta de Cavalcante (2020), criamos dois macrotypes, prototípicas (inseridas entre termos aderidos) (65 dados) e não prototípicas (inseridas entre termos não aderidos) (449 dados). Distribuídos os microtypes nesses dois grupos maiores, calculamos a frequência de cada padrão dentro de seu grupo, o que denominamos frequência no type.

4O símbolo (∆) foi usado por Cavalcante (2020), inspirado em Campos et al. (2017), para indicar presença de material interveniente.

NOTA: Sávio André de Souza Cavalcante realizou os procedimentos de coleta e análise de dados, com apoio e orientação de Márluce Coan. Ambos mantiveram a parceria em toda a construção do texto.

Nota de aceptación: Este texto ha sido aceptado para publicación por el único Director-Editor de la revista, Adolfo Elizaincín, quien ha actuado de acuerdo a lo establecido en la “Declaración de comportamiento ético" de la revista Lingüística https://www.mundoalfal.org/sites/default/files/revista/Declaracion_comp_etico.pdf), primer párrafo del capítulo “Obligaciones del Director-Editor". A esta declaración deben adherir, explícitamente, el Director-Editor, los árbitros y los autores.

Recebido: 06 de Janeiro de 2021; Aceito: 15 de Abril de 2021

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